COMPREENDENDO O LUTO VIVIDO POR IDOSOS QUE PERDERAM UM FILHO
Palavras-chave:
Luto, Saúde do Idoso, Promoção da Saúde, EnfermagemResumo
1 Introdução
O envelhecimento populacional é mundialmente evidente e é caracterizado pela transição demográfica gerada pela diminuição da natalidade e aumento da expectativa de vida da população, resultando em um aumento progressivo de pessoas idosas. Com isso, novas demandas sociais e de saúde são geradas, com necessidade de novas políticas públicas ou de total implementação das que já existem, para garantir direitos, autonomia e integração do público idoso na sociedade. Em busca dessa integralidade, a promoção da saúde e a qualificação profissional são essenciais para enfrentar situações como a vivência do processo de luto. O luto é uma resposta a perdas, que podem estar relacionadas a diversos aspectos da vida tais como a diminuição da capacidade funcional e do círculo social, além da perda de papéis na sociedade, do corpo mais jovem, a morte de conhecidos, amigos e familiares. Porém, o processo pode ser mais difícil quando se trata da perda de um filho. Ao longo da vida, muitas pessoas podem enfrentar a perda de um filho e viver o processo do luto. Cada um lidará com essas experiências de maneira particular, alinhada com seu modo de viver, seu lugar no mundo, sua personalidade e suas condições materiais e imateriais de existência. Essas situações impactam diretamente a saúde e envolvem os serviços de saúde e os profissionais que neles atuam (Aciole; Bergamo, 2019). Diversas teorias procuram explicar e compreender o luto e seus subtipos, abrangendo diferentes situações de perda. A exemplo, Kübler-Ross (2017) compreende o luto subdividindo-o em cinco estágios sobrepostos. O primeiro, denominado ‘negação e isolamento’, representa a fase inicial como forma de defesa do indivíduo; no segundo estágio, a ‘raiva’, há busca por explicações e culpados; na ‘barganha’, terceiro estágio, o enlutado busca negociar a perda; no quarto, a ‘depressão’, é marcado por sentimentos de melancolia; no quinto e último estágio, a ‘aceitação’, a perda passa a produzir efeitos menos disfuncionais no enlutado. Por outro lado, Bowlby e Parkes (1980) propuseram quatro fases ao luto, as quais se fundamentam na Teoria do Apego de Bowlby e Ainsworth, que busca compreender as reações diante dos rompimentos. A primeira fase, ‘entorpecimento e choque’, é marcada por reações de sofrimento ou raiva; o ‘anseio e a procura’ pelo ente ou saudades; a ‘desorganização e desespero’ demonstra dificuldade do enlutado em fazer as tarefas cotidianas e a ‘reorganização’, se caracteriza pelo enlutado retornar a vida (Franco, 2021). Entretanto, é improvável prever a reação de uma pessoa diante de uma perda e quais caminhos ela seguirá em seu processo do luto, que é complexo, único e envolve múltiplos fatores, sendo definido pelos sentimentos, crenças, personalidades, experiências e outras características individuais (Oliveira; Lopes, 2008; Oliveira; Souza; Figueiredo, 2020). Este estudo discute o processo do luto em idosos marcados pela perda de um filho, assunto pouco referido em meio acadêmico, servindo como estímulo para profissionais da saúde a um olhar mais humanizado no atendimento de idosos enlutados.
2 Objetivo
Compreender a vivência do processo de luto por idosos que, durante a vida, perderam um filho.
3 Metodologia
Trata-se de pesquisa de abordagem qualitativa, descritiva e exploratória, da qual participaram oito idosos residentes de Chapecó/SC e que vivenciaram o luto pela morte de um filho em algum momento da vida. Os participantes foram selecionados pelo método de cadenciamento de referência Snowball Sampling (Ghaljaie; Naderifar; Goli, 2017) e foram convidados a participar por telefone. A idade dos participantes variou de 62 a 95 anos, sendo sete mulheres e um homem. Como critérios de inclusão: ter acima de 60 anos; ter vivenciado o luto por um filho; residir no município de Chapecó e ter acesso a um dispositivo eletrônico. Como critérios de exclusão: ter diagnóstico de doença neurodegenerativa e/ou psiquiátrica que impossibilitasse a participação no estudo. As entrevistas foram presenciais e individuais, utilizando um roteiro de questões. Os dados foram analisados com Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) (Lefèvre; 2017). Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal da Fronteira Sul (parecer nº 5.832.479). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento livre e Esclarecido.
