QUANDO A LÍNGUA SE TORNA BARREIRA: DESAFIOS NA MONITORIA DE BIOQUÍMICA PARA ESTUDANTES INDÍGENAS
Palavras-chave:
Povos Originários. Universidade. Idioma.Resumo
A Bioquímica é um componente curricular complexo, pois estuda os processos químicos nos organismos vivos, abordando estruturas das biomoléculas e sua correlação com os mecanismos metabólicos (SOLNER et al., 2025). Ela é altamente interdisciplinar, permitindo que os alunos compreendam as complexidades dos mecanismos celulares, com aplicabilidade em várias áreas. Por meio do projeto de monitoria intitulado “Monitoria de bioquímica: consolidação do processo de ensino-aprendizagem em âmbito interdisciplinar”, o qual visou proporcionar melhores condições de aprendizagem aos discentes dos cursos de Ciências Biológicas, Nutrição e Medicina Veterinária, foi possível realizar um recorte acerca da disciplina de Bioquímica Básica ofertada ao curso de Nutrição (2024/2). O atendimento aos acadêmicos para esclarecimento de dúvidas sobre os conteúdos abordados em sala de aula ocorreu semanalmente na sala de monitoria da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Realeza, em horários previamente agendados. Foram esclarecidas dúvidas sobre conteúdos teóricos e práticos, como a resolução de lista de exercícios, revisão mais minuciosa próximo a datas de provas para melhor compreensão dos processos metabólicos. No total, foram ofertadas 32 monitorias durante o semestre, sendo que a maioria envolveu alunos do curso de nutrição. As dificuldades mais encontradas no semestre incluíram a diferença de língua entre os monitores (português) e os alunos indígenas (Ticuna), gerando dificuldades na comunicação. Tal realidade levanta a necessidade de refletir se a universidade está, de fato, preparada para receber uma população diferenciada, considerando a adaptação do processo de ensino-aprendizagem às suas especificidades culturais e linguísticas (Da SILVA et al., 2012). Ainda hoje, o ensino superior brasileiro tende a impor uma lógica acadêmica baseada exclusivamente na língua portuguesa, sem contemplar as línguas indígenas no cotidiano das aulas e atendimentos, o que pode agravar ainda mais as barreiras de aprendizagem (PENSO, 2018). Essa limitação se reflete diretamente no desempenho dos estudantes indígenas observado neste projeto: dos alunos acompanhados, 4 foram aprovados, com a maior nota sendo 6,7, e esses foram os alunos que mais procuraram a monitoria. No entanto, 6 alunos indígenas reprovaram, sendo 5,2 a maior nota. Contudo, os alunos que reprovaram foram os que menos procuraram o apoio da monitoria, ou sequer procuraram.. Já no contexto geral dos estudantes como um todo, também foi observado que a maioria fazia uso excessivo de celulares nas aulas teóricas e práticas, o que resulta em distração e dispersão (NASCIMENTO, 2024). Outro fato observado foi que apesar da monitoria ser oferecida semanalmente, houve maior procura durante a semana de provas, o que indica a necessidade de fortalecer o hábito de estudo contínuo. Embora houvesse desafios, como a barreira linguística e a dispersão em sala de aula, aqueles estudantes que participaram ativamente da monitoria apresentaram melhor desempenho acadêmico. Esses resultados reforçam a urgência de se pensar em políticas e práticas pedagógicas que respeitem e incorporem a diversidade linguística e cultural no ensino, para que o aprendizado se torne verdadeiramente acessível a todos os estudantes.