Reflexões sobre o marxismo na saúde: um relato de experiência 

Autores

Palavras-chave:

Enfermagem , marxismo, saúde pública

Resumo

Introdução: O marxismo é uma linha de pensamento que analisa as relações sociais e econômicas através da luta de classes, ao oferecer uma crítica ao capitalismo e propor a busca por uma sociedade mais igualitária. Através dessa corrente filosófica, sociológica e política, existem diversos debates, dentre eles a sua influência nas pesquisas, questões trabalhistas e sociais que norteam a saúde da população. De acordo com a Constituição Brasileira de 1988, artigo 196 “A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas[...]”, sendo organizada em rede, de forma regionalizada e hierarquizada. Financiada pelo governo Federal, Estadual e Municipal de acordo com suas responsabilidades. A forma como a saúde é conhecida atualmente, foi conquistada pela população brasileira por meio dos movimentos acadêmicos e sociais, firmada por meio da constituição e regulamentada pela Lei 8080 de 1990, trazendo mudanças nos padrões de saúde populacional, através de programas e campanhas de cuidado à população em seus diferentes ciclos de vida (Rocha, et al. 2024). Os determinantes e condicionantes sociais da saúde sabidamente influenciam diretamente em como a população enfrenta seus processos saúde-doença, inclusive as condições de trabalho impactam diretamente na relação entre o indivíduo e seu acesso e como este visualiza a saúde de forma global. As relações de trabalho, questões econômicas também impactam nesse sentido, facilitando ou prejudicando, a depender da sua classe social (GALBÁN, et al, 2007). O marxismo é uma corrente filosófica, política e social que debate sobre as relações de trabalho entre proletariado e burguesia, e os impactos na vida do trabalhador, desta forma, se busca compreender de quais formas é possível correlacionar com o campo da saúde coletiva.  Objetivo: realizar uma revisão narrativa da literatura e relatar as reflexões acerca da aplicabilidade e influências do Marxismo na saúde da população brasileira e no Sistema Único de Saúde (SUS). Metodologia: Trata-se de um relato de experiência de três mestrandas durante a construção de um seminário para uma disciplina de programa de pós-graduação em enfermagem/ de mestrado acadêmico em enfermagem, com ênfase em saúde coletiva. Para nortear nossa pesquisa inicial, foi realizada a seguinte questão de pesquisa: Como a teoria marxista influenciou/ influencia a saúde coletiva brasileira? As bases de dados utilizados foram: Pubmed, Biblioteca Virtual Saúde (BVS). Os descritores (DECS) para pesquisa foram: “Saúde pública” (descritor de assunto) and “Marxismo” (descritor de assunto). Os descritores (MESH), foram: “Public Health” and “Marxism”. A pesquisa ocorreu no mês de abril de 2025. Como critérios de inclusão: ser artigo completo gratuito disponibilizado online; nos idiomas português, espanhol e inglês; que abordassem a temática marxismo e saúde coletiva. Não houve recorte temporal em relação ao ano das publicações. Resultados e Discussão: Ao realizar a busca nas bases de dados foram utilizados como busca avançada os termos: “Saúde pública” and “Marxismo” and “Public Health” and “Marxism”. Foram encontrados na PUBMED: 02 artigos completos. Na base BVS a busca resultou em 20 artigos. Destes 08 estudos eram completos, sendo eliminados 03 que não atendiam aos critérios de inclusão: 01 artigo que não era gratuito, 01 tese de doutorado e 01 livro. O resultado de 01 artigo coincidiu nas duas bases de dados, além de estar duplicado 02 vezes na BVS. Para o corpus do estudo 05 artigos foram utilizados, sendo quatro brasileiros e um cubano. No artigo um (A1) é estabelecido como a Saúde Coletiva utiliza-se do Materialismo Histórico Dialético (MHD) para problematizar, discutir e reconstruir o processo do conhecimento, sendo que essa vertente engloba as dimensões: epistemológica, a qual define que as relações de desigualdades sociais são resultado da história; a teórica aborda a forma como as relações e dinâmicas sociais movem a transformação; e na metodológica utiliza a dialética para  mostrar como as partes de um fenômeno estão conectadas formando a totalidade social, analisando como esse movimento acontece. O marxismo como metodologia na pesquisa tem como objetivo conhecer a realidade e produzir conhecimento para a transformar, sendo a contradição existente entre as classes sociais as responsáveis por modificar o cenário. Essa vertente estabelece que não há neutralidade na ciência, onde a posição em que o próprio pesquisador ocupa na sociedade determina o caminho a ser percorrido (Soares, et al, 2013). O artigo 2 (A2) traz uma revisão de literatura sobre a saúde coletiva com estudos de 1976 até 1992, que foi o período histórico do movimento da reforma sanitária brasileira. O marxismo nessa época era um conteúdo proibido, mas que se tornou base para esse processo histórico de transformação da saúde no Brasil através do Materialismo Histórico Estrutural. A saúde coletiva passa a tratar a saúde como uma questão científica central, com o conceito marxista da “determinação social da doença” (Burlandy; Bodstein, 1998). No estudo 3 (A3) foi analisada a Política de Atenção Básica do Brasil, utilizando a análise de discurso de Foucault. Define que as prioridades na política pública refletem disputas de poder e interesses diversos, sendo eleitos como prioritários pelos governantes, sendo resultante de um processo de negociação dos contextos sociais e políticos de cada época historicamente.  