RELAÇÃO ENTRE DOENÇAS NEURO-ONCOLÓGICAS E COMPORTAMENTO SUICIDA

  • Matheus Lira Universidade Federal da Fronteira Sul
  • Marieli Natacha Scarparo Raber
  • José Gomes Chicolovia
  • Brunna Varela da Silva
Palavras-chave: Suicídio; Câncer; Saúde mental.

Resumo

Introdução

O câncer tem adquirido destaque significativo nas estatísticas de mortalidade e incapacidades a nível global (Antos et al., 2023). No contexto brasileiro, dados do Instituto Nacional de Câncer (2019) confirmam essa doença como uma das principais causas de óbito. Essas tendências são influenciadas por mudanças demográficas, estilo de vida, envelhecimento populacional, modificações comportamentais e ambientais (Antos et al., 2023). Especialmente as neoplasias que afetam o sistema nervoso central (SNC), desempenham um papel de relevância substancial nas estatísticas de mortalidade, conforme registrado pelo Instituto Nacional de Câncer no ano de 2020. O SNC, composto pelo encéfalo e medula espinhal, é suscetível ao desenvolvimento de tumores (INCA, 2019), caracterizados por crescimento celular descontrolado e disfunção fisiológica (Yi et al., 2022). O crescimento anormal de células no SNC ocorre em aproximadamente 88% dos casos na região cerebral, que abriga estruturas essenciais para o equilíbrio neurobiológico (INCA, 2019; Van Heeringen; Mann, 2014). Além de alterações estruturais, a manifestação de malignidades no SNC está associada a disfunções neuropsíquicas, incluindo distúrbios comportamentais (Yi et al., 2022). 

Pacientes oncológicos frequentemente enfrentam não apenas as implicações físicas da doença, mas também consideráveis desafios psicossociais. A carga emocional, as limitações físicas decorrentes do tratamento, a incerteza quanto ao prognóstico, bem como a possível recorrência da doença, podem afetar significativamente a saúde mental desses pacientes. Esses fatores combinados podem, em alguns casos, aumentar o risco de ideação suicida e comportamento suicida (Fanger et al., 2010). Portanto, a compreensão e a relevância do tema são de suma importância para mitigar os potenciais desfechos suicidas nessa população vulnerável.

 

Objetivos

Descrever a relação entre o suicídio e o câncer no sistema nervoso central; explorar fatores comportamentais associados ao suicídio em pacientes oncológicos; explanar possíveis estratégias que contribuam na identificação de risco de suicídio em pacientes neuro-oncológicos.

 

Metodologia

Este trabalho contempla uma revisão de literatura, do tipo resumo expandido, de cunho qualitativo, descritivo e exploratório. Realizado a partir da busca de artigos originais, pesquisas clínicas ou experimentais, ou revisões sistemáticas, indexadas em bancos de dados científicos com fator de impacto relevante no período de 5 anos na língua portuguesa e inglesa. Serão excluídos artigos, fora do interesse da pesquisa,  duplicados, artigos pagos, ou que contenham apenas o resumo disponível.

 

Resultados e discussões

Conforme observado por Silva e Benincá (2018) e outros pesquisadores, o suicídio demonstra uma forte associação com transtornos neuropsiquiátricos, porém, também é relevante considerar as doenças físicas como fatores de risco. Pacientes acometidos por doenças graves, como é o caso dos indivíduos diagnosticados com câncer, apresentam um risco aumentado de suicídio. É notório que o mencionado risco de suicídio se manifesta de maneira mais acentuada ao longo do primeiro ano subsequente ao diagnóstico da doença (Ribeiro, 2023). Esse agravamento do risco pode ser atribuído à necessidade súbita de lidar com sentimentos de finitude, bem como com as limitações funcionais e físicas decorrentes do tratamento, aliado ao perigo de recorrência da doença (Silva e Benincá, 2018). 

A depressão manifesta-se como uma condição psiquiátrica de notável ocorrência em indivíduos acometidos por doenças oncológicas. Evidências substanciais indicam que a prevalência da depressão nesse contexto supera significativamente a observada na população em geral. Em particular, uma pesquisa conduzida por Fanger et al. (2010) se dedicou a investigar a incidência da depressão e comportamento suicida em pacientes com diagnóstico oncológico hospitalizados, revelando que a taxa é substancialmente maior quando comparada à de pacientes internados por outras comorbidades. O estudo também constatou que a depressão desempenha um papel significativo na identificação do risco suicida nesse grupo de pacientes, o que pode intensificar o sofrimento emocional e psicológico dos pacientes, tornando o enfrentamento do câncer ainda mais desafiador.  

De acordo com a investigação conduzida por Ribeiro (2023), é observado um aumento significativo no risco de suicídio em indivíduos afetados por determinados tipos de câncer, notadamente cânceres intracranianos, em comparação com outros grupos. A autora descreve um padrão epidemiológico associado ao risco e ao comportamento suicida, no qual variáveis como sexo masculino, idade avançada, baixa escolaridade, consumo de álcool, desemprego, tabagismo e a presença de transtornos mentais como comorbidades desempenham um papel de destaque. A compreensão desse perfil epidemiológico é fundamental para a identificação e intervenção preventiva junto a pacientes oncológicos em risco de suicídio.

