PERCEPÇÕES DE UMA EQUIPE DE SAÚDE DA FAMÍLIA SOBRE A PREVENÇÃO QUATERNÁRIA
Palavras-chave:
Prevenção Quaternária; Estratégia Saúde da família; Iatrogenia.Resumo
PERCEPÇÕES DE UMA EQUIPE DE SAÚDE DA FAMÍLIA SOBRE A PREVENÇÃO QUATERNÁRIA
Schopf, Karina[1]
Vendruscolo, Carine[2]
Daniela Savi Geremia[3]
RESUMO EXPANDIDO
Introdução: o modelo proposto pelo sistema de saúde brasileiro para a organização dos serviços de Atenção Primária à Saúde (APS) é a Estratégia Saúde da Família (ESF), que é o principal meio de acesso aos serviços de saúde da população. O grande desafio dos profissionais que fazem parte da ESF é encontrar o equilíbrio entre prevenção, promoção da saúde e tratamento das doenças. 1 A Prevenção Quaternária (P4) consiste na identificação de pessoas em risco do excesso de intervenções e medicações, que tendem a tornar pessoas saudáveis em doentes. A P4 difere dos demais níveis de prevenção (primária, secundária e terciária) por ser voltada a ações que devem ser realizadas pelos profissionais de saúde e não pela usuário, haja vista que é o profissional que prescreve as medicações e intervenções, podendo colocar o paciente em risco de iatrogenias.2 Objetivo: relatar a percepção dos profissionais de uma equipe de saúde da família sobre a Prevenção Quaternária. Metodologia: trata-se de parte de um estudo de abordagem qualitativa do tipo Pesquisa Apreciativa sobre as percepções dos profissionais de saúde de uma equipe de Saúde da Família sobre P4. Os dados foram coletados em um dos encontros da pesquisa participativa, realizado no Município de Bandeirante, Santa Catarina (SC) no mês de julho de 2020. Este encontro envolveu os profissionais prescritores, sendo: Enfermeiro, Médico, Psicólogo, Nutricionista, Farmacêutico, Fisioterapeuta, Dentista. O estudo obedece aos critérios éticos estabelecidos na Resolução nº 466/12 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde para pesquisas envolvendo seres humanos e faz parte de um macroprojeto aprovado no CEP sob o parecer número: 3.375.951, de 06 de junho de 2019 e número do CAAE: 10420819.0.0000.0118. Resultados e Discussão: os profissionais reconhecem a importância de ações voltadas à P4, apesar de não realizarem de forma sistemática durante seus atendimentos e nem discutirem o assunto com o objetivo de nortear o trabalho da equipe. Relatam as dificuldades encontradas para desenvolver seu trabalho pautado em todos os níveis de prevenção, em especial com a P4. Estas estão relacionadas com a organização dos serviços, entendimento da população, dos gestores e mesmo dos profissionais, que muitas vezes não são conhecedores dos riscos que correm com o excesso de intervenções e medicações. Para os profissionais participantes, a mídia tem papel fundamental na cultura dos usuários que buscam incessantemente por atendimentos, os quais só são considerados de qualidade quando os profissionais prescrevem medicações e exames, haja vista que os usuários vêm para o serviço de saúde com muita clareza sobre o que precisam ou desejam. A sobremedicalização é um problema identificado pela equipe e que demanda atenção por parte dos profissionais, considerando seu uso comum nas ações preventivas na APS.3 As doenças crônicas são motivo constante da procura pelos serviços, com atendimentos repetitivos e o aumento do excesso de intervenções, sendo importante tratar essas condições dentro de uma estrutura integrada de atenção, que demanda posturas semelhantes dos profissionais e da população. Cumpre destacar que os profissionais esperam responsabilidade por parte da população em relação à sua saúde, priorizando ações voltadas à prevenção primária e secundária.4 Para os profissionais participantes desse estudo, não basta eles serem conhecedores da importância da P4, mas é fundamental levar ao conhecimentos dos usuários os riscos que o excesso de intervenções clínicas podem acarretar para sua saúde. Os profissionais não se sentem