POLÍTICAS EDUCACIONAIS DO SEGUNDO PROFESSOR NA EDUCAÇÃO ESPECIAL EM SANTA CATARINA

Autores

  • Rita Cacia Fachin Scramim Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS
  • Indiamara Tonello Rodrigues

Palavras-chave:

Apoio a turma, diversidade, inclusão

Resumo

No decorrer dos últimos anos a Educação Especial tem ganhado mais atenção das políticas públicas, através de leis que garantem e regulamentam a educação inclusiva de alunos com deficiência na rede regular de ensino, bem como, mais apoio aos alunos e professores. No decorrer desta pesquisa buscamos compreender e nos aprofundar nas leis e decretos que tratam da presença do segundo professor em sala de aula,  especialmente onde há alunos da Educação Especial. Essa medida é um avanço importante, mas ainda gera muitas dúvidas e desafios quando  envolve as práticas escolares.

Este estudo será ancorado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº  9.394/1996, com foco no  Estado de Santa Catarina,  na Política de Educação Especial para o Estado de Santa Catarina, de 2006, na Resolução nº 112/06/CEE/SC e, na Resolução nº 100/16/CEE/SC.

No estado de Santa Catarina é comum ouvir que o segundo professor é visto apenas como um apoio ao aluno com deficiência e que possui laudo médico. No entanto, essa função  do segundo professor precisa ser mais abrangente para ser um profissional que atue com toda a turma, e não apenas com um aluno específico, para que todos possam ser incluídos.Nas escolas, surgem muitas situações difíceis vividas pelos alunos, como depressão, isolamento, automutilação, abuso, violência e fome, que nem sempre aparecem nas políticas educacionais. Embora algumas normas falem em colaboração entre professores, elas não deixam claro como essa colaboração deve acontecer diante dessas realidades. Muitos alunos não têm laudo, mas isso não quer dizer que não precisem de acompanhamento e acolhimento. Esses casos mostram que a rotina escolar é muito mais complexa do que o que está previsto no papel. Por isso, é importante entender como a lei do segundo professor está sendo aplicada nas escolas de Santa Catarina, e que sentidos ela vem assumindo nesse contexto.. A presença do segundo professor na sala de aula tem sido frequentemente associada à inclusão escolar, sendo percebida, em alguns contextos,  voltada aos estudantes com deficiência. Porém, esta pesquisa busca refletir sobre os sentidos atribuídos a essa função no interior das políticas públicas e da prática pedagógica, analisando como essa  função é posicionada e direcionada no cotidiano escolar.

Essa pesquisa se justifica pela necessidade de refletir sobre como essa política foi escrita e está sendo colocada em prática,  e de que forma ela pode contribuir para a construção de uma educação mais justa, acolhedora e preparada para lidar com as diferentes realidades apresentadas pelos  estudantes.

Diante disso, objetiva-se analisar, neste resumo, como a função do segundo professor na Educação Especial é regulamentada no Estado de Santa Catarina, à luz da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), da Política Nacional de Educação Especial (2006), da Resolução CEE/SC nº 112/2006 e da Resolução CEE/SC nº 100/2016.

A pesquisa foi conduzida por meio de uma abordagem qualitativa, do tipo documental e bibliográfica, com foco na análise de documentos legais e fontes teóricas, que abordam o papel do segundo professor em sala de aula no Estado de Santa Catarina. Foram examinados textos normativos e orientadores, como o Caderno da Política de Educação Especial de 2018, visando identificar as diretrizes que regulamentam a atuação deste profissional no contexto da inclusão escolar. Além disso, o estudo considerou contribuições teóricas de autores que discutem a educação inclusiva e a corresponsabilidade pedagógica, com o intuito de compreender como a legislação se articula à prática educacional. A seleção dos documentos e das fontes bibliográficas foi orientada pelos critérios de relevância temática e atualidade, permitindo uma leitura crítica das políticas educacionais em vigor no estado.

