FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE CIÊNCIAS PARA A PROMOÇÃO DO PENSAMENTO CRÍTICO: ESTUDO COMPARATIVO ENTRE DOCUMENTOS E DISCURSOS DO BRASIL E PORTUGAL
Resumo
1 Introdução
O ensino de Ciências tornou-se desafio para educação, visto a abundância de informações disponíveis, decorrentes do avanço da Ciência e da Tecnologia. Por isso, não se faz necessário apenas o conhecimento científico, mas também o desenvolvimento de um Pensamento Crítico (PC), como uma estratégia de ensino que prioriza a constituição de um sujeito ativo, reflexivo, autônomo, responsivo e, sobretudo, crítico (TENREIRO-VIEIRA, 2000). Adota-se, o PC, na perspectiva de Ennis (1985, p.46), que o compreende a: “uma forma de pensamento racional, reflexivo, focado no decidir aquilo em que acreditar ou fazer”, concordando com Tenreiro-Vieira (2000, p.20) quando diz que: “esta via racional permite-lhe analisar, decidir aquilo que é verdadeiro, dominar e controlar o seu próprio conhecimento e adquirir novo conhecimento”.
Porém, para que ocorra a inserção e promoção do PC em sala de aula, é necessário que haja articulação entre todos os fatores que influenciam o processo de ensino e aprendizagem. Pensando nisso, chama-se a atenção, para os Livros Didáticos (LD), pois pesquisas apontam que o ensino das áreas científicas ainda é muito atrelado ao uso quase exclusivo do LD, que “chega a aprisionar o fazer docente de forma perversa, expropriando o trabalho do professor” (GÜLLICH, 2013). Considera-se, esse fato um agravante para a implantação do PC, visto que os livros em geral não apresentam estratégias para a promoção do PC em Ciências.
2 Objetivo
Analisar LD de Ciências do 7º ano, verificando se os mesmos apresentam em seu enredo atividades que favoreçam a promoção do PC, no ensino de Ciências.
3 Metodologia
Esta pesquisa de educação em Ciências, tem abordagem qualitativa (LÜDKE; ANDRÉ, 2001), do tipo documental e desenvolvida com análise/categorização temática de conteúdo, tendo como base Livros Didáticos de Ciências do Ensino Fundamental (LDCEF). Para a realização da análise, utilizou-se oito LDCEF[1], sendo os mesmos avaliados pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), entre os anos de 2000 a 2017. Procedeu-se, a identificação de todas as atividades presentes nos LDs, bem como o potencial para a promoção do PC das mesmas. Sistematizou-se as categorias emergentes da análise, da seguinte forma: 1- Informativas; 2- Exploratórias e 3- Reflexivas/Críticas, com suas respectivas subcategorias e seus descritores, que são todas as atividades encontradas nos LDs, em sua nomenclatura original. Destaca-se, que as categorias e as subcategorias foram constituídas por meio do agrupamento dos descritores, sempre tendo como ponto de partida a natureza das atividades pedagógicas presentes nos LDCEF (ver Quadro 1).
Quadro 1- Sistematização das categorias, subcategorias emergentes dos descritores
Categorias
Subcategorias
Descritores
1.Informativas
1a. Leitura
Você vai gostar de ler; Leitura complementar; não deixe de ler.
1b. Nota explicativa
Saiba mais; Saiba mais; Saiba mais.
1c. Informações complementares
Certifique-se de ter lido direito; glossário A-z; Saiba de onde vêm as palavras; Isso entra no nosso vocabulário.
2. Exploratórias
2a. Estudo do texto
Trabalhando a leitura; Cientista detetive; De olho no texto; Explore linguagens; Explore; Nós; Fórum.
2b. Exercícios
Integrando conhecimento; Integrando conhecimento; Pense e responda; Pense um pouco mais; Use o que aprendeu; Atividades; Atividades; Faça seu próprio resumo; Discuta/trabalhe esta ideia; Desafio; Reflita sobre suas atitudes; Pense nesse problema; Para fazer no caderno; Estabeleça conexões.
2c. Desafios
Desafio do presente e passado.
2d. Referência na web
Entrando na rede; Conteúdo digital; Use a internet.
2e. Atividade sobre o tema
De olho no tema.
2f. Organização de ideias
Mapas conceituais.
2.g Problematização
Motivação; Ponto de partida; Ponto de chegada; A questão é; Começando a unidade; Porque estudar esta unidade; Seu aprendizado não termina aqui.
2h. Interpretação de texto
Para saber mais; Para ler o texto cientifico; Compreender o texto; Para ir mais longe; Rede do tempo; Em destaque; Pensar Ciência; Coletivo Ciências; Multiletramentos.
2.i Experimento
No laboratório; Experimentação faça você mesmo; Mãos à obra: atividade prática ou experimental; Aprendendo com a prática.
3. Reflexivas / Críticas
3a. Trabalho em grupo
Trabalho em equipe; Em grupo; Atividade em grupo; Para discussão em grupo.
3b. Prática pedagógica
Vamos fazer; Descubra; Experimento da hora.
