PET-SAÚDE E UFFS: SOBRE O ONTEM, O HOJE E O AMANHÃ
Resumo
O processo de reformulação da saúde pública no Brasil apresenta a saúde como direito do ser humano, assegurado pela Constituição da República de 1988. A chamada Constituição Cidadã configura-se como a primeira a destacar a questão da saúde e traz avanços significativos no reconhecimento dos direitos e garantias fundamentais à população brasileira. A partir desta, novas configurações dos sistemas de educação e de saúde foram requeridas, com destaques para a instituição do Sistema Único de Saúde (SUS) em 1990 e, das Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Graduação em Saúde, a partir de 2001 (BRASIL, 2018a). A conquista de um sistema de saúde público, universal, integral e equânime, acompanha as discussões mundiais da saúde como resultado de fatores psicobiológicos, sociais, econômicos e ambientais, estes, interdependentes e determinantes em um processo de busca pela saúde como qualidade de vida. A atenção à saúde neste sistema deve, portanto, acompanhar a concepção ampliada, fomentando e desenvolvendo práticas coerentes aos princípios e atributos ordenadores. Neste contexto, os desafios postos pela integralidade e a complexidade e diversidade de ações desenvolvidas nos serviços de saúde, somados à necessidade em oferecer um atendimento humanizado e resolutivo, levam as instituições de saúde a assumirem as responsabilidades em relação à formação e ao desenvolvimento dos trabalhadores, fomentando ideias e iniciativas para transformar e qualificar a atenção ao usuário do SUS (BRASIL, 2018b). Os debates contribuem para a construção de propostas acadêmicas convergentes ao atendimento das necessidades em saúde no Brasil, em suas potencialidades e fragilidades, ao tempo em que a atenção/serviço é desafiada a acompanhar o movimento, requerendo avaliações e atualizações permanentes. Ao longo dos anos destacam-se a criação de programas com destaques ao Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) e, em 2008 o Programa de Educação para o Trabalho (PET-Saúde). Instituído no âmbito dos Ministérios da Saúde e da Educação, o PET-Saúde tem como pressuposto a educação pelo trabalho, convergente e contribuinte com a implementação da Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) para formação e desenvolvimento de trabalhadores, de acordo com a realidade e necessidades do SUS. Com objetivo de fomentar grupos de aprendizagem tutorial inicialmente com foco na Atenção Primária em Saúde (APS) e Estratégia Saúde da Família, edições subsequentes do PET-Saúde estenderam as propostas para outras áreas estratégicas como vigilância em saúde, saúde mental, redes de atenção e graduação em saúde (BRASIL, 2021). Há 15 anos em desenvolvimento, o programa persiste como uma das principais estratégias de indução de mudanças e qualificação nos processos de formação e desenvolvimento profissional para o SUS, ao tempo em que envolve e articula instituições de ensino superior, serviços de saúde e, comunidades. Este relato objetiva apresentar aspectos históricos da articulação entre o ensino, representado pela Universidade Federal da Fronteira Sul/Campus Chapecó (UFFS) e o serviço representado pela Secretaria de Saúde de Chapecó (SESAU), no desenvolvimento de propostas aprovadas pelo PET-Saúde. Para tanto foram acessados documentos publicados pelo Ministério da Saúde e, relatórios finais de edições PET-Saúde com participação da UFFS. Entre 2008 e 2015 foram apresentados oito editais do PET-Saúde, que envolveu quase oito mil projetos em diferentes regiões, temas e cenários. A trajetória da UFFS na aprovação de projetos vinculados ao PET-Saúde inicia-se em 2015, na 9ª edição, intitulada Gradua-SUS. Em 2018 segue-se com a aprovação de proposta vinculada à 10ª edição – PET-Saúde Interprofissionalidade e, por fim, em 2022 com projeto aprovado na 11ª edição – PET-Saúde Gestão e Assistência, atualmente em desenvolvimento. Cabe, a partir de agora, breve relato de cada proposta aprovada. Em 2015, através do Edital no 13/2015 – PET-Saúde/Gradua-SUS, é aprovada, entre os 105 projetos selecionados para o Brasil, a proposta de parceria estabelecida entre UFFS e SESAU. O projeto teve como eixos de atuação: adequação dos cursos às DCN; promoção da integração ensino-serviço-comunidade; e o desenvolvimento da docência e da preceptoria na saúde articulada às necessidades do SUS. Assume como pressupostos norteadores das mudanças, a interprofissionalidade, a integração ensino-serviço, a humanização do cuidado, a integralidade da assistência, e o desenvolvimento das atividades que considerem a diversificação de cenários de práticas e redes colaborativas na formação para o SUS. No âmbito da UFFS/SESAU envolveu os cursos de medicina e enfermagem em ações estruturadas e articuladas às necessidades sinalizadas pelo serviço na oportunidade: obesidade e zoonoses. Iniciou as atividades em maio 2016, estendendo-se até agosto/2017. Envolveu estudantes (30), tutores/docentes (08) e preceptores/profissionais (06), organizados em 2 grupos tutoriais, além da coordenação geral (01) exercida pela SESAU. Como resultados do movimento oportunizado pela edição Gradua-SUS destacam-se os avanços na adequação do curso de medicina e enfermagem com desenvolvimento de temáticas voltadas ao atendimento das necessidades de saúde regionais; a adoção de metodologias ativas de ensino-aprendizagem na condução do ensino em saúde; e a aproximação e fortalecimento da parceria entre UFFS e SESAU. Em 2018, através do Edital Nº 10, de 23 julho de 2018 é apresentada a proposta PET-Saúde/Interprofissionalidade. A 