ENTRE CULTURAS E UNIVERSIDADES: EXPERIÊNCIA DE MIGRAÇÃO ACADÊMICA DE UM ESTUDANTE ANGOLANO NO BRASIL
Palavras-chave:
Migração. Formação em Enfermagem. Interculturalidade.Resumo
Contextualização: A migração internacional constitui um fenômeno complexo e multifacetado, que envolve deslocamentos motivados por questões políticas, econômicas, educacionais e culturais. No Brasil, a presença de estudantes africanos em universidades públicas tem se intensificado, em especial por meio de programas como o da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), cuja missão é fortalecer a cooperação entre o Brasil e os países africanos de língua portuguesa. Essa realidade evidencia não apenas o caráter acolhedor das instituições de ensino, mas também os desafios enfrentados pelos migrantes em sua adaptação ao contexto acadêmico e social. Objetivo: Relatar a experiência migratória de um estudante angolano no Brasil, refletindo sobre os desafios e aprendizagens vivenciados no percurso acadêmico e cultural, bem como sobre as estratégias de resistência e adaptação. Aporte teórico: A compreensão da experiência migratória demanda referenciais que abordem tanto a condição estrutural do migrante quanto a dimensão subjetiva de suas vivências. Sayad (1998) discute a imigração como espaço de paradoxos identitários e de alteridade. Hall (2006) contribui ao analisar a identidade cultural como processo em constante construção. Mbembe (2017) enfatiza o atravessamento das questões raciais e coloniais nas experiências migratórias, especialmente no contexto africano. Já Baeninger (2018) evidencia a dinâmica das migrações no Brasil contemporâneo, destacando as políticas de acolhimento e seus limites. Esses referenciais permitem compreender a experiência do estudante como fenômeno social, cultural e político, marcado por tensões e possibilidades. Metodologia: Trata-se de um relato de experiência, sistematizado a partir da trajetória de um estudante angolano que chegou ao Brasil em 2022 com bolsa da Unilab. A narrativa foi organizada de forma reflexiva, destacando aspectos acadêmicos (processo de inserção universitária e transferências de curso), culturais (choques linguísticos, alimentares e climáticos) e sociais (acolhimento e preconceito). Resultados: A experiência foi marcada inicialmente por entraves acadêmicos, como a divergência entre o curso pretendido (Enfermagem) e o curso de ingresso (Farmácia), além das tentativas de transferência em diferentes instituições, nem sempre bem-sucedidas. Esses obstáculos evidenciaram a rigidez de processos institucionais que muitas vezes desconsideram a condição específica do migrante. A persistência, entretanto, possibilitou a conquista da vaga no curso de Enfermagem na Universidade Federal da Fronteira Sul, em Chapecó, consolidando o sonho profissional. Do ponto de vista cultural, a experiência revelou tanto acolhimento quanto episódios de preconceito. A condição de ser negro e africano implicou vivências ambivalentes de pertencimento e exclusão. Os choques linguísticos, apesar da língua portuguesa em comum, também representaram barreiras, devido a sotaques e expressões próprias. Além disso, a convivência intercultural com migrantes de diferentes nacionalidades ampliou a compreensão da diversidade e favoreceu a criação de redes de apoio. Essa trajetória aponta que ser migrante significa viver entre culturas, lidar com tensões identitárias, enfrentar barreiras institucionais e sociais, mas também criar novas possibilidades de vida. A resiliência e a fé mostraram-se fundamentais para a permanência no espaço acadêmico, evidenciando a universidade como lugar de disputas, mas também de acolhimento e reinvenção.
