A PÓS-GRADUAÇÃO NA PERSPECTIVA DO CUIDADO

UMA FORMA DE PENSAR A RELAÇÃO ENTRE ORIENTADOR E ORIENTANDO

  • patrycia Sbeghen Zanatta UFFS
  • Zoraia Aguiar Bittencourt UFFS

Resumo

Ao desejo de abordar o aspecto da intimidade como um ato de cuidado na relação entre orientador e orientando na Pós-Graduação, partiremos da perspectiva que esta relação estabelece-se na comunhão de saberes, afeto e amor. Buscaremos nesse resumo, através de uma revisão bibliográfica, olhar para a presença da intimidade no vínculo orientador-orientando no contexto da Pós-Graduação como um afeto traduzido em um ato de cuidado. Para isso, buscaremos em Gilligan (1982) uma definição da constituição ética do cuidar através da noção de intimidade e em Dunker (2017) a experiência da intimidade que permite o compartilhamento do possível, o reconhecimento do que não se pode partilhar e o cuidado com o impossível de ter e de ser.

Conforme Viana (2010), dentre os inúmeros desafios enfrentados pelo orientando no processo de construção da sua produção acadêmica, há um em destaque e relacionado a quase todos os outros, a sua relação com o seu orientador, ou seja, pode ser um aspecto que contribui ou dificulta de forma decisiva a sua trajetória, pois esses sujeitos enquanto humanos se encontram para compartilhar uma caminhada, que pode acontecer por opção ou imposição e que pode gerar ações de dependência e independência. Ainda, como aqui abordaremos, constitui-se uma caminhada compartilhada entre esses sujeitos e sua capacidade para “sofrer juntos” ou “sofrer separados” com as adversidades cognitivas e afetivas exigidas ao longo da escrita de um trabalho de tese ou dissertação. (DUNKER,2017, p.16)

Nessa perspectiva, esta capacidade pode ser nomeada como uma relação educativa de horizontalidade, que leva em consideração os níveis distintos de formações, maturidade profissional e pessoal, com o objetivo comum de apresentar uma construção solidária de produção acadêmica. Desse modo, o autor apresenta o trabalho de orientação como “ajuda, apoio, guia amigável” ou “como trabalho conjunto, parceria, compartilhamento, provocação, autonomia, co-autoria, co-participação, convivência com o orientando”. (VIANA, 2010, p.97).

Sobre as duas concepções há algo que permite esse trabalho, a intimidade. De acordo com Gilligan (1982), enquanto para o gênero masculino o processo de separação e individuação é tido como essencial para o desenvolvimento da masculinidade, para o gênero feminino tal processo de separação e individuação não interfere como nos meninos para a construção de sua identidade feminina. Isso significa dizer que “a masculinidade define-se através da separação enquanto a feminilidade define-se através do apego, a identidade de gênero masculina é ameaçada pela intimidade, ao passo que a identidade de gênero feminina é ameaçada pela separação” (GILLIGAN, 1982, p.18).

Retomando as ideias de Gilligan (1982), poderíamos indagar se a relação orientador-orientando enquanto um vínculo de intimidade se constituiria do “agrupamento” da relação feminina e masculina? Para responder a esse questionamento, buscamos aporte em Dunker (2017), que considera a experiência da intimidade como uma tentativa de equilibrar a aproximação e o afastamento que existe entre os sujeitos dispostos a construir um vínculo entre si, por isso o autor aborda a intimidade como uma discussão social e política, a qual poderíamos arriscar a dizer que se expressa duplamente como masculina e feminina.

Assim, é preciso olhar para o tratamento estabelecido numa relação de intimidade através de ações de cuidado. E o que significa isso? Podemos dizer que cuidar de um vínculo como o existente entre orientador-orientando é perceber que, ao conhecer intimamente o outro, aproximando-se e afastando-se nessa relação, não é preciso ser igual para fazer algo juntos. Para Gilligan (1982) e Dunker (2017), a intimidade de certa forma segue junto com a identidade à medida que os sujeitos vêm a conhecer-se como são também conhecidos, através de seus relacionamentos com os outros. Logo, torna-se relevante abordar essa temática dentro da Pós-Graduação, pois, muitas vezes, conforme Viana (2010), percebe-se nos Programas de Pós-Graduação uma lacuna de debates sobre a importância da relação orientador-orientando para a construção de uma identidade compartilhada, ou seja, sobre possibilitar um engajamento identitário dos pesquisadores em Ciências Humanas através do afeto.

Publicado
16-11-2021