"NÃO CONSIGO TERMINAR UM RACIOCÍNIO!"
O CASO DE VIOLÊNCIA INTELECTUAL NA ENTREVISTA DE MANUELA D'ÁVILA NO PROGRAMA RODA VIVA
Resumo
A presente pesquisa se insere em uma proposta de análise acerca de formas de sujeição ontológica e deslegitimação epistêmica/intelectual de mulheres, no caso aqui investigado, em posição de poder. Nesse sentido, foi feito um estudo da entrevista da deputada e candidata à vice-presidência do Brasil, Manuela D’Ávila, cedida no dia 25 de junho de 2018 ao programa Roda Viva. A violência acompanha a sociedade desde o princípio e caracteriza o movimento de adaptação dos paradigmas patriarcais, indicando o pressuposto de desmerecimento do lugar de fala da mulher, principalmente, na política. Sendo assim, o presente trabalho se propõe a analisar o tipo de violência de caráter intelectual contra as mulheres, que ocorre de várias formas, aqui citadas três que têm por base a análise da entrevista: falta de legitimidade como forma de reduzir o raciocínio e a intelectualidade, supervalorização do senso comum frente aos argumentos da candidata e sutileza da opressão pela interrupção. Não há o objetivo de analisar o discurso, questionar o trabalho de jornalistas ou valorar argumentos, entretanto analisar como a entrevista se constitui, pelo recorte de gênero. Diante disso, é perceptível que as perguntas são feitas para indicar uma resposta e, quando não é a esperada, os/as entrevistadores/as constantemente tentam rebater os argumentos da deputada: de forma não construtiva, interrompendo sua fala na tentativa de “ensiná-la” sobre o tema. No período da entrevista que ocorreu em um espaço formal, ao vivo, com grande número de interlocutoras/es, a violência - quase imperceptível - acompanhou Manuela durante as 62 duas vezes que foi interrompida enquanto respondia às perguntas. Segundo a revista Marie Clarie e em comparação aos outros candidatos, Ciro Gomes foi interrompido 8 vezes e Guilherme Boulos 16, desse modo, os números trazem à tona a violência de gênero, por meio de recursos sexistas que atrapalham o raciocínio e comprometem a comunicação das mulheres. Ademais, a postura concisa e segura de Manuela desencadeia o confrontamento de intelectualidade, o contexto de disputa entre o modelo de mulher jovem dentro do campo político, desestrutura a base do patriarcado, que trata o feminino como inferior. Elementos da entrevista demonstram a relação de insegurança dos/as componentes da bancada que reafirmam suas falas como verdade, repetem perguntas, interrompem e concluem os blocos antes do término das falas da candidata, impossibilitando a finalização de raciocínios e propostas de governo. A violência contra o intelecto de Manuela representa a repercussão da opressão e reafirma a incapacidade de reconhecimento do sujeito feminino ativo no poder político - a figura da mulher, a notoriedade de modelos masculinos e a desvalorização da fala buscam o controle do corpo e da mente feminino. A conduta misógina analisada na entrevista de Manuela D’Ávila no Roda Viva, destaca a violência intelectual que ocorre com mulheres que confrontam o sistema patriarcal. Em síntese, as mulheres não se incluem no padrão masculino, por isso, deslegitimar o lugar de fala historicamente reprimido é seguir a lógica machista e violenta de silenciamento e não reconhecimento que, ontologicamente, faz com que as mulheres “não sejam”.
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