Observou-se, a partir  da nossa experiência profissional , que  as pessoas  associam a presença do segundo professor de turma exclusivamente ao atendimento de alunos com deficiência, o que pode contribuir para a naturalização dessa compreensão entre os profissionais da educação.

 No entanto, essa é uma  interpretação equivocada  da lei. Quando há um aluno com deficiência em sala, toda a turma passa a ter dois professores, atuando de forma colaborativa, auxiliando não apenas com esse aluno, mas com todos, em conjunto com o professor regente da disciplina. Na prática, porém, percebemos que já no processo de contratação dos professores Admissão em Caráter temporário(ACTs) existe um certo direcionamento na escolha das vagas, principalmente quando é colocado o tipo de deficiência na vaga ofertada, o que pode comprometer a implementação dessa política de inclusão. A LDB nº 9.394/1996, anterior à Lei nº 13.876/2019, já previa a oferta de apoio especializado aos alunos com deficiência ou necessidades educacionais especiais, incluindo, quando necessário, a atuação de um segundo professor, no entanto não existe a obrigatoriedade de um segundo professor em sala de aula para todos os alunos, mesmo aqueles com deficiência ou necessidades educacionais especiais, estabelece a necessidade de apoio especializado, incluindo a possibilidade de um segundo professor, em casos específicos que demandem atendimento diferenciado. (Brasil, 1996, Art. 58, §1º).

Além disso, em determinadas situações é possível garantir a presença de um segundo professor em sala de aula, especialmente quando se trata de turmas que incluem alunos com deficiência. Isso se deve à necessidade de um acompanhamento mais atento e individualizado, com o objetivo de assegurar o processo de aprendizagem de todos os estudantes. A legislação segundo a Lei nº  17.143, de 16 de maio de 2017, reconhece, de forma importante, a necessidade de apoio às diferenças no ambiente escolar e ressalta o papel fundamental do segundo professor nos processos de ensino e de aprendizagem.A expressão Segundo Professor de Turma na lei  nº 17.143/2017 de Santa Catarina, e aparece já no início, nos artigos 1º e  2,º

Ela Dispõe sobre a obrigatoriedade da presença de segundo professor de turma nas turmas em que houver estudantes com deficiência, transtorno do espectro autista e altas habilidades/superdotação.( Diário Oficial do Estado,  2017, p. 2.)

 No entanto, apesar desse reconhecimento, a legislação restringe o acesso a esse suporte ao condicionar sua disponibilização a diagnósticos clínicos formais. Isso significa que, mesmo em casos evidentes de deficiência ou comprometimento funcional, é exigida uma avaliação médica para validar a presença do segundo professor. Essa exigência desconsidera a existência de alunos com condições semelhantes, mas que, por diferentes motivos, não possuem laudo médico, o que pode resultar em exclusão ou atraso no atendimento adequado às suas necessidades. No entanto, segundo o artigo IV da resolução CEE/SC nº 100/2016,

IV - Segundo Professor de Turma - disponibilizado nas turmas com matrícula e frequência de alunos com diagnóstico de deficiência intelectual, transtorno do espectro autista e/ou deficiência múltipla que apresentem comprometimento significativo nas interações sociais e na funcionalidade acadêmica. Disponibilizado também nos casos de deficiência física que apresentem sérios comprometimentos motores e dependência em atividades de vida prática; (Brasil, Resolução CEE/SC nº 100/2016, p. 4)

 

            Desta forma, percebe-se a ausência de diretrizes que deixem clara a atuação do segundo professor.  O texto a seguir mostra que  a rede estadual de ensino está preocupada em garantir apoio adequado aos estudantes da Educação Especial. Esse foi um motivo para a criação do serviço do Segundo Professor de Turma, que atua dentro da sala regular. Esse profissional com  foco em especial ao público alvo, que são os alunos com vários tipos de deficiências, mas atua ainda com toda a turma. Essa iniciativa reforça a importância da inclusão e do acompanhamento individualizado  e cuidadoso no ambiente escolar.  A Política de Educação Especial de Santa Catarina diz que,

 

Para garantir a permanência dos estudantes da Educação Especial na rede estadual de ensino, instituiu serviços especializados em Educação Especial, concebidos da seguinte maneira: a) Segundo Professor de Turma - oferece suporte e acompanhamento, nas classes regulares, ao processo de escolarização de estudantes com diagnóstico de deficiência intelectual, Transtorno do Espectro Autista e/ou deficiência múltipla, que apresentem comprometimento significativo nas interações sociais e na funcionalidade acadêmica.  (Governo do Estado de Santa Catarina,2018, p.41).