Existe o interesse em resolver um problema, porém muitas vezes não se é analisada a real viabilidade de resolvê-lo, além da questão do enfrentamento direto de grandes problemas estruturais, que são os maiores empecilhos para a mudança da realidade social (Borges, Baptista, 2010). No artigo 4 (A4) o autor, através da análise marxista, que o Estado desempenha um papel central na manutenção da circulação de mercadorias e na extração da mais-valia, sendo, portanto, um agente indispensável do capitalismo (CORREIA, 2015). Ao tratar sobre a saúde coletiva, o texto faz uma crítica às Políticas Públicas, as quais ao invés de atender de forma eficaz a demanda da população, se tornam valores de troca dentro da lógica capitalista, o que pode desviar o foco da promoção do bem-estar para a manutenção de interesses econômicos. Isso tem um potencial de criar um sistema onde a saúde não é tratada como um direito universal, mas como um bem que depende de recursos financeiros e interesses privados (CORREIA, 2015). Além disso, o estudo explora o conceito de fetichismo da mercadoria e a passagem do trabalho concreto ao abstrato, destacando como esses elementos mascaram as limitações estruturais do Estado e sua capacidade de agir em prol do bem comum (CORREIA, 2015). Nesse viés, as Políticas Públicas, apesar de terem boas intenções, são capazes de reproduzir desigualdades e ser insuficientes no cuidado da saúde do povo (CORREIA, 2015). No contexto do artigo 5 (A5), os autores trazem uma análise sobre a projeção humanista da saúde pública sob um olhar marxista, para uma compreensão a transformação das relações sociais em prol da emancipação humanas, com intuito de superar os subhumanizadores do capitalismo (GALBÁN, et al, 2007). Outrossim, a pesquisa destaca a aplicação do humanismo marxista na saúde pública de Cuba, a qual representa um compromisso com valores de liberdade e emancipação, pois quando se tem uma saúde pública eficaz possibilita que os indivíduos tenham autonomia para se desenvolverem plenamente, superando as limitações impostas pela falta de cuidados de saúde (GALBÁN, et al, 2007). Ainda, quando se organiza o atendimento ao público de maneira equitativa e inclusiva, há uma contribuição na diminuição das desigualdades sociais, refletindo na luta marxista por justiça social e extinção das disparidades entre classes (GALBÁN, et al, 2007). Ademais, o bem-estar coletivo está na base do progresso mundial, com melhores condições de saúde se tem uma elevação na qualidade de vida, o que é essencial para promover um desenvolvimento humano, social e econômico justo e, dessa forma, com uma boa estruturação de Políticas Públicas, essas irão desafiar os pilares capitalistas que mercantilizam a saúde, com intuito de mostrar que a saúde pode ser ferramenta de resistência contra sistemas opressivos e de construção de novos paradigmas  (GALBÁN, et al, 2007). Considerações finais: Diante ao exposto, sob a ótica marxista, a saúde é intimamente formada pelas condições sociais e econômicas impostas pelo modo de produção capitalista. O Marxismo explica que a saúde não deve ser explorada isoladamente, mas sim em relação às estruturas materiais da sociedade, que determinam tanto o acesso aos serviços quanto a destinação de recursos essenciais. Embora o Estado seja consagradamente visto como um defensor do bem coletivo, sua atuação está intrínseca na lógica do capital, o que perpetua desigualdades estruturais ao invés de solucioná-las. Nessa conjuntura, as políticas públicas de saúde comumente acabam por reproduzir a lógica mercantilista, transformando serviços indispensáveis em bens de troca. Essa realidade expõe as restrições do capitalismo em atender de maneira adequada às carências de saúde da população. O ponto de vista marxista não apenas destaca essas faltas, mas também sugere uma transformação estrutural que situe a saúde como um direito humano universal, livre de condicionantes mercadológicos. Por conseguinte, quando ocorrer uma ruptura do processo de exploração do trabalho e acúmulo de capital, a construção de um sistema de saúde totalmente equitativo e acessível será viável. Em suma, viabilizar o bem-estar coletivo acima dos interesses econômicos é uma mudança essencial para uma transformar a saúde em um reflexo genuíno da justiça social.

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Publicado

20-07-2025

Edição

Seção

ET 1 - Políticas de Equidade, Acessibilidade, redes de atenção e desafios no SUS