ESTRATÉGIAS DE CONVIVÊNCIA ESCOLAR PARA REDUZIR O BULLYING

ANÁLISE DA LITERATURA

  • Mônica Tessaro Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC).

Resumo

Este texto foi organizado a partir de uma investigação (Tessaro, 2022) que teve como foco as questões relacionadas a um tipo específico de violência que se manifesta na escola -  bullying, no contexto meio-oeste catarinense, a partir desta pesquisa foi possível pontuar alguns aspectos relevantes, entre eles: a presença do bullying no contexto das escolas da região meio-oeste de Santa Catarina, e por isso, indica-se a necessidade de oportunizar aos profissionais da educação conhecimentos teórico-metodológicos sobre a temática do bullying, visando a promoção da convivência.

Antes de anunciar o objetivo deste ensaio, se faz necessário definir o que é considerado bullying. Trata-se de uma ação de alguém mal-intencionado afim de afetar, feri, ou desconforta outra pessoa. Essas ações podem ser realizadas por meio do contato físico, verbal, por mímicas ou gestos obscenos, ou ainda, excluindo de forma intencional a vítima de um grupo. Nesse sentido, o termo bullying associa-se obrigatoriamente a três critérios: intencionalidade, repetição e desequilíbrio de força e poder entre a vítima e o agressor. É uma forma de violência cometida por um ou vários alunos sobre seus pares, sem aparente provocação por parte da pessoa que está sendo alvo das intimidações (Olweus, 1994).

Partindo dessas reflexões iniciais, endossamos que formar para a convivência não ocorre por meio da transmissão de conteúdos, mas pela participação crítica dos sujeitos coparticipes do contexto escolar. Diante disso, por meio de uma pesquisa de revisão bibliográfica, que visa estudar aquilo que está sendo publicado a respeito de um determinado tema, compreender diferentes aportes teóricos, metodológicos, tecer relações entre as pesquisas já publicadas e localizar lacunas (Tessaro, 2023), objetivamos verificar as estratégias de promoção da convivência na escola que vem sendo discutidas no contexto nacional publicadas na base de dados Scielo.

A primeira pesquisa bibliográfica que realizamos (Tessaro, 2022), com este mesmo objetivo, foi em julho de 2021 utilizando a composição de descritores: bullying AND escola, tendo como recorte temporal os anos de 2011 a 2021, onde localizamos 129 (cento e vinte e nove) trabalhos. Ao acessar os títulos e resumos dos respetivos trabalhos, verificamos que poucos tratavam da prevenção do bullying, e que havia uma similaridade entre eles: os artigos que abordavam a convivência como uma estratégia de promoção da convivência era de autoria e/ou coautoria partiam dos seguintes contextos: i) um grupo de pesquisadores vinculados à Universidade de São Paulo (USP), sob a orientação/coautoria da professora Dra. Marta A. Iossi Silva; ii) um grupo vinculado ao grupo de pesquisas GEPEM da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp), cujas professoras pesquisadoras em destaque são: as professoras Dra. Telma P. Vinha (Unicamp) e Dra. Luciene P. Tognetta (Unesp). Por esta razão, ampliamos nossa busca bibliográfica em livros e/ou capítulos de livros, artigos publicados em anais de eventos e/ou publicados em periódicos científicos indexados no Portal de Periódicos Capes, de autoria/coautoria e/ou orientação destas pesquisadoras.

Na ocasião, selecionamos 22 abordavam sobre a promoção da convivência como uma estratégia de prevenção do bullying, sendo assim, foram organizadas três categorias que indicam estratégias de promoção da convivência na escola que já estão sendo implantadas em escolas brasileiras, a saber: i) Implantação das Equipes de Ajuda; ii) O melhoramento do Clima Escolar; e iii) Teatro do Oprimido e os Círculos de Cultura (Tessaro, 2022). Falaremos brevemente sobre cada uma delas, com uma forma de apresentar as ações de promoção da convivência na escola que tem sido organizadas por algumas escolas no contexto brasileiro.

A implementação das Equipes de Ajuda faz parte de um Programa de Convivência (Tognetta, 2019; Tognetta et al., 2020; Vinha et al., 2016; Lapa, 2019) que contempla um conjunto de ações formativas para alunos e professores que envolve três elementos interconectados: a via pessoal; a via curricular e a via institucional, pois segundo Knoener, Santos e Souza (2020), quando se trata de convivência, a escola é responsável por algumas funções, entre elas: a organização e construção de propostas práticas – por meio do Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, de prevenção e enfrentamento das violências, entre elas, o bullying; conhecer o contexto em que os alunos estão inseridos; a mediação de conflitos.