 

É fundamental que esse profissional compreenda com precisão qual é sua função, como deve ocorrer o trabalho conjunto com o professor regente e que tipo de formação continuada é necessária para o desempenho qualificado de seu papel. A definição clara dessas informações é importante para sustentar a atuação desse profissional como agente pedagógico, evitando que sua presença se limite a uma função de cuidador.

Além disso, do art. 7º explana que o  segundo professor de turma não poderá ser designado ou assumir outra função na escola que não seja aquela para a qual foi contratado. O documento recomenda “3º não assumir ou ser designado para outra função na escola que não seja aquela para a qual foi contratado, mesmo na eventual ausência dos estudantes especificados na Lei nº 17.143, de 15 de maio de 2017, no Inciso IV do artigo 5º desta lei;” (Brasil, 2017). Quando o texto afirma que o segundo professor deve ser contratado especificamente para determinada função e que não pode ser designado para outra atividade que não esteja prevista no contrato, essa orientação entra em contradição com a própria forma como o sistema estadual organiza a distribuição de vagas. Na prática, o sistema direciona o segundo professor para turmas com 1, 2 ou mais alunos com deficiência, como se sua presença estivesse exclusivamente condicionada à matrícula desses estudantes. No entanto, essa exigência não está claramente definida na legislação, o que gera uma interpretação restrita do seu papel. A política deveria reconhecer que o segundo professor é um apoio pedagógico permanente, não apenas vinculado a um número específico de alunos com deficiência, mas como um agente fundamental para promover práticas inclusivas em toda a turma. O modo como o sistema operacionaliza sua contratação, atrelando sua presença ao número de alunos diagnosticados, reforça uma lógica de atendimento segmentado e por demanda, o que enfraquece o princípio da inclusão como responsabilidade coletiva e contínua. Quando o texto afirma que o segundo professor não pode ser realocado nem mesmo na ausência dos alunos que justificam sua contratação, a política acaba reforçando a ideia de que esse profissional só está em sala de aula por causa da presença do estudante com deficiência. Isso demonstra uma visão limitada do seu papel, desconsiderando a prática pedagógica voltada para toda a turma. Com isso, a atuação do segundo professor deixa de ser vista como parte de um trabalho colaborativo e inclusivo, e passa a ser tratado como algo condicionado exclusivamente ao atendimento individualizado, o que enfraquece o verdadeiro sentido da inclusão escolar. destaco que,

 

A edificação de um ambiente colaborativo escolar tem se mostrado como importante suporte e apoio às complexidades que envolvem a construção de um ambiente escolar efetivamente inclusivo, que congrega uma série de demandas, dentre elas a existência de um bom ensino a todos os alunos, independentemente de suas especificidades. (Stopa et al, 2022, p.12)

 

Dessa forma, ao concluir esta análise documental, foi possível identificar que o Estado de Santa Catarina possui um conjunto de leis e decretos que buscam assegurar o suporte necessário à presença do segundo professor em sala de aula, especialmente em contextos que envolvem a Educação Especial. No entanto, constatamos que a existência de dispositivos legais não é suficiente para garantir a efetivação de uma prática pedagógica colaborativa e articulada entre os profissionais da educação.Para que o ensino inclusivo aconteça nas escolas, é preciso que normas venham acompanhadas de formação, planejamento conjunto e compromisso institucional com a inclusão e a gestão democrática. É fundamental não só normatizar, mas garantir condições reais para uma educação que respeite e valorize a diversidade no dia a dia escolar.

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Publicado

20-10-2025