HAITIANAS NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
SUBSIDIANDO A FORMAÇÃO MÉDICA E INSTRUMENTALIZANDO AÇÕES NA ATENÇÃO BÁSICA
Resumo
Chapecó, no Oeste catarinense, é um dos destinos de haitianos que buscam melhores condições de vida, principalmente, após o terremoto no Haiti, em 2010. A partir de inserções no Sistema Único de Saúde (SUS) estudantes, docentes do curso de Medicina (UFFS) e equipe do Centro de Saúde da Família (CSF) Jardim América buscaram entendimento para a não adesão das haitianas aos tratamentos em saúde oferecidos pelo CSF. O objetivo deste é apresentar reflexões sobre aspectos culturais que se refletem nas práticas de saúde das haitianas. Trata-se de pesquisa qualitativa e descritiva, que utilizou entrevista, pesquisa documental e pesquisa bibliográfica, cuja técnica de análise dos dados foi a hermenêutico-dialética. Os relatos dos entrevistados – estudante de enfermagem e médico, ambos haitianos – informam que o Haiti é um país “sem perspectivas” e que “a imigração é um grande negócio” para as famílias e para o Estado. No Haiti a saúde pública é parcial e restrita ao espaço urbano e, principalmente, à capital (Porto Príncipe). Entretanto, a maior parte da população está na zona rural e é dependente de ajuda internacional (ONG e Missões religiosas). No Brasil, as haitianas têm acesso e “talvez, por isso haja certo estranhamento” uma vez que “é algo desconhecido para elas (...)”. Em termos culturais citaram que há um sistema de crenças e atitudes de práticas de saúde-doença: o “vodu de curar”, que é uma expressão ritualística de cura que mobiliza curandeiros (hougan). O vodu, associado a ervas e chás, seria a primeira alternativa desta população. Quando o quadro clínico se agrava, recorre, então, aos serviços de saúde existentes. Os entrevistados afirmam que a maioria dos haitianos tem a visão de que um curandeiro os entende melhor que o médico, além de a percepção de risco ser baixa e, na ausência ou remissão dos sintomas, o retorno ao serviço de saúde geralmente deixar de ocorrer. De acordo com a literatura, o povo haitiano tem histórico de migração, sendo, portanto, criado o Ministério de Haitianos Vivendo no Exterior. Cada emigrante envia remessas ao Haiti para sobrevivência de familiares, incrementando a economia haitiana. Apresenta traço cultural forte na atribuição de papéis tradicionais cabendo ao homem o espaço público e à mulher, o privado. No Brasil, eles trabalham em funções pouco prestigiadas, que requerem força física e tarefas repetitivas e elas cuidam da casa e filhos. Condição que dificulta a aprendizagem da língua portuguesa limitando a comunicação em crioulo. As representações culturais da saúde, doença e cuidado das haitianas são intermediadas pelo vodu entrando em disputa com ações preconizadas pelos profissionais de saúde brasileiros. A falta de seguimento aos tratamentos prescritos no CSF também pode estar associada à melhora momentânea dos sintomas ou do desconhecimento da abrangência da área da saúde para além apenas do aspecto da doença. A barreira linguística, a cosmovisão sobre a doença e a pouca familiaridade com situações envolvendo serviços existentes aqui – e inexistentes no Haiti – podem configurar-se num quadro de não adesão das haitianas aos tratamentos preconizados pela equipe do CSF.
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