Faz parte da constituição das Equipes de Ajuda o melhoramento do clima escolar. Desta forma, o clima escolar é compreendido “como o conjunto de percepções e expectativas compartilhadas pelos integrantes da comunidade escolar, decorrentes das experiências vividas, nesse contexto [...] normas, objetivos, valores, relações humanas, organização e estrutura física.” (Vinha; Morais; Moro, 2017, p. 8). O clima escolar é constituído por avaliações subjetivas das pessoas que integram a escola: alunos, professores e equipe gestora, as quais interferem diretamente na qualidade de vida, no processo de ensino-aprendizagem e nas relações inter e intrapessoais, por isso, é importante que cada escola conheça seu clima, para, a partir disso, traçar estratégias de enfrentamento dos seus problemas.

Já a organização de ações como o Teatro do Oprimido e os Círculos de Cultura se utilizam das técnicas de role-play envolvendo dramatizações e teatros, a qual contempla os pressupostos teórico-metodológicos da pedagogia freiriana (SILVA et al., 2019). Os resultados de pesquisas (Alencastro et al., 2018; Alencastro et al., 2020) indicam que intervenções desta natureza são exitosas na promoção da convivência, os estudantes são encorajados a compartilhar seus sentimentos e percepções, tendo a possibilidade de repensar seus modos de agir.

Sabemos que a convivência é tema de debate desde a aprovação da Lei n. 13.185, de 6 de novembro de 2015 (Brasil 2015). Em 2017, o Ministério da Educação homologou a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que apresenta um conjunto de aprendizagens consideradas essenciais aos estudantes brasileiros, com o objetivo de contribuir com a “formação integral” do sujeito. Entre os novos elementos propostos para o campo da educação, a BNCC incorpora dez competências gerais, que consubstanciam o desenvolvimento e aprendizagem dos estudantes, bem como, as três últimas competências (8, 9 e 10) estão relacionadas às questões da convivência (Brasil, 2018a).

E ainda, depois da promulgação da lei antibullying, tivemos a Lei n. 13.663, de 14 de maio de 2018, que alterou o artigo 12 da LDB, definindo que os estabelecimentos de ensino tem a incumbência de propor ações de promoção da convivência (Brasil, 2018b).

Nesse sentido, visando atualizar os dados acerca das estratégias de promoção da convivência na escola, atualizamos a pesquisa bibliográfica no dia 09 de junho de 2024  utilizando o recorte temporal 2022-2024, na base de dados Scielo, com o mesmo par de descritor: bullying AND escola, onde localizamos 18 trabalhos (publicados e preprints). Definimos como critério de inclusão trabalhos que apontam estratégias de promoção da convivência na escola e localizamos 3 artigos, os quais foram incluídos na amostra (Fernandes; Dell’Aglio, 2023; Pigozi et al., 2023; Vivaldi; Vinha, 2024).

Destacamos a relevância social do tema convivência, pois, é por meio da sua promoção que situações de violências, como a do tipo bullying podem ser prevenidas e solucionadas. Nesse sentido os programas de convivência ativos hoje no Brasil têm trabalhado com diferentes focos, a pesquisa de Fernandes e Dell’Aglio (2023) se utilizada da perspectiva teórica da Psicologia Positiva, tendo como ação de intervenção o Método Vivencial através de metodologias participativas, que consiste na combinação de diferentes estratégias (psicoeducação, atividades individuais e coletivas entre os estudantes, atividades a serem realizadas em família) inseridas em um componente curricular.

Nessa mesma linha, que trata sobre a importância de estratégias participativas, a pesquisa de Pigozi et al. (2023), aponta para uma outra abordagem teórica para discutir as questões da convivência, a freiriana, cuja destaca as rodas de conversa como ferramentas utilizadas em escolas, numa perspectiva de ação transformadora, não só dos estudantes, mas igualmente do contexto, onde a escola oportuniza vez e voz aos alunos para tratarem sobre seus conflitos e formas de ser relacionar uns com os outros.

