ADVERSIDADES NA INFÂNCIA, ALTERAÇÕES EPIGENÉTICAS, RESISTÊNCIA AOS GLICOCORTICÓIDES E TRANSTORNO DEPRESSIVO MAIOR

  • Nagilla Moreira Cordeiro Uffs
  • Thiago Inácio Teixeira do Carmo
  • Severina Silva Amaral Amaral
  • José Afonso Pena Paes
  • Zuleide Maria Ignácio
Palavras-chave: transtorno depressivo maior, experiências adversas na infância;, epigenética

Resumo

Introdução: O transtorno depressivo maior (TDM) é um transtorno grave que causa considerável perda de qualidade de vida nas pessoas, sendo uma das formas de doença mental mais prevalente. A literatura científica fornece evidências suficientes de que maus-tratos e traumas na infância são potentes estressores, considerando os principais vilões no desencadeamento do TDM e no aumento da gravidade da depressão e da refratariedade nas respostas terapêuticas, que podem culminar em depressão resistente ao tratamento. Além disso, a falta de apoio social durante a fase de adolescência e adulta jovens pode potencializar os efeitos do trauma infantil, contribuindo significativamente para o desencadeamento e aumento da gravidade do TDM. O estresse precoce também é um vilão significativo nas alterações do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA), levando a um quadro de resistência aos glicocorticóides. Subjacente a esta condição estão mudanças epigenéticas relacionadas em genes que modulam o sistema de feedback negativo do eixo e o próprio gene que codifica o receptor de glicocorticoides (GR). É fundamental destacar que alterações epigenéticas decorrentes do estresse no início e ao longo da vida podem ser transmitidas e desencadear danos comportamentais e biológicos na geração descendente dessas mães. Esses processos genéticos e epigenéticos estão relacionados a efeitos biológicos críticos ou perdas envolvidas no TDM, como estresse oxidativo e inflamação. Objetivo: Discutir os mecanismos fisiológicos envolvidos com o estresse precoce e TDM, em humanos e animais. Serão destacadas alterações epigenéticas, variações na função do eixo HPA, resistência aos glicocorticóides, estresse oxidativo, neuroinflamação, neurotransmissão central, sinalização, plasticidade neuronal, interação entre alguns mecanismos, bem como resistência ao tratamento antidepressivo. Metodologia: Por meio de uma revisão da literatura nas bases de dados Pubmed e MedLine, sem delimitação temporal ou do tipo de estudo selecionado, busca-se reunir estudos relevantes, em humanos e animais, que abordam os temas supracitados e elencar literaturas que associem o estresse no início da vida, TDM e comorbidades fisiopatológicas, microbiológicas e epigenéticas. Resultados: A correlação existente entre episódios estressores no início da vida, como abuso sexual infantil, privação materna, negligência familiar, depressão materna, e o desenvolvimento do TDM foram marcadamente enfatizados nos estudos, e ao avaliarem as possíveis causas que desencadeiam tal condição, foi visto que o estresse nos primeiros anos de vida expõe o indivíduo a uma reatividade acentuada e prolongada do corpo, o qual leva a alterações morfofisiológicas no hipocampo, corpo caloso e córtex pré-frontal. Isso pode ser explicado pela exposição precoce e crônica ao hormônio liberador de corticotrofina (CRH), estimulador de corticosteroides pelo córtex da glândula adrenal, indutores do estresse, o qual possui papel fundamental na fisiopatologia dos transtornos mentais. A exposição precoce ao estresse hiper regula a expressão dos GR e mineralocorticóides, os quais ativam ainda mais o eixo HPA. Além disso, o gene Nuclear Receptor Subfamily 3 Group C Member 1 (NR3C1), responsável por GR, parece relacionado à resistência aos glicocorticóides. Polimorfismos de base única do NR3C1 podem aumentar a expressão de isoformas inibitórias e alterações epigenéticas podem diminuir a expressão do receptor. Ademais, variações genéticas do gene FKBP5, que produz a proteína FKBP51 que atua diminuindo a afinidade do GR e a translocação nuclear, também pode predispor o indivíduo a resistência aos glicocorticóides, além de alterações epigenéticas como desmetilação, levando a uma maior transcrição desta imunofilina inibitória. Também, algumas cinases fosforilam o GR em inúmeros resíduos de serina, o que altera a conformação do receptor, e assim, modifica sua atividade transcricional. As citocinas também podem influenciar a função GR em vários níveis, como a translocação, interações proteína-proteína, ligação do GR ao seu elemento de resposta ao DNA e indução de isoformas GR. Além disso, as repercussões negativas não se restringem somente a infância, mas sim em toda a vida do indivíduo, sendo que as psicopatologias mais evidentes na vida adulta são TDM, depressão resistente ao tratamento, predisposição ao suicídio e inabilidade de resolver problemas. O estresse na infância pode causar alterações na expressão genômica ao longo da vida através de na mecanismos epigenéticos como metilação no DNA, modificações de histonas e alterações expressão de miRNA. Conclusões: As alterações epigenéticas desencadeadas pelo estresse na infância contribuem para alterações em estruturas neuroendócrinas como o eixo HPA, modificações epigenéticas, resistência aos glicorticóides e ativação do sistema imune, o que pode predispor os indivíduos a alterações na resposta ao estresse e, consequentemente, maior risco de distúrbios psiquiátricos, como o TDM, e maior predisposição ao suicídio.

Publicado
29-10-2021