4 Resultados e Discussão
Da análise dos dados emergiram nove temáticas que abordam assuntos diversos sobre o luto em idosos. Os participantes do estudo refletiram sobre a diferença do luto pela perda de um filho e de demais lutos vividos durante a vida. Para alguns, todas as perdas são difíceis, mas perder um filho gera um sofrimento incomparável, visto que o impacto que a falta causará está relacionado com o nível de vínculo e afeto entre o ente e a pessoa que ficou, neste sentido, o vínculo entre pais e filhos normalmente é forte e afetuoso (Nascimento, 2021). Por outro lado, outros idosos mencionaram que para eles todas as perdas são iguais, reforçando a singularidade e peculiaridade de cada indivíduo. Os idosos descreveram suas reações quando receberam a notícia da morte de seus filhos, que incluíram o desespero, choque, dor, tristeza e perda de sentido na vida. O estágio de Depressão descrito por Kubler-Ross (2017) assemelha-se às informações de tristeza e falta de sentido na vida, bem como o estágio de Entorpecimento e Choque da teoria de luto de Bowlby e Parkes pelo choque e incapacidade de acreditar no ocorrido. A duração dos sentimentos e do luto pode durar muito tempo, ainda mais quando se perde um filho e o luto e a falta podem nunca passar, porém percebe-se o desenvolvimento de processos adaptativos para seguir adiante. Compreende-se que o luto não tem prazo de validade, pois, se houvesse a tentativa de enquadrá-lo em um tempo pré-estabelecido, seria desconsiderado a individualidade de vivência desse processo. No entanto, quando o luto causa dificuldades no cotidiano e afeta a vida social do enlutado, é possível que seja um luto complicado, que requer o apoio de profissionais de saúde mental (Franco, 2021). Para além do luto existem sentimentos persistentes que perdurarão por toda a vida daqueles que sofreram a perda. Os participantes referiram a saudade, o sentir-se inconformado e a constante lembrança como aspectos da perda que perduram. Além da esperança de reencontro na vida após a morte ou retorno do ente em algum momento da vida, sendo possível visualizar a fase da barganha e negação da teoria de Kubler-Ross (2017). Dentre as maneiras apontadas pelos entrevistados para enfrentar o luto destacam-se a oração, a igreja e a fé em Deus. A religiosidade e a espiritualidade são recursos pessoais que as pessoas podem desenvolver ao longo da vida, contribuindo para um envelhecimento saudável e oferecendo suporte em momentos de crise, como a perda de um filho (Silva Júnior; Eulálio, 2022). Os idosos também refletiram sobre o cuidado com a saúde durante o luto, na qual relataram indiferença entre viver e morrer, desinteresse pelo autocuidado e dificuldades em se alimentar adequadamente, evidenciando que, durante o luto, a saúde pode ser negligenciada. Dentre as etapas descritas por Bowlby e Parkes (apud Cavalcante, 2020), é possível relacionar com o estágio de desorganização, onde é comum a perda do apetite e de peso, além da diminuição da capacidade de atenção e memória. Porém, dependendo da continuidade dos sintomas e sua intensidade, gera danos à saúde física, mental e emocional, tais aspectos congruem com a possibilidade de um luto patológico (Franco, 2021). O processo do luto deixa os indivíduos mais sensibilizados e necessitados de apoio, desse modo, os idosos relataram que o apoio recebido durante o luto veio de familiares, vizinhos, da religião e de profissionais de saúde e serviços especializados em saúde mental. Por mais que este processo seja difícil e desafiador, os idosos relataram que a perda do filho ensinou a valorizar as pessoas e a vida humana, a ter forças e fé. Por fim, os participantes ainda aconselharam outros pais que perderam um filho a buscar a fé e o apoio de outras pessoas, desenvolver a resiliência, na busca por maneiras de crescimento e adaptação da vida, mesmo após a notícia da morte do ente, além de buscar ajuda profissional quando necessário.
5 Conclusão
São muitas as teorias que trazem a compreensão do luto, não sendo possível utilizar somente uma delas para discutir o resultado da pesquisa. O luto interfere de maneira multifacetada no dia a dia do enlutado e cada indivíduo o vivenciará de forma singular. Observou-se diversas facetas desse processo, desde as reações iniciais até a evolução do luto ao longo do tempo. O luto por um filho tem maiores chances de se complicar e de precisar de ajuda profissional, mas nem toda a saudade ou sensação de falta caracterizam um luto complicado. Em especial aos idosos, a vivência do luto pela perda de um filho pode se complicar e tornar-se uma questão de saúde importante, dessa forma, a busca pela integralidade do cuidado deve abranger também o processo do luto. Por mais que esta seja uma situação difícil, os idosos conseguiram extrair aprendizados dessa vivência, além de aconselhar outras pessoas que passaram ou ainda vão passar por uma situação semelhante. Desse modo, o estudo proporcionou novas perspectivas para o processo do luto por idosos que em algum momento da vida perderam um filho, como também, contribuiu para a construção de conhecimento sobre o tema e destacou a importância de considerar o luto como um dos vários fatores determinantes da saúde e bem-estar dos idosos.
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