É relevante salientar que, mesmo enfrentando uma enfermidade, os pacientes continuam a manifestar seus desejos e aspirações em relação à vida. O comportamento suicida não surge como uma simples intenção de pôr fim à existência, mas, em muitos casos, é uma tentativa de aliviar o sofrimento que vivenciam.

 

Conclusão

Portanto, torna-se evidente que a relação entre suicídio e câncer, especialmente no que se refere ao sistema nervoso central, representa um tema de complexidade multifacetada que está intrinsicamente ligado a perturbações psicossomáticas. Esses fatores comportamentais, que surgem como contribuintes para o risco de suicídio entre pacientes oncológicos, enfatizam a necessidade de dedicar uma atenção especial à saúde mental. Compreender as raízes do pensamento suicida é um passo crucial para o desenvolvimento de estratégias de intervenção eficazes. Além disso, a exploração de estratégias para identificar o risco de suicídio em pacientes neuro-oncológicos e em pacientes com outros tipos de câncer é fundamental para a prevenção e o tratamento precoces. A detecção antecipada de indicadores de sofrimento emocional e pensamento suicida detém o potencial de preservar vidas e aprimorar a qualidade de vida desses pacientes. Torna-se essencial persistir na alocação de recursos para a pesquisa e desenvolvimento de práticas clínicas que enfoquem não apenas as facetas médicas, mas também as componentes emocionais inerentes ao contexto do câncer, como propósito disponibilizar um suporte integral e eficaz aos pacientes afetados por condições oncológicas, ao mesmo tempo em que se busca mitigar o risco de suicídio nesse grupo de indivíduos. 

Referências

ARAÚJO, T. M. T. Alterações genômicas quantitativas com potencial clínico no adenocarcinoma gástrico. Universidade Federal do Pará. Belém, 2016. Disponível em: http://200.239.66.58/jspui/bitstream/2011/9051/1/Tese_AlteracoesGeno micasQuantitativas.pdf#page=10. Acesso em: 27 set. 2023. 

FERRO, L, et al. Análise da Percepção da Dor e da Possibilidade de Morte em Pacientes Oncológicos no Brasil. Id on Line Rev. Mult. Psic. V.15, N. 57, p. 79-88, Outubro/2021. Disponível em: https://idonline.emnuvens.com.br/id/article/view/3167. Acesso em 27 set. 2023.

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2019. Disponível em: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files/media/document/estimativa-2020-incidencia-de-cancer-no-brasil.pdf Acesso em: 23 set. 2023.

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA. Tipos de câncer. Rio de Janeiro: INCA, 2019. Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/tipos/sistema-nervoso-central Acesso em: 23 set. 2023.

SILVA, Bruna Matias da; BENINCA, Ciomara. Ideação suicida em pacientes oncológicos. Rev. SBPH,  Rio de Janeiro ,  v. 21, n. 1, p. 218-231, jun.  2018 .   Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582018000100012&lng=pt&nrm=iso Acessos em  23  set.  2023.

RIBEIRO, G. V. A. O suicídio na população oncológica: tradução e validação para o português-Brasil do interpersonal needs questionnaire-INQ e da Acquired Capability for Suicide Scale-Fearlessness About Death-ACSS-fad para pacientes oncológicos. Dissertação (Mestrado em Ciências) - Fundação Antônio Prudente. São Paulo. p. 88. 2023.

SANTOS, M. de O.; LIMA, F. C. da S. de; MARTINS, L. F. L.; OLIVEIRA, J. F. P.; ALMEIDA, L. M. de; CANCELA, M. de C. Estimativa de Incidência de Câncer no Brasil, 2023-2025. Revista Brasileira de Cancerologia, [S. l.], v. 69, n. 1, p. e–213700, 2023. Disponível em: https://rbc.inca.gov.br/index.php/revista/article/view/3700. Acesso em: 20 set. 2023 Acesso em: 23 set. 2023.

SILVA, B. M; BENINCÁ, C. Ideação suicida em pacientes oncológicos. Revista da SBPH, v. 21, n. 1, p. 218–231, 1 jun. 2018.

VAN HEERINGEN, Kees; MANN, J John. The neurobiology of suicide. The Lancet Psychiatry, v. 1, n. 1, p. 63–72, 2014. Disponível em: https://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S2215036614702202. Acesso em: 23 set. 2023.

YI, Peng-cheng; QIN, Yan-hua; ZHENG, Chun-mei; et al. Tumor markers and depression scores are predictive of non-suicidal self-injury behaviors among adolescents with depressive disorder: A retrospective study. Frontiers in Neuroscience, v. 16, p. 953842, 2022. Disponível em: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fnins.2022.953842/full. Acesso em: 23 set. 2023.

ZAORSKY, Nicholas G.; ZHANG, Ying; TUANQUIN, Leonard; et al. Suicide among cancer patients. Nature Communications, v. 10, n. 1, p. 207, 2019. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41467-018-08170-1. Acesso em: 23 set. 2023.

Publicado
15-11-2023