10ª edição do estabeleceu o conjunto de quatro eixos de intervenção: adequação dos cursos às DCN com foco na interprofissionalidade; iniciativas de educação e trabalho interprofissional em saúde alinhadas aos processos de mudança curricular; promoção da articulação ensino-serviço-comunidade com foco no desenvolvimento do SUS a partir dos elementos teóricos e metodológicos da educação interprofissional (EIP); e desenvolvimento da docência e preceptoria na saúde para utilização dos fundamentos teórico-conceituais e metodológicos da EIP. Considerado o tema em discussão e, a exigência do edital na representação de, no mínimo 4 cursos de graduação, a UFFS articulou parceira com outras instituições de ensino superior (IES) pública e privada sem fins lucrativos, para construção e submissão de proposta. Surge o único projeto aprovado em âmbito nacional envolvendo três IES – UFFS, Universidade do Estado de Santa Catarina/Centro de Educação Superior do Oeste – UDESC/CEO e, Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC. Envolveu 67 bolsistas vinculados aos cursos de Enfermagem e Medicina UFFS, Enfermagem UDESC e, Educação física e Psicologia UNOESC, sendo estudantes (36) e tutores (12), além de preceptores (18), organizados em seis grupos tutoriais. A exemplo da edição anterior, a coordenação geral foi exercida pela SESAU. Estabelecer aproximação e formação interprofissional/interinstitucional entre cursos e IES envolvidas, assim como o desenvolvimento de práticas colaborativas nos serviços; proporcionar ao estudante o (re)conhecimento interprofissional e aprendizado significativo sobre os outros, com os outros e entre si, no contexto do SUS; promover mudanças significativas nos PPCs para perfis profissionais conforme DCNs, alinhados aos princípios da intersetorialidade, interdisciplinaridade e interprofissionalidade; desenvolver competências nos docentes dos cursos envolvidos para o ensino pautado na interprofissionalidade na AB; fortalecer a integração ensino-serviço-comunidade e o SUS enquanto locus para a formação interprofissional e práticas colaborativas em saúde; fomentar práticas colaborativas entre os diferentes profissionais, favorecendo atuação efetiva nas demandas complexas de saúde; e desenvolver a responsabilidade sanitária do usuário do SUS, foram objetivos desta proposta. Como resultados citam-se o fomento à implantação/adoção da EIP nos processos formativos dos estudantes da área da saúde, e de práticas colaborativas (PC) na rotina dos serviços; a aproximação entre os cursos das diferentes universidades e maior compreensão da importância da educação interprofissional; e a percepção da importância do trabalho interprofissional, bem como, a atuação específica de cada um dos profissionais da ESF na resolução das demandas, com incorporação dos conceitos de EIP e PC no dia a dia da formação e do trabalho em saúde. Em 2022 a UFFS, na continuidade da parceira interinstitucional firmada, foi contemplada proposta intitulada “Consolidando a integração ensino-serviço-comunidade na Rede de Atenção à Saúde: a continuidade da parceria interinstitucional entre Secretaria de Saúde de Chapecó-SC, UFFS, UDESC/CEO, e UNOESC”, submetida ao Edital Nº1/2022 do PET-Saúde Gestão e Assistência, atualmente em desenvolvimento. Com objetivos de: promover a criação de grupos de discussão e fóruns de sensibilização de gestores, trabalhadores, usuários, preceptores, tutores e discentes das IES envolvidas, articulando com a CIES Regional, para fortalecer integração ensino-serviço-comunidade e o desenvolvimento de práticas colaborativas nos serviços; desenvolver processos de EPS a partir do levantamento de necessidades apontadas pelos serviços; fomentar a realização de eventos interinstitucionais e interprofissionais; realizar atividades assistenciais, vivências e imersões em diferentes serviços da RAS; fortalecer a gestão do cuidado em saúde e dos serviços; e fortalecer os processos de gestão compartilhada (cogestão) por meio de movimentos pedagógicos envolvendo a gestão, o ensino e as categorias profissionais, o projeto, iniciado em agosto 2022, tem previsão de término em julho 2023. Envolve 5 grupos tutoriais sendo três voltados ao eixo gestão em saúde e dois ao eixo assistência em saúde, com 08 estudantes, 02 preceptores e 02 tutores cada, perfazendo total de 60 bolsistas envolvidos, somados à coordenação geral feita pela SESAU. As diferentes edições do PET-Saúde desenvolvidos pela UFFS, em anos passados e na atualidade, trouxeram impactos positivos, com destaques à aproximação e maior interação entre universidades, entre universidade e serviços de saúde, além dos avanços à formação dos estudantes a partir de vivências e experiências na realidade do SUS. Conclui-se que o legado do PET-Saúde para a UFFS é de transformação e de reconhecimento de novas possibilidades para qualificação da formação em saúde, reorientando-a em acordo com os princípios, as diretrizes e as necessidades do sistema público de saúde brasileiro. Ainda, o fortalecimento de vínculos institucionais a partir da integração e parceria entre o ensino e o serviço, pode ser considerado um potente instrumento para o desenvolvimento profissional, e o PET-Saúde, enquanto estratégia de aproximação, em suas diferentes edições, oferece oportunidade para problematização, movimento e mudanças necessárias ao aperfeiçoamento da formação e da atenção no contexto do SUS. Espera-se que o amanhã seja igualmente fecundo em propostas e oportunidades, com permanente envolvimento da UFFS em iniciativas profícuas à formação em saúde.