Já para Vivaldi e Vinha (2024) antes de propor estratégias de promoção da convivência, faz-se necessário pensar a função social da escola e, por meio deste questionamento, refletir sobre: que ser humano desejamos formar? Este é o ponto de partida para debater a função das regras e das sanções instauradas na e pelas instituições educativas. Por esse motivo, a estratégia de promoção da convivência definida no estudo das respectivas autoras é a organização de um Programa de Formação que contemple professores, gestores, funcionários, famílias e estudantes. Trata-se de um processo de desenvolvimento de habilidades sociais, tanto dos adultos (profissionais da escola e famílias) quanto das crianças e adolescentes (estudantes) para lidar com os conflitos interpessoais que ocorrem no dia-a-dia e são inerentes às relações humanas.

Ao findar esta análise, destacamos primeiro, a escassez de pesquisas que tratem sobre estratégias pedagógicas de promoção da convivência na escola, entre as hipóteses da baixa divulgação de trabalhos que tratem sobre este tema destaca-se a falta de formação docente, segundo, a falta de relação entre o que preconizam as políticas públicas educacionais e as práticas efetivadas na escola. Falar de convivência significa auxiliar estudantes, suas famílias e os profissionais da educação desenvolver habilidades sociais e emocionais como uma forma de promover a interação entre si.

Alguns indicativos teórico-práticos que emergiram deste estudo e que podem ser explorados no contexto educacional:  i) Implantação das Equipes de Ajuda; ii) O melhoramento do Clima Escolar; iii) Teatro do Oprimido e os Círculos de Cultura; iv) Método Vivencial através de metodologias participativas; v) Rodas de conversa; vii) Programa de Formação – que contemple todos os sujeitos que integram os processos educativos da escola. Ou seja, estes indicativos nos indicam que – não basta falar sobre a convivência, faz-se necessário desenvolver estratégias de promoção.

Sabemos o desafio que é abrir espaço-tempo na escola para discutir temas transversais ao currículo, no entanto, saber conviver tem se mostrado a cada dia uma necessidade real, tanto dos alunos quanto dos professores. Diante desses fatos, pensar e organizar um plano de promoção da convivência na escola tem se mostrada, cada vez mais, uma necessidade, uma vez que os problemas envolvendo as violências têm aumentado consubstancialmente (Tognetta, 2020).

A convivência está presente em diferentes políticas públicas, entre elas, destacamos os indicativos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê, no art. 5º, que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão [...]” (Brasil, 1990, p. 11). Nessa mesma linha, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) indica que “a educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.” (Brasil, 1996, s/p). Convivência como processo formativo.

Seguindo os acontecimentos que caracterizam a preocupação da sociedade no que se refere à questão da convivência escolar, em nível federal, o Congresso Nacional aprovou a Lei n. 13.185, de 6 de novembro de 2015, demonstrando preocupação com o fenômeno das violências, especificamente, com a violência do tipo bullying. No artigo 5º está instituído que: “É dever do estabelecimento de ensino, dos clubes e das agremiações recreativas assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnóstico e combate à violência e à intimidação sistemática (bullying).” (Brasil, 2015, s/p). Convivência como medida orientativa dos comportamentos.

Também em 2017, o Ministério da Educação homologou a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). O documento apresenta um conjunto de aprendizagens consideradas essenciais aos estudantes brasileiros, com o objetivo de contribuir com a “formação integral” do sujeito (Brasil, 2018b). Entre os novos elementos propostos para o campo da educação, a BNCC incorpora dez competências gerais, que consubstanciam o desenvolvimento e aprendizagem dos estudantes. Convivência como formação humana.

E ainda, depois da promulgação da lei antibullying, tivemos a Lei n. 13.663, de 14 de maio de 2018, que alterou o artigo 12 da LDB, definindo que os estabelecimentos de ensino terão a incumbência de: “IX - Promover medidas de conscientização, de prevenção e de combate a todos os tipos de violência, especialmente a intimidação sistemática (bullying), no âmbito das escolas. X - Estabelecer ações destinadas a promover a cultura de paz nas escolas.” (BRASIL, 2018a, s/p). Convivência como um meio para a educação para a paz.

Portanto, conviver é uma das necessidades do ser humano, visto sua condição de agente social além disso, a aprendizagem da convivência é um direito garantido por lei. Conviver implica estabelecer relações éticas, de cuidado e respeito para com o outro. E a escola é uma das instituições co-responsáveis pela promoção da convivência quer pelos conteúdos que ensina, quer seja pelo modo com que ensina.

Publicado
01-10-2024
Seção
Trabalho Docente e Formação de Professores