AS POLÍTICAS PÚBLICAS LOCAIS FRENTE À CRISE MIGRATÓRIA GLOBAL

  • Leticia Silva Holderbaun Universidade de Santa Cruz do Sul
  • Betina Hillesheim Universidade de Santa Cruz do Sul
Palavras-chave: Políticas Públicas, Biopolítica, Crise migratória

Resumo

Nos últimos anos, houve um aumento dos fluxos migratórios internacionais, atingindo a marca de 281 milhões de migrantes (3,6% da população) na metade de 2020. As causas para tais deslocamentos são diversas, destacando-se as catástrofes naturais, crises políticas e sanitárias. A pesquisa “Migrações e processos de in/exclusão” parte da problematização, a partir da materialidade legislativa do período de 2013 a 2017, das estratégias biopolíticas de gestão das vidas migrantes nos municípios gaúchos de Lajeado, Santa Cruz do Sul e Venâncio Aires. Observando os movimentos recentes, a pesquisa segue na interlocução com atores públicos do município de Venâncio Aires e atenta às discussões nos canais de mídia locais. Segundo dados da Polícia Federal, no ano de 2018, Lajeado concedeu vistos humanitários a 566 haitianos, 01 venezuelano e 24 senegaleses. No que tange ao Vale do Rio Pardo, Santa Cruz do Sul outorgou vistos da mesma categoria a 05 venezuelanos e 10 senegaleses. Venâncio Aires, apesar de ser o menor dos três municípios, contemplou 51 haitianos. Desde então, Lajeado e Venâncio Aires mantêm posições de destaque como receptores de expressivos fluxos migratórios. Entre 2020 e 2021, 1.941 migrantes residentes em Lajeado obtiveram o Registro de Nacional Migratório – majoritariamente, haitianos, colombianos e portugueses. Em Venâncio Aires, o destaque é da migração venezuelana, que irrompeu com a crise político-econômica no país vizinho. Desde o início de 2020, grupos de venezuelanos têm sido interiorizados para o município ou migrado de maneira independente. Em maio de 2022, registravam-se 429 de venezuelanos para um total de 511 migrantes residentes na cidade. Tendo em vista as repercussões dos deslocamentos internacionais nos contextos locais, diferentes estratégias biopolíticas são acionadas para gerenciá-las. Em Santa Cruz do Sul, são reforçadas as medidas de controle, tais como pedidos de informações, na câmara municipal, acerca do número de migrantes, nacionalidades, situação legal, se possuem doenças e estão vacinados, profissão e renda. Aqui, o biopoder que regula e investe na vida, teorizado por Michel Foucault (1985), é marcado pela proteção das vidas locais contra a ameaça do conflito global x local, produzindo uma realidade que evidencia o jogo de forças “nós e eles”. Os demais municípios, por outro lado, têm se mobilizado para minimizar os riscos e vulnerabilidades através das políticas públicas locais. Lajeado executou ações de acolhida por meio da Secretaria de Assistência Social, embora não haja política específica voltada aos migrantes. Em Venâncio Aires, as ações tiveram maior articulação: inaugurou-se um setor específico setor para atendimento a essa população e foi instituída, em nível municipal, uma política de acolhimento aos migrantes. Em um modelo de gestão biopolítica que opera não pela separação, mas pela captura dos sujeitos no domínio da regulação populacional, tais ações incluem o mapeamento do contingente migratório no município, de suas demandas e condições de vida, dando lastro a práticas de acolhimento sustentadas numa política local do “fazer viver” aberta às dinâmicas globais.

Publicado
11-10-2022