3c. Pesquisa
Pensando e pesquisando; Tema para pesquisa; Mexa-se; Isso vai para o nosso mural.
3d. Abordagem CTSA
Ciência...; Por uma nova atitude; Ciência Tecnologia, Sociedade e Ambiente em pauta; Boxes CTS.
3e. Oficinas de Ciências
Oficinas, Projeto, Pensar, fazer compartilhar.
Fonte: Autores, 2018. Nota: construída com base na pesquisa empírica em LDCEF.
4 Resultados e Discussão
A categoria 1) Informativas, possui três subcategorias, representando 18% das atividades encontradas nos LDs. Considera-se que essas atividades meramente informativas, não desempenham um papel de instigar os sujeitos a pensar, refletir, pesquisar e investigar. Pode-se observar isto, por exemplo na subcategoria 1a. Leitura, onde todas as atividades se referem a textos exclusivamente informativos, sem nenhum perfil instigador e reflexivo. A proposta pedagógica dessas atividades nos remete às atividades tradicionais, atreladas à memorização e não às metodologias que instigam o sujeito a refletir e criticar, para construir conhecimentos (KRASILCHIK, 1987).
Enquanto, que a categoria 2) Exploratórias, comtempla o maior número de descritores, sistematizados em nove subcategorias, representando cerca de 53% das atividades encontradas nos LDs. Nesta categoria, ocorre o que se considera um arcabouço para a reflexão e para a criticidade, embora as atividades não sejam totalmente intencionadas para a promoção do PC, têm potencialidade de se aproximar desta função, levando o sujeito (aluno) a pesquisar, interpretar e pensar. Como por exemplo, na subcategoria 2d. Referências da Web, onde a proposta é que os alunos pesquisem algo complementar ao conteúdo, há indicação de fontes, para enriquecimento da pesquisa, que pode ser realizada na internet ou ainda no Cd que acompanha o LD.
As estratégias mais eficientes de ensino, em termos de competência para promoção do PC em Ciências, foram as sistematizadas na categoria 3) Reflexivas/Críticas, estão distribuídas em cinco subcategorias e representam cerca de 29% das atividades encontradas nos LDs. Considera-se que todas as atividades elencadas nessas subcategorias são plenamente eficientes na promoção do PC em Ciências, mas cabe destacar a subcategoria 3d. Abordagem CTSA, pois a inserção de atividades que abordam temas transversais, como Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA), são apontadas como essenciais para o ensino e para o desenvolvimento das capacidades do PC em Ciências.
5 Conclusão
A partir da análise realizada, foi possível observar que as atividades classificadas, na categoria 1) Informativas, tiveram menor incidência, representando apenas 17% das atividades encontradas nos LDCs, o que se considera positivo, visto que atividades desse cunho não representam metodologias atrativas e tampouco eficientes, apresentando traços marcantes de atividades atreladas à reprodução e memorização. Em contrapartida, as atividades sistematizadas na categoria 2) Exploratórias, foram as mais abundantes, representando um total de 53% das atividades presentes nos LDCs, o que se considera um resultado satisfatório, do ponto de vista que essas atividades, quando mediadas, possuem potencial para gerar reflexão, investigação, autonomia, dentre outras ações que favorecem o desenvolvimento das capacidades do PC.
As atividades que representam a promoção do PC em si, categorizadas em 3) Reflexivas/Críticas ocorreram em menor número, comparadas com a ocorrência da segunda categoria (exploratórias), mas ainda representam 29% das atividades encontradas no LDs. São atividades dessa natureza que devem ser utilizadas no ensino de Ciências, por conta do seu caráter instigador, ativo e reflexivo, que permite ao sujeito (re)criar ideias, valorizando o seu senso crítico. É correto afirmar também que houve melhorias nos LDs de Ciências com o passar dos anos, pois ocorrem atividades que podem promover o PC no Brasil, pelo que se considera os resultados satisfatórios ao ensino de Ciências.
Referências
ENNIS, R. H. Critical thinking and the curriculum. National Forum, v.65, n. 1 p. 24-27, 1985.
GÜLLICH, R. I. C. Investigação-formação-ação em ciências: um caminho para reconstruir a relação entre livro didático, o professor e o ensino. Curitiba: Prismas, 2013.
KRASILCHIK, M. O professor e o currículo das ciências. São Paulo: EPU, 1987.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: Epu, 2001.
TENREIRO-VIEIRA, C. O pensamento Crítico na Educação Científica. Lisboa: Instituto Piaget, 2000.
Palavras-chave: ensino de ciências; reflexão crítica; currículo; estratégias de ensino; formação de professores.
Financiamento
CNPq
[1] Os livros selecionados estavam no acervo e em uso nas escolas da Região das Missões no Rio Grande do Sul (RS).
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Submeto o trabalho apresentado como texto original à Comissão Científica da XVI JIC, o qual apresenta os resultados de subprojeto de pesquisa, e concordo que os direitos autorais a ele referentes se tornem propriedade do Anais da XVI JIC da UFFS.
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