A Estética do Tempo
diálogo entre Andrei Tarkovski e Henri Bergson
Palavras-chave:
Estética, Cinema, TempoResumo
Em 1889, Henri Bergson publica sua tese de doutoramento intitulada Essai sur les données immédiates de la conscience. Neste texto, dentre outras noções, Bergson apresenta a ideia de que o tempo deve ser entendido de duas formas. A primeira maneira diz respeito a mensurabilidade do tempo, discernida por sua quantificação em porções homogêneas, isto é, recortes temporais formalmente idênticos entre si, como fazemos com relógios e calendários, por exemplo. A segunda, e mais importante ‘dimensão’ do tempo, diz respeito à nossa própria percepção e experiência temporal, que se caracteriza pela heterogeneidade qualitativa de nossos estados de consciência, conceituada como duração. É, por fim, a memória a operadora cognitiva que permite o discernimento desta característica qualitativa do tempo, bem como a condição para o exercício de outras faculdades, como a razão e imaginação. No terreno artístico, estas ideias influenciaram diversas teorias e correntes de campos distintos da arte. Dentre estas, destacam-se o cubismo, a música de Debussy, a literatura de Virginia Woolf, James Joyce, Marcel Proust, T.S Eliot e William Faulkner. No entanto, Bergson mostrou-se resistente quanto ao modo de produção cinematográfico. O filósofo, em sua obra L'évolution créatrice, sugere que a nascente arte de seu tempo não é capaz de expressar a ideia de duração, pois o cinema trabalha com imagens imóveis do movimento. É Gilles Deleuze, muitos anos depois, que reavivará o pensamento bergsoniano, propondo, justamente, uma articulação de suas ideias com o cinema. Por outro lado, ao definir que o cinema principia pelo tratamento do tempo, Andrei Tarkovski distancia-se da tradição do cinema soviético de sua época e apresenta novas preocupações teóricas e metodológicas sobre a função da arte e do dever do artista. É no ensejo desta cisão que sua filmografia é produzida, abrindo novos caminhos para a experiência estética. O presente trabalho prestou-se ao objetivo de analisar o princípio estético do cineasta russo à luz dos conceitos de tempo e memória da filosofia bergsoniana. A partir deste princípio, Tarkovski sugere que a genuína fruição estética do cinema resulta da receptividade emocional, da postura ativa do entendimento e da atribuição de significado. Para realizar tal investigação, optou-se pela reconstrução argumentativa de Tarkovski a partir de sua obra Esculpir o Tempo, juntamente à análise conceitual da filosofia bergsoniana. Como resultado da pesquisa, sugeriu-se que a estética do tempo só é possível quando o tempo da imagem, traduzida em intensidade emocional, comunica o tempo-duração da consciência. Por fim, intentou-se com esta aproximação uma recuperação da filosofia bergsoniana, destacando que, a despeito das reservas teóricas do filósofo quanto ao cinema, no que diz respeito a filmografia do cineasta russo, o tempo real – duração – pode ser apreendido de modo pleno através da experiência estética cinematográfica.
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