USO DA TERMOGRAFIA INFRAVERMELHA PARA AVALIAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO E TEMPERATURA SUPERFICIAL CORPORAL DE FELINOS SOB EFEITO DE GABAPENTINA
Palavras-chave:
Hemodinâmica, Estresse, Função Autonômica, Felinos, TermometriaResumo
- Introdução
O ambiente hospitalar pode representar um fator estressor importante para felinos, devido às situações que envolvem desde o transporte até a manipulação necessária para exames clínicos e laboratoriais. Esse estresse pode afetar negativamente o bem-estar dos pacientes e comprometer tanto os resultados dos exames quanto parâmetros fisiológicos utilizados para avaliação clínica (Griffin, et al., 2021; Quimby; Smith; Lunn, 2011).
Dentre as alterações observadas, destaca-se a hipertermia induzida por estresse, associada à ativação do sistema nervoso autônomo simpático. Nesse contexto, torna-se essencial considerar o estresse como um fator que pode interferir na interpretação de dados clínicos, principalmente em relação à temperatura corporal (Quimby; Smith; Lunn, 2011; Zethof, et al., 1995).
Dessa forma, entende-se que a avaliação da temperatura corporal é essencial ao manejo dos felinos em ambiente hospitalar, porém, métodos tradicionais como a termometria retal, apesar da precisão e confiabilidade, podem não ser facilmente tolerados por alguns pacientes, aumentando o estresse e por vezes causando agressividade durante o manejo e contenção física (Gomart, et al., 2014; Hall; Fleming; Carter, 2019).
Assim, a termografia infravermelha (TIV) surge como uma alternativa não invasiva e promissora, permitindo a avaliação da temperatura superficial corporal e sobre o estado autonômico dos animais, com menor desconforto ao paciente. Uma vez que o sistema nervoso autônomo simpático atua sobre a circulação cutânea causando vasoconstrição ou vasodilatação, tais alterações podem ser percebidas com o uso da TIV em locais específicos (Casas-Alvarado, et al., 2020; Ghezzi, et al., 2024; Hall; Fleming; Carter, 201; Taylor, et al., 2022).
Além disso, fármacos como a gabapentina são frequentemente utilizados para reduzir o estresse e permitir a realização de procedimentos diagnósticos em felinos, sendo necessário compreender seus impactos sobre a fisiologia autonômica e térmica dos animais (Haaften, et al., 2017; Simon; Steagall, 2020; Taylor, 2009; Veronezi, et al., 2022).
Assim, este estudo visa avaliar a resposta autonômica ao estresse em felinos por meio da análise comportamental, térmica e da variabilidade da frequência cardíaca, verificando a aplicabilidade da TIV como método complementar e não invasivo de avaliação do sistema nervoso autônomo e temperatura superficial corporal, antes e após a administração de gabapentina.
- Metodologia
A pesquisa será realizada na Superintendência da Unidade Hospitalar Veterinária Universitária da Universidade Federal da Fronteira Sul, campus Realeza, após aprovação pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA-UFFS). O tamanho da amostra foi calculado por meio de software, considerando o teste estatístico t pareado, o tipo de análise de poder selecionado foi a priori, considerando tamanho de efeito de 0,5, α=0,05 e poder estatístico de 0,80.
O estudo terá caráter experimental e contará com 27 gatos domiciliados, machos ou fêmeas, entre 1 e 6 anos de idade, pesando entre 2 a 6 kg, selecionados de forma aleatória a partir do consentimento dos tutores para participação na pesquisa. Serão selecionados apenas animais saudáveis e aptos a participar do estudo, por meio de triagem envolvendo anamnese, exame físico geral e avaliação cardíaca.
Após a triagem, o protocolo experimental será cruzado, randomizado e duplo-cego, iniciando com a administração de uma substância (gabapentina 100 mg/gato ou placebo) por via oral pelos tutores ainda em ambiente domiciliar, 90 minutos antes do transporte dos gatos até o ambiente hospitalar. Já no hospital veterinário, as avaliações incluirão exame físico geral com aferição de pressão arterial, frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura retal, além da aplicação da escala comportamental Cat Stress Score.
A aquisição de imagens por termografia infravermelha será realizada com a câmera FLIR TG267®, em janelas térmicas específicas como carúncula lacrimal, superfície ocular, canto lateral dos olhos, glabela, plano nasal, região dos cotovelos, costal, abdominal média e porção distal dos membros pélvicos. Além disso, variabilidade da frequência cardíaca será avaliada por meio de eletrocardiograma computadorizado em registros de cinco minutos, considerando parâmetros lineares e não lineares, como SDNN, RMSSD, ApEn, CVI, CVS e DFAα1/α2, no domínio do tempo em milissegundos.
Após as avaliações realizadas, os pacientes retornarão para casa em período de washout de sete dias. Depois deste período, os pacientes receberão nova substância (gabapentina 100 mg/gato ou placebo) e repetirão as avaliações em ambiente hospitalar. Os dados obtidos serão submetidos a testes de normalidade de Shapiro-Wilk e, conforme a distribuição, serão analisados por teste t pareado para dados paramétricos, ou por teste de Wilcoxon para dados não paramétricos, adotando-se nível de significância de 5% (p < 0,05).
- Perspectivas e Resultados esperados
A partir da presente pesquisa, espera-se que a administração de gabapentina resulte na redução do estresse de felinos em ambiente hospitalar, promovendo a diminuição do tônus simpático, podendo ser evidenciada pela redução da temperatura na carúncula lacrimal.
Acredita-se que a TIV seja uma ferramenta viável e complementar para a avaliação indireta da atividade do sistema nervoso autônomo simpático em gatos, bem como para o monitoramento da temperatura corporal superficial, contribuindo para a adoção de alternativas não invasivas no manejo de felinos em ambiente hospitalar, reduzindo os impactos negativos sobre o bem-estar.
Referências
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ZETHOF, T. J. J. Stress-induced hyperthermia as a putative anxiety model. European Journal of Pharmacology, v. 294, n. 1, p. 125-135, 1995. DOI: https://doi.org/10.1016/0014-2999(95)00520-X.
Agradecimentos
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo apoio à formação acadêmica por meio da concessão de bolsa de estudos. À minha orientadora, a Professora Dra. Tatiana Champion, pelo incentivo, orientação dedicada e confiança ao longo da minha trajetória acadêmica.
