A DIVERSIDADE, OS SABERES CULTURAIS E A CONSTRUÇÃO DO ETHOS FEMININO NO CONTO DE FADAS:

UMA ANÁLISE EM PERSPECTIVA DIALÓGICA NO DISCURSO DA TRADIÇÃO À CONTEMPORANEIDADE.

Resumo

Este trabalho apresenta um estudo, com foco na diversidade e nos saberes sociais, acerca da construção do ethos feminino no conto de fadas Gata Borralheira/Cinderela, em uma perspectiva linguística de base dialógica. Parte-se do pressuposto de que a problemática sobre gênero - construção cultural dos conceitos de feminilidade e masculinidade, isto é, o gênero não corresponde ao sexo biológico (feminino e masculino) -, e as relações de poder implícitas nessa questão têm marcado as sociedades modernas, pois o conceito é construído a partir das convenções e de valores sociais, com expectativas em relação ao comportamento prévio desses sujeitos. Nesse sentido, a literatura desempenha um papel importante para a construção de representações femininas, visto que, por meio dela, valores culturais, relacionados ao gênero, podem ser perpetuados de geração em geração (Belline, 2003). Nesse sentido, os contos de fadas permeiam o imaginário popular. As crianças crescem ouvindo, lendo e assistindo histórias de princesas dentro desse universo encantado. Destaca-se que, ao longo dos séculos, os contos de fadas são tão difundidos e estilizados a ponto de, atualmente, conseguirem alcançar do público infantil ao adulto. Logo, compreende-se que os contos de fadas, como um gênero literário, auxiliam o leitor, independente de idade, no processo de encontrar significado para os fenômenos sociais, ressignificando a sua mundiviência e a sua cosmovisão, de forma empática e humanizadora. Dessa forma, a pergunta que norteia a investigação questiona em que medida as representações da personagem perpassam os discursos da tradição à contemporaneidade. Assim, o objetivo geral da pesquisa é analisar o ethos do discurso feminino, por meio do construto teórico dos estudos dialógicos da linguagem (Bakhtin, 2016 [1979]; 2003 [1979]; Volochínov, 2013 [1929]; 2018 [1929]), dos estudos de gênero e de sexualidade (Beauvoir, 1967; 1970; Butler, 2018 [1990]; Firedan, 2020 [1963]; Wolf, 2018 [1991]; Wood, 2021 [2018]), a fim de, a partir de uma análise contrastiva entre a narrativa tradicional e a contemporânea, com diferentes semioses, compreender a construção da imagem discursiva da personagem Gata Borralheira/Cinderela, com base na  heterogeneidade constitutiva e marcada nas diferentes tramas. Justifica-se esse recorte em função de que é necessário voltar-se para a literatura, compreendendo-a como um meio, também, de cristalização de discursos que se naturalizam e, por isso, passam a ser senso comum, sem propiciar, por vezes, reflexões sobre o tema. O caminho da investigação caracteriza-se como teórico, com abordagem qualitativo-interpretativa - em função de se aderir ao viés da Linguística Aplicada (Moita-Lopes, 2006; Kleiman; Vianna; De Grande, 2019) -, com fins explicativos. A geração de dados acontece de forma indireta, por meio bibliográfico e documental; já a análise e a interpretação das informações recebem um enquadre de procedimentos técnicos com viés histórico e comparativo. Como resultados alcançados, constata-se que a imagem da mulher, no discurso, por meio da óptica masculina, perpetua os estereótipos de performance de gênero feminino. Entretanto, tais representações estereotipadas podem desconstruir-se por meio das literaturas contemporâneas, bem como de suas adaptações cinematográficas que apresentam o ethos feminino do século XXI.