confortáveis para realizar ações voltadas à P4 devido a pressões por parte dos usuários e gestão e também, pelo medo de algumas ações - ou falta destas - se tornarem ações judiciais, haja vista outra cultura criada pelos usuários, de responsabilizar judicialmente os profissionais por desfechos indesejáveis de sua saúde. Para eles é muito mais fácil ceder a pressão e intervir desnecessariamente, como medida protetiva, tanto para saúde do paciente como para sua vida profissional. Nestas atitudes podemos verificar a estratégia preventiva de alto risco, que tem tido forte impacto nas rotinas assistenciais, com o predomínio dos rastreamentos, modelo de atenção centrado na enfermidade e jogo de interesses pelos responsáveis pela gestão e coordenação do cuidado, má distribuição e uso de recursos que alimentam culturas organizacionais voltadas à doença. Para os profissionais é necessário maior envolvimento e responsabilização por parte de todos, espaço para discussões, principalmente com a gestão, para que os serviços sejam organizados dentro das diretrizes da APS, onde todos os profissionais reconheçam as necessidades e fragilidades do serviço e sejam capazes de agir de acordo com os preceitos da P4, diminuindo ações intervencionistas e a medicalização, abrindo espaço para construção de diretrizes que precisam ser sistematizadas para maior proteção dos usuários. 5 Considerações finais: é reconhecida a importância de ações voltadas à P4 por todos os profissionais envolvidos, no entanto torna-se fundamental reconhecer as dificuldades levantadas pelos participantes quanto à atuação efetiva dos profissionais voltada ao tema. Cabe ressaltar a difícil tarefa imposta pelos meios de comunicação, indústrias farmacêuticas, perfis profissionais de cada categoria, interesses políticos e particulares que permeiam os serviços públicos de saúde. Eles influenciam diretamente na efetivação de ações voltadas à P4. Ressalta-se a importância de mais estudos voltados à P4 no âmbito da equipe interdisciplinar, sobretudo os prescritores, com o objetivo de auxiliar os profissionais e não somente responsabilizá-los para que não realizem e excesso de intervenções. Já é sabida a obrigação e responsabilidade de cada profissional na prevenção de riscos e agravos à saúde da população, mas é preciso reconhecer que décadas de cultura contrária a essa premissa dificilmente serão modificadas por aqueles que apenas reconhecem a relevância do tema e pelos poucos que a colocam em prática.
Descritores: Prevenção Quaternária; Estratégia Saúde da família; Iatrogenia.
Eixo temático: 3 – Pesquisa.
Financiamento (se houver): não se aplica.
REFERÊNCIAS
- Starfield, B.; Hyde, J.; Gérvas, JHI. The concept of prevention: a good idea gone astray? [online]: J Epidemiol Community Health, v. 62, p. 580-3, 2008.
- Tesser CD. Por que é importante a prevenção quaternária na prevenção? Rev Saude Publica. 2017; 51:116.
- Tesser C.D. Cuidado clínico e sobremedicalização na atenção primária à saúde. Trab. Educ. Saúde, Rio de Janeiro, 2019; 17(2):e002053.
- OPAS. Cuidados inovadores para condições crônicas: organização e prestação de atenção de alta qualidade às doenças crônicas não transmissíveis nas Américas. Washington, D. C.: Opas, 2015.
- Tesser, Charles D. Por que é importante a prevenção quaternária na prevenção? Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 51, n. 116, p. 1-9, 2017.
[1] Enfermeira, estudante do Mestrado Profissional em Enfermagem na Atenção Primária à Saúde (MPEAPS) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), karinaschopf70@gmail.com
[2] Doutora em Enfermagem, Docente do Curso de Enfermagem e Mestrado Profissional em Enfermagem na Atenção Primária à Saúde (MPEAPS) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), carine.vendruscolo@udesc.br
[3] Doutora em saúde coletiva, Docente do curso de Enfermagem da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), daniela.geremia@uffs.edu.br
