RELATO DE EXPERIÊNCIA SOBRE AÇÕES DO PROGRAMA FAMÍLIAS FORTES EM CONTEXTOS DE VUNERABILIDADE SOCIAL

  • Luana Emanueli Strücker Gonçalves UFFS
  • Rayana da Silva Freire UFFS
  • Emanuely Scramim UFFS
  • Maira Rossetto UFFS
  • Joice Moreira Schmalfuss UFFS
Palavras-chave: Vulnerabilidade, Assistência de Enfermagem, Promoção da Saúde, Relações Familiares

Resumo

O Programa Famílias Fortes é oriundo dos Estados Unidos e possui ações estratégicas voltadas para o fortalecimento de vínculos familiares. No Brasil, sua versão é desenvolvida pela Escola de Saúde e Assistência Social da Oxford Brookes University no Reino Unido. A primeira introdução no País ocorreu pelo Ministério da Saúde, em 2013, seguindo sob responsabilidade do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Entre os principais objetivos do Programa estão intensificar estratégias de prevenção ao uso abusivo de álcool e outras drogas entre crianças de 10 e 14 anos, com foco em adolescentes em situação de vulnerabilidade social, além de promover o bem-estar das famílias a partir do fortalecimento dos vínculos e do desenvolvimento de habilidades parietais e sociais, principalmente em virtude da saúde de adolescentes ser agravada por comportamentos de risco, como uso abusivo de drogas e álcool, relações sexuais desprotegidas e exposição à violência (BRASIL, 2021). Assim, compreendendo que o uso abusivo dessas substâncias é um grave problema de saúde pública, além de ser um fenômeno complexo e multifatorial influenciado por componentes individuais, sociais, políticos e institucionais, torna-se fundamental potencializar uma prevenção sustentável, abordando tais problemáticas ainda na infância e adolescência. Neste contexto, entende-se que a família é uma “unidade social de apoio”, mas tem suas relações perpassadas por vulnerabilidades como pobreza, violência e falta de acesso a serviços (OROZIMBO; AFONSO, 2020). Então, diante da possibilidade de intervir nos núcleos familiares, estes programas se concentram, principalmente, na educação e no desenvolvimento de habilidades, reduzindo os fatores de risco e/ou promovendo fatores de proteção e resiliência (KUMPFER; ALVARADO; WHITESIDE, 2009). Para além do exposto, ações de Enfermagem voltadas para a promoção da saúde, pautadas em um processo de diálogo e com valorização da individualidade de cada ser são fundamentais. Logo, com uma expressiva força de trabalho, profissionais dessa área da saúde têm condições de colaborar para a consolidação de muitas transformações, sendo necessário, porém, aprofundar o conhecimento sobre vulnerabilidades em saúde no sentido de entender os desafios que os contextos marcados por iniquidades sociais impõem a sua atuação (MAFFACCIOLLI; OLIVEIRA, 2018). Objetivou-se descrever a experiência das ações realizadas no âmbito do Programa Famílias Fortes, refletindo sobre a importância de projetos de extensão voltados para os contextos de vulnerabilidade social. Trata-se de um relato de experiência vivenciada por acadêmicas de Enfermagem da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)-campus Chapecó, bolsistas do projeto de extensão "Promoção da saúde, bem-estar e qualidade de vida: ações para o fortalecimento de famílias fortes", aprovado pelo edital número 1072/GR/UFFS/2021. A equipe executora do projeto foi constituída por nove discentes bolsistas e voluntárias dos cursos de Enfermagem e Medicina da UFFS, além de três docentes e uma facilitadora. As vivências aconteceram entre os meses de março de 2022 e março de 2023, nas cidades de Chapecó, Xanxerê e Guatambu, oeste catarinense. As famílias foram selecionadas em parceria com alguns Centros de Referência da Assistência Social e escolas da região, sendo esses os espaços dos encontros e de interlocução com as comunidades em que as famílias estão inseridas. As intervenções contaram com sete encontros semanais, incluindo crianças e adolescentes entre 10 e 14 anos e seus responsáveis. No primeiro momento, em salas separadas, os jovens e os pais e/ou responsáveis participavam de dinâmicas lúdicas e discutiam temas específicos e num segundo momento, com todos juntos, se colocava em prática o que havia sido trabalhado com cada público. Cada encontro durava cerca de duas horas, sendo utilizadas estratégias interativas com o uso de jogos, brincadeiras e encenações, além de recursos audiovisuais com episódios familiares e materiais impressos que serviram de apoio para a execução das atividades. Ressalta-se que todos os materiais possuíam embasamento pedagógico e foram disponibilizados pelo Programa. Os encontros contaram com lanches, sorteios de brindes e cada família recebeu uma cesta básica e certificado de conclusão pela participação no Programa. Participaram cerca de 360 famílias, com ações divididas em cinco ciclos, sendo dois realizados nas cidades de Xanxerê e Chapecó e um em Guatambu. O desenvolvimento das atividades proporcionou a constituição de um espaço de convivência e formação de vínculos, com embasamento teórico que ofereceu mecanismos para o desenvolvimento de temáticas como a comunicação familiar, amor, limites, proteção contra o uso de álcool, prática de momentos de família e autocuidado. No primeiro encontro ocorreu a apresentação das facilitadoras a fim de criar vínculo com as famílias e proporcionar a interação de toda a equipe envolvida no projeto. Em seguida, a primeira dinâmica teve como tema “Amor e limites” e “Metas e sonhos", quando as famílias participantes relataram formas que demonstram amor e estabelecem limites aos seus filhos. Foi realizado um mapa dos sonhos no espaço dos