FORMAÇÃO EM ENFERMAGEM E MIGRAÇÃO:
REFLEXÕES INTERCULTURAIS A PARTIR DA TEORIA DO CUIDADO CULTURAL DE LEININGER
Palavras-chave:
Estudantes de Enfermagem. Migração Internacional. Competência Cultural.Resumo
O presente relato de experiência insere-se no cenário da educação superior em Enfermagem numa universidade pública do sul do Brasil, onde estudantes migrantes enfrentam desafios singulares no acesso, permanência e conclusão do curso, justapondo aspectos socioculturais, institucionais e pedagógicos que impactam suas trajetórias formativas; parte da compreensão de que a migração implica rupturas de projetos de vida, sofrimento psicológico e necessidade de recomeço, especialmente em contextos de imigração involuntária, conforme identificado em estudos com migrantes haitianos, venezuelanos e sírios (Ferreira et al., 2023). Observa-se que tais estudantes lidam com estresse adaptativo, isolamento, barreiras linguísticas, etnocentrismo acadêmico, dificuldades financeiras, discriminação e ausência de apoio familiar, fatores que prejudicam sua saúde mental e integração institucional (Dju; Cavalcanti, 2023). Além disso, enfatiza-se que o ensino de Enfermagem deve contemplar os processos migratórios e as especificidades no acesso à saúde dos migrantes, sobretudo em situações como a pandemia de COVID-19 que exacerbou vulnerabilidades (Matsue et al., 2022). A partir desses pressupostos, o relato visa refletir sobre os desafios e as potencialidades da graduação em Enfermagem por estudantes migrantes, articulados com a Teoria do Cuidado Cultural de Madeleine Leininger, que preconiza sensibilidade cultural, cuidado congruente e valorização dos saberes “emic” e “etic”. No que tange à metodologia, adota-se o relato de experiência fundamentado nas vivências integradas de docentes e discentes, que sistematizaram observações de práticas pedagógicas, acolhimento institucional, interações interculturais e os resultados identificados em experiências reais de implementação de ações de inclusão. Os resultados apontam que, apesar da insuficiência de políticas institucionais específicas, a instituição implementou mecanismos promissores, como grupos de apoio entre pares, monitorias de estudantes, oficinas de capacitação docente sobre competência cultural, espaços de escuta e acolhimento psicológico, além de práticas pedagógicas que incorporam narrativas de origem e valorização de saberes culturais migrantes, fortalecendo o senso de pertencimento. Essas iniciativas, alinhadas à teoria de Leininger, favorecem a construção de pontes entre conhecimentos biomédicos e tradições culturais dos estudantes, promovendo reconciliação entre diversidades e prática profissional cuidadora. Observou-se que estudantes migrantes passaram a demonstrar maior engajamento acadêmico, resiliência e protagonismo na formação, bem como interlocução mais profunda com os saberes de cuidado de suas comunidades de origem. A experiência pedagógica evidenciou ainda que quando os docentes se posicionam eticamente, com sensibilidade cultural e adaptam conteúdos à pluralidade cultural dos estudantes, há ampliação da competência cultural tanto em discentes quanto em corpo docente, reforçando o cuidado centrado na pessoa migrante. A experiência sugere que a incorporação intencional da Teoria do Cuidado Cultural como referencial pedagógico e ético pode transformar a graduação em Enfermagem em um ambiente interculturalmente competente, contribuindo para a permanência e sucesso acadêmico dos estudantes migrantes. Conclui-se que, embora persistam desafios estruturais, existem possibilidades concretas de construir uma formação mais inclusiva e culturalmente sensível, recomendando-se a institucionalização de políticas acadêmicas de acolhimento, formação docente e integração ativa dos saberes culturais, em consonância com os princípios da Teoria do Cuidado Cultural.