Alto custo de mercados e prevalência de insegurança alimentar e nutricional

Autores

  • Tânia Aparecida de Araujo

Palavras-chave:

Acesso à alimentos, Mercados , Alto custo, Nutrição

Resumo

A erradicação da fome global até 2030 é um dos objetivos fundamentais da Organização das Nações Unidas (ONU) e um marco importante na nova agenda de desenvolvimento sustentável pós-2015. Este compromisso global destaca a importância de garantir que todos, especialmente nos países em situação de déficit alimentar, tenham acesso a alimentos suficientes, seguros e nutritivos. À medida que os padrões de consumo e produção alimentares continuam a evoluir, o comércio de produtos agrícolas e alimentícios torna-se um componente crucial para atender à crescente demanda alimentícia em várias partes do mundo (Martins et al., 2024). A Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é definida como a condição em que todas as pessoas têm acesso, em todo o momento, a alimentos suficientes, seguros e nutritivos, sem comprometer outras necessidades essenciais, como saúde e educação (Brasil, 2006). Em contrapartida, a insegurança alimentar e nutricional (IA) ocorre quando há a falta de acesso a alimentos adequados, seja por escassez de recursos econômicos ou pela dificuldade de acesso físico a alimentos saudáveis. Esse fenômeno pode resultar em condições prejudiciais à saúde, como desnutrição, obesidade e fome. A IA está intimamente relacionada com fatores econômicos, especialmente a renda das famílias. A baixa renda é um dos principais determinantes da IA, uma vez que limita o acesso a alimentos de qualidade e a uma alimentação saudável. A dificuldade financeira impede que muitas pessoas adquiram alimentos suficientes e adequados, contribuindo para a persistência de desigualdades alimentares e nutricionais, especialmente entre as populações mais vulneráveis.Há, por exemplo, um debate crescente na literatura científica a respeito do papel do comércio no fortalecimento da SAN. Existe um questionamento contínuo sobre se o comércio representa uma ameaça ou uma oportunidade para a melhoria da segurança alimentar (Maluf, 2022). Este dilema aponta para a necessidade de uma análise mais aprofundada das interações entre políticas comerciais e os impactos na segurança alimentar global, especialmente em contextos de desigualdade e vulnerabilidade alimentar. O acesso a alimentos de baixo custo, por exemplo, pode aumentar as chances de alcançar a SAN, especialmente em contextos de vulnerabilidade social. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi avaliar a associação entre o custo dos mercados próximos à residência e a prevalência de IA. Metodologia: Este estudo transversal avaliou universitários da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) entre novembro e dezembro de 2020. Os dados foram coletados por meio de um questionário virtual (websurvey), enviado para os e-mails pessoais de todos os estudantes matriculados. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFU, sob o parecer nº 4.351.150. A Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) foi avaliada utilizando a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), versão reduzida (Santos et al., 2014). Além disso, foi questionado se os mercados próximos à residência dos estudantes eram de baixo, médio ou alto custo, com sexo e idade utilizados como variáveis de ajuste no modelo de regressão logística. A associação entre o custo dos mercados e a insegurança alimentar foi verificada por meio do teste qui-quadrado, adotando-se um nível de significância de 5%. Todos os testes foram realizados no software STATA16®. Resultados e Discussão: A prevalência de insegurança alimentar (IA) entre os participantes foi de 43,1%. A IA mostrou-se significativamente associada ao custo dos mercados próximos às residências (p < 0,001). Em áreas com alto custo de mercado, a prevalência de IA foi de 60,8%, seguida por áreas com custo médio (42,09%) e, por último, nas áreas com baixo custo (30,43%). Os resultados da regressão logística indicaram que o custo do mercado é um fator significativo para a IA entre os universitários, mesmo após ajuste para sexo e idade. O custo médio aumentou em 59% a probabilidade de IA (OR = 1,59; IC 95%: 1,08-2,35), enquanto o alto custo triplicou essa probabilidade (OR = 3,34; IC 95%: 2,10-5,31), em comparação com os mercados de baixo custo.  Esses dados indicam que o custo do mercado local exerce uma influência direta sobre a IA entre universitários, especialmente nas áreas com alto custo de mercado – em que a probabilidade deste desfecho é significativamente maior. A renda, embora não diretamente analisada neste estudo, é um fator crítico para entender as diferenças entre as regiões de custo alto e baixo. A associação entre o custo de mercado e a IA alinha-se com a literatura existente, que sugere que a falta de acesso a alimentos saudáveis, devido a custos elevados e à escassez de mercados acessíveis, se agrava em populações vulneráveis. Nesse contexto, políticas públicas desempenham um papel crucial para garantir maior acesso a alimentos, especialmente os saudáveis. A implementação de medidas como a nova cesta básica (Cattafesta e Salaroli, 2024), que busca promover a acessibilidade de alimentos essenciais, e subsídios governamentais para a redução de impostos sobre alimentos básicos, podem contribuir significativamente para mitigar a IA. Além disso, a fiscalização eficaz dos estabelecimentos comerciais é fundamental para garantir que os alimentos ofertados estejam dentro de padrões sanitários adequados e sejam acessíveis à população de diferentes faixas de renda (Martins et al, 2024). Considerações finais: Este estudo evidenciou a associação entre o custo dos mercados locais e a prevalência de IA entre universitários, destacando que áreas de alto custo apresentam um risco maior. Neste contexto, pode-se pensar no conceito de ambientes alimentares, que engloba a disponibilidade e o custo dos alimentos nas proximidades das residências, desempenha um papel crucial na segurança alimentar das populações. É necessário que as políticas públicas considerem o acesso a alimentos saudáveis, com ações que envolvam tanto a regulação do preço dos alimentos quanto a ampliação de mercados acessíveis, especialmente em áreas vulneráveis. Além disso, mais esforços devem ser feitos para mitigar a IA por meio de ações interinstitucionais e políticas públicas que visem melhorar a infraestrutura alimentar, a fiscalização de mercados e a oferta de alimentos nutritivos.

Downloads

Publicado

20-07-2025

Edição

Seção

ET 3 - Território, Ambiente e Saúde