filhos, onde estes expressaram seus objetivos de carreira, hobbies, bem como questões sobre sua saúde, bem-estar e atividades de lazer. A confecção mostrou a quantidade de sonhos e esperanças que cada criança e adolescente possuía, mesmo que parecessem distantes da realidade. Os pais tinham o desafio de tentar reconhecer o mapa dos seus filhos para conhecer os seus objetivos futuros e oferecer um apoio adequado a eles. No segundo encontro os temas foram "Admirar as mães, pais e responsáveis" e "As regras da nossa casa". Os filhos expressaram dificuldades em serem filhos e puderam conhecer as responsabilidades e dificuldades dos pais na sua criação. Realizaram a confecção de um presente para seus pais, escrevendo sobre atividades que gostavam, o que aprenderam, presentes recebidos e formas de amor. Na sessão em família, os pais receberam os presentes e houve um fortalecimento de vínculos ao criar uma árvore genealógica. No terceiro encontro os temas foram "Incentivar boas atitudes" e "Lidar com o estresse". Os filhos compartilharam situações estressantes e relataram maneiras de lidar com elas. Os pais puderam trabalhar os elogios e visualizar as atividades realizadas pelos filhos, reconhecendo a importância de incentivá-los e recompensá-los nos momentos certos. Na sessão em família foi realizado o jogo de balão no ar para fortalecimento e incentivo de ações conjuntas frequentes. No quarto encontro as temáticas abordadas foram “Seguir regras” e “Usar consequências”, quando os pais foram orientados sobre a importância de usar consequências e oferecer recompensas quando atividades fossem realizadas de forma adequada pelos filhos. Estes, por sua vez, foram ensinados sobre a importância de seguir as regras e as consequências do seu descumprimento. No momento familiar foi feita a confecção de uma bandeira com quatro valores essenciais para o bom funcionamento da família. O quinto encontro centrou-se nos temas “Lidar com a pressão dos amigos” e “Construindo pontes” e os pais dialogaram sobre a participação da vida social de seus filhos e necessidade de desenvolverem habilidades de escuta ativa para entenderem seus medos e preocupações. As crianças foram estimuladas a terem opinião própria e evitarem a influência de colegas. Desenvolveram habilidades para perguntar e oferecer alternativas quando alguma atitude errada fosse tomada. O momento em família enfatizou a importância de ouvir o outro e encontrar soluções para os problemas cotidianos. A atividade envolveu dialogar sobre um problema e encontrar possíveis soluções, promovendo a autonomia e o diálogo entre pais e filhos. O sexto encontro teve como tema “Proteger contra o abuso de substâncias” e “ Pressão dos amigos e bons amigos”. Os jovens puderam refletir sobre o uso de álcool e outras drogas, discutindo os problemas associados a tal consumo e repercussões na saúde, meio social e familiar. Também discutiram sobre a importância de terem bons amigos e desenvolverem um pensamento crítico sobre as atitudes que não são relevantes para as suas vidas. Os responsáveis puderam dialogar sobre os fatores de risco associados ao consumo de álcool e outras drogas e medidas de proteção que podem ser integradas em casa. No momento familiar foi realizado o jogo "Alcançando nossas metas", no qual pais e filhos perceberam a importância de se apoiarem mutuamente e expressarem seus medos e inseguranças. No último encontro do ciclo os temas "Ajudar e ser ajudado" e "Atingir nossas metas" foram discutidos. Os filhos realizaram uma atividade sobre problemas e soluções, além de uma entrevista com outros participantes do encontro sobre metas para o futuro e estresse. Eles também escreveram uma carta aos pais. Estes discutiram tipos de estresse familiar e como prestar ajuda nos momentos difíceis. Eles também escreveram uma carta para seus filhos. No momento familiar houve a formatura, onde as famílias receberam certificados e participaram de uma confraternização final. Conclui-se que ao longo de cada encontro e das temáticas trabalhadas foi possível visualizar as dificuldades vivenciadas pelas famílias para garantirem o seu bem-estar, assim como o fortalecimento de vínculos familiares. Atuar com famílias em situação de vulnerabilidade social demandou habilidades que transcendem o cuidado em saúde, uma vez que as discussões envolveram questões específicas e relacionadas aos diversos aspectos sociais enfrentados diariamente. Ainda, acredita-se que os encontros proporcionaram às famílias ferramentas e habilidades para o fortalecimento de vínculos familiares, mesmo que as situações de vulnerabilidades prossigam. Diante desse relato, as intervenções realizadas clarificaram a importância de ações extensionistas para promover o bem viver, saúde e qualidade de vida dessa população. Participar de um projeto de extensão dessa envergadura possibilitou uma experiência enriquecedora, permitindo que as estudantes adquirissem novos conhecimentos e habilidades enquanto futuras enfermeiras, sendo sensibilizadas para uma atuação baseada na humanização e integralidade, com engajamento político e social e conscientes de suas atuações nos espaços ampliados de saúde. Além disso, as experiências compartilhadas com as famílias possibilitaram identificar inúmeras vulnerabilidades no decorrer dos encontros e perceber a importância de reafirmar parcerias entre universidade e demais instituições das esferas municipal, estadual e federal, a fim de incrementar intervenções pautadas nos cuidados diários da população, promovendo saúde, bem-estar e sustentabilidade para a comunidade em geral.

Publicado
27-06-2023