CONTRIBUIÇÕES DA ESCALA DE DESEMPENHO EM CUIDADOS PALIATIVOS (EDCP) NA AVALIAÇÃO FUNCIONAL DE PACIENTES ONCOLÓGICOS

Autores

  • Juliana Hirt Batista
  • Willian Lorentz
  • Rafael de Lima Carmo
  • Vander Monteiro da Conceição

Palavras-chave:

Enfermagem, Cuidados Paliativos, Capacidade Funcional

Resumo

  1. Introdução

Nos últimos anos, com transição epidemiológica e demográfica, além da crescente melhoria na implementação de pesquisas e tecnologias voltados ao cuidado, houve o aumento da expectativa de vida da população, por conseguinte, aumentou progressivamente a prevalência de doenças crônicas, destacando a necessidade de cuidados paliativos (CP) em diferentes níveis de atenção à saúde (Calazans, et al. 2024; Neto, 2019).

A concepção de cuidados paliativos foi descrita pela Organização Mundial da Saúde (OMS) pela primeira vez em 1990, e sua última atualização ocorreu em 2018. Ela determina que cuidados paliativos (CP) devem ser ofertados para a melhoria da qualidade de vida de pessoas que enfrentam doenças ameaçadoras à vida, em busca de prevenir, avaliar e aliviar os sinais e sintomas que levam ao sofrimento físico, psicológico, social e espiritual no curso do adoecimento (Brasil, 2023).

Nesse contexto, entende-se como doença grave e ameaçadora à vida qualquer doença aguda ou crônica, que está associada a um alto grau de mortalidade, e que traz prejuízos à qualidade de vida e sua funcionalidade. As doenças ameaçadoras à vida, com ou sem possibilidade de reversão ou de tratamentos curativos, despertam a necessidade de um olhar para o cuidado amplo e complexo, voltado à totalidade da vida ao paciente e com respeito ao seu sofrimento e ao de seus familiares (Silva, et al., 2020).

A capacidade funcional de pessoas com doenças avançadas, especialmente no contexto oncológico, é um indicador clínico essencial para o planejamento e a individualização da assistência, ela é definida como a capacidade de uma pessoa realizar atividades relacionadas ao autocuidado, à mobilidade e às funções da vida diária, sendo um indicador essencial da condição clínica e da qualidade de vida do adoecido (Oliner, et al.,2020). Instrumentos como a Palliative Performance Scale (PPS), traduzida neste trabalho como Escala de Desempenho em Cuidados Paliativos (EDCP), são utilizados para avaliar essa capacidade de forma estruturada, sua avaliação orientar decisões terapêuticas e prever desfechos clínicos, como complicações, resposta ao tratamento e prognóstico clínico (Ferreira, et al., 2024).

Apesar do uso crescente da EDCP na prática clínica internacional, sua aplicação no Brasil ainda carece de validação metodológica para garantir precisão, aplicabilidade e relevância cultural. Estudos apontam que a EDCP oferece vantagens em relação a escalas tradicionais, como a o Karnofsky Performance Status (KPS), sobretudo por sua adequação à prática e aos princípios dos CP. No entanto, sua eficácia no contexto brasileiro depende de evidências de validade e confiabilidade, contribuindo para a qualificação da assistência e tomada de decisão clínica baseada em evidências (Santos; Carneiro; Carvalho, 2022).

Logo, instrumentos que subsidiam o julgamento clínico são essenciais, desde que estejam calibrados ao cenário. A identificação de instrumentos específicos para o contexto brasileiro não é apenas uma abordagem metodológica, mas uma condição necessária para a qualificação da prática clínica e para a consolidação dos cuidados paliativos como componente essencial do sistema de saúde.

Diante disso, este trabalho tem como objetivo apresentar os achados da literatura científica acerca do uso da EDCP como instrumento de avaliação funcional em cuidados paliativos oncológicos, discutindo suas principais contribuições e possibilidades de aplicação clínica no contexto brasileiro.

  1. Metodologia

Trata-se de uma revisão narrativa de literatura, com abordagem crítica e descritiva, desenvolvida no contexto de construção do referencial teórico para futura pesquisa de validação da EDCP no Brasil. Para inclusão das bibliografias foram utilizadas as bases de dados: Biblioteca Virtual em Saúde (BVS); PubMed/Medline, Lilacs e Scielo, utilizando os descritores e combinações:  “enfermagem”, “cuidados paliativos”, “capacidade funcional” e “estudos de validação”, com os operadores booleanos “AND” ou “OR” e seus correspondentes em inglês.

Foram incluídos artigos publicados entre 1996 (ano de criação da EDCP) a 2024, que abordassem o uso da EDCP em contextos de cuidados paliativos oncológicos, voltados à avaliação funcional, prognóstico clínico e tomada de decisão. Após a leitura dos títulos, resumos e textos completos, foram selecionados estudos que apresentassem discussões teóricas sobre a aplicabilidade e utilidade da EDCP na prática clínica.

  1. Resultados e discussão

A análise dos estudos revelou que a EDCP é um instrumento consolidado em diversos países, como Canadá, Japão, Reino Unido e Estados Unidos, sendo utilizada na estratificação prognóstica, na definição de planos terapêuticos e no apoio à comunicação clínica. Estudos como o de Morita et al. (1999) demonstraram forte correlação entre os escores da EDCP e a sobrevida de pessoas com câncer terminal, classificando-a como uma ferramenta útil e sensível para prever o tempo de vida restante, especialmente quando aplicada no momento da admissão em unidades de CP.

