O DIREITO À MORADIA DE IMIGRANTES E REFUGIADOS NO BRASIL

OBSTÁCULOS E GARANTIAS

  • Ana Paula Dittgen da Silva GEMIGRA/UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PELOTAS
Palavras-chave: Direito à moradia. Imigrantes e refugiados. Segregação espacial.

Resumo

A partir de dados extraídos de pesquisa realizada com imigrantes senegaleses no município de Pelotas, assim como em números e relatos registados nas grandes cidades do país, como São Paulo (MIGRAMUNDO, 2018), pode-se visualizar um desrespeito com relação ao direito à moradia de imigrantes e refugiados no Brasil. Em Pelotas, os imigrantes senegaleses relatam a dificuldade em conseguir um imóvel para alugar, diante dos documentos indispensáveis para a negociação e que praticamente inviabilizam um contrato regular. Tal realidade obriga os imigrantes a se submeterem a condições precárias de trabalho, mas cujos vínculos garantem a moradia para eles, ou os leva a alugarem imóveis por valores acima dos praticados pelo mercado e em más condições de conservação ou inadequado à sua necessidade. Em São Paulo, há grupos de imigrantes e refugiados que passaram a integrar movimentos de luta por moradia e que realizam ocupações em prédios centrais da cidade, muitas vezes em condições precárias. Tais circunstâncias contrariam não só garantias constitucionais, mas também a lei migratória, que traz considerações sobre a proteção dos direitos sociais, definindo em seu artigo 3º, dentre os princípios e diretrizes que regem a política migratória brasileira, “o acesso igualitário e livre do migrante a serviços, programas e benefícios sociais, bens públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia, serviço bancário e seguridade social”. A presente pesquisa objetiva fazer uma abordagem que aponte os principais aspectos desse direito fundamental formalmente garantido a imigrantes e refugiados e, por outro lado, a inércia do poder público quanto à sua concretização, investigando as possíveis estratégias de segregação e negação de direitos por parte do Estado brasileiro a esses grupos.  Segundo o Relatório da Missão Conjunta da Relatoria Nacional e da ONU (SAULE & CARDOSO, 2005, p. 30), só na cidade de São Paulo, “há mais imóveis vazios que famílias sem casa para morar. Os contrastes da maior cidade do país são tão grandes quanto sua população”. Neste sentido faz-se oportuno relacionar o direito à moradia com o direito à cidade (LEFEBVRE, 2008), uma vez que esta dimensão informa o verdadeiro conteúdo daquele direito e nos permite refletir sobre a dignidade da moradia e as estratégias de segregação espacial (VILLAÇA, 2001) que possam existir nestes contextos. Assim, o conteúdo do Direito à moradia abrange a questão da habitação, mas também aspectos relacionados à qualidade e forma de exercício dessa habitação (UNITED NATIONS, 2009), estando intimamente ligado à ideia da dignidade da pessoa humana e exigindo para a sua efetivação, dessa forma, a concretização de vários pressupostos, como por exemplo, a qualidade do meio ambiente em que se vive, as condições de saneamento básico do lugar, a distância que há entre a moradia e o local de trabalho, etc. Henri Lefebvre (2008), a partir da ideia do Direito à Cidade, pondera sobre a estreita ligação entre o acesso à moradia digna, a ocupação do espaço público e o resgate do prazer de viver no ambiente urbano. Neste contexto, Villaça (2001) argumenta que uma das características mais marcantes das metrópoles brasileiras é a segregação espacial das classes sociais em áreas distintas da cidade. A metodologia utilizada nesta pesquisa baseia-se em uma exploração documental e bibliográfica e utiliza-se também de dados empíricos extraídos de pesquisa anterior desta autora. Por fim, conclui-se que a segregação espacial promovida por um Estado que nega o direito à cidade a determinadas populações, e o seu consequente acesso à moradia digna, aprofunda-se quando se trata da população migrante, exigindo que políticas públicas de acesso à moradia sejam pensadas especificamente para essas pessoas, uma vez que experimentam sobrecargas de vulnerabilidades.

Publicado
11-09-2023