Na prática clínica, a EDCP facilita a comunicação entre os membros da equipe multiprofissional, promovendo uma linguagem comum para descrever o estado funcional dos pacientes. Além disso, contribui para o monitoramento da progressão da doença e a identificação de momentos-chave para transição de metas terapêuticas, como a suspensão de medidas curativas invasivas e a priorização do conforto (Santos; Carneiro; Carvalho, 2022).

Em comparação com escalas como a KPS, a EDCP mostrou-se mais estruturada e de fácil aplicabilidade. Sua utilização permite maior uniformidade nas avaliações, maior sensibilidade ao declínio progressivo e reforça o papel da enfermagem na avaliação contínua e humanizada das pessoas em fase avançada da doença (Ferreira et al., 2024).

No entanto, no contexto brasileiro, a EDCP ainda é subutilizada, muitas vezes substituída por avaliações clínicas subjetivas. Embora reconhecida por profissionais da área, a escala carece de validação formal que assegurem sua aplicabilidade e precisão em diferentes realidades assistenciais (Lopes et al., 2023).

A recente instituição da Política Nacional de Cuidados Paliativos (PNCP) em 2024 reforça a urgência de incorporar instrumentos clínicos padronizados na rotina dos serviços de saúde. A EDCP surge, portanto, como uma ferramenta promissora para apoiar a operacionalização dos cuidados paliativos no SUS, desde que acompanhada da capacitação profissional e estudos de validação no país (Brasil, 2024).

  1. Considerações finais

A Escala de Desempenho em Cuidados Paliativos (EDCP) demonstra, segundo a literatura científica, elevado potencial de contribuição para a prática clínica em cuidados paliativos oncológicos. Sua aplicação permite avaliação objetiva da capacidade funcional, favorece decisões terapêuticas baseadas em evidências e promove uma abordagem centrada na dignidade da pessoa.

Embora amplamente utilizada em contextos internacionais, no Brasil sua adoção ainda é incipiente, exigindo pesquisas para a sua validação metodológica. Estudos futuros são necessários para garantir sua validade, confiabilidade e aplicabilidade no contexto nacional para sua aplicabilidade clínica, especialmente diante das desigualdades regionais e da carência de formação específica na área.

A EDCP se apresenta como um instrumento estratégico para qualificar o cuidado paliativo, fortalecer a atuação da enfermagem e apoiar políticas públicas que visem à promoção da qualidade de vida de pessoas com câncer avançado. Ao reconhecer a funcionalidade como marcador clínico, o instrumento contribui para uma prática mais ética, humanizada e resolutiva no enfrentamento da terminalidade.

Referências

BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de Cuidados Paliativos: 2ª edição revisada e ampliada. CONASS – Conselho Nacional de Secretários de Saúde, 2023. Disponível em: https://proadi-sus.org.br/manual-cuidados-paliativos.pdf

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 3.681, de 7 de maio de 2024. Institui a Política Nacional de Cuidados Paliativos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: MS, 2024. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2024/prt3681_22_05_2024.html

CALAZANS, Gabriela Melo; et al. Mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis na população brasileira de 30 a 69 anos de idade: a importância dos cuidados paliativos. Brazilian Journal of Implantology and Health Sciences, v.6, n. 7, p. 2699-2715, 2024. Disponível em: https://bjihs.emnuvens.com.br/bjihs/article/view/2685/2897. DOI: https://doi.org/10.36557/2674-8169.2024v6n7p2699-2715

FERREIRA, Alyni Sebastiany Mendes. et al. Ferramentas prognósticas de sobrevida em cuidados paliativos: revisão de escopo. 2024. Disponível em: https://www.scielo.br/j/brjp/a/fzWD3yXppsTkbwbmFKpYcjj/?lang=pt&format=pdf.

DOI: https://www.scielo.br/j/brjp/a/fzWD3yXppsTkbwbmFKpYcjj/?lang=pt&format=pdf

LOPES, Juliana de Lima et al. O uso de ferramenta prognóstica para estimar sobrevida e estabelecer plano de cuidados no câncer avançado: revisão de literatura. CERES - Health & Education Medical Journal, v. 1, n. 3, p. 161–178, 28 set. 2023.

MORITA, T. et al. Validity of the Palliative Performance Scale from a survival prediction perspective. Journal of Pain and Symptom Management, v. 18, n. 1, p. 2–3, 1999.

NETO, Luiz Alves Araújo. Muito além da transição epidemiológica: doenças crônicas no século XX. Livros & Redes. Histórias e Ciências da Saúde, v. 26, n.1, p. 353-355, 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/hcsm/a/YXmmBtwjDMNV7YwxRZzvJGz/?lang=pt. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-59702019000100022

OLINER, M. et al. Functional status assessment in oncology patients: a comprehensive review. Journal of Clinical Oncology, v. 38, n. 15, p. 1783-1791, 2020.

SANTOS, Amanda Ellen Bezerra dos; CARNEIRO, Ana Catarine Melo de Oliveira; CARVALHO, Viviane Lemes da Silva. O uso de escalas prognósticas e de performance em uma unidade de internação especializada em Cuidados Paliativos. Brazilian Journal of Development, v. 8, n. 2, p. 8510–8524, 2 fev. 2022.

SILVA, Rafaela Miranda da; et al. The importance of nursing care in palliative care. Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research, v. 32, n. 1, p. 83-87, 2020. Disponível em: https://www.mastereditora.com.br/periodico/20200907_163540.pdf

Downloads

Publicado

24-11-2025