AVALIAÇÃO DE GENOTOXICIDADE CAUSADA POR AGROTÓXICOS EM ANFÍBIOS

  • Alexandre Folador Universidade Federal da Fronteira sul
  • Natani Macagnan
  • Camila Fátima Rutkoski
  • Vrandrieli Jucieli Skovronski
  • Marilia Terezinha Hartmann

Resumo

1 Introdução/Justificativa

Cipermetrina é o inseticida mais utilizado no Brasil, tanto na agricultura quanto na medicina veterinária e em produtos de saúde pública. Consiste em um piretróide sintético com baixa toxicidade e possui características limitadas de persistência do solo, contudo, é altamente tóxico para organismos aquáticos (SILVA, 2014). Os anfíbios são um grupo de vertebrados considerados biondicadores ambientais em virtude do seu ciclo de vida bifásico (aquático e terrestre) e por estarem em contato natural com contaminantes em seu habitat (SILVA, 2014). Ainda, são tidos como um grupo adequado para avaliação do dano genotóxico de vários agrotóxicos no ambiente aquático (HOWE et al., 2004).

O ensaio de micronúcleo é considerado uma técnica para diagnosticar genotoxicidade e é feito através da observação de células de sangue a nível microscópio. O micronúcleo consiste em uma anomalia celular, representada por um núcleo menor, separado do núcleo principal, formado durante a telófase da mitose que provoca danos ao DNA.

2 Objetivos

O objetivo do estudo foi avaliar a genotoxicidade da formulação comercial de cipermetrina no anfíbio Physalaemus gracilis (Anura: Leptodactylidae), uma espécie não-alvo dos pesticidas e que vive em agroecossistemas.

3 Material e Métodos/Metodologia

A formulação comercial testada de Cipermetrina continha 250 g/L de ingrediente ativo e 723 g/L de  ingredientes inertes. Para a obtenção das larvas de Physalaemus gracilis foram coletadas as desovas totais na natureza, com menos de 24 horas de oviposição, em um lago localizado na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS; latitude: -27.728681; longitude -52.285852 graus).

            As desovas foram colocadas em aquários de 15 litros, com água desclorada, atendendo os padrões de potabilidade. A sala de criação foi aclimatada, mantida com fotoperíodo de 12 horas claro/escuro, a umidade relativa do ar em 50-70 %, e a água em 22-25 °C de temperatura e 4-5 mg/L de oxigênio dissolvido. A partir do estágio 23 de Gosner (1960), as larvas foram alimentadas com ração comercial para peixes. 

            Foram realizados ensaios de toxicidade crônica, durante 168 horas (7 dias) com as larvas no estágio de desenvolvimento 25 de Gosner (1960). Os ensaios foram realizados em sextuplicata, com 10 larvas por recipientes de vidro, contendo água potável livre de cloro e a concentração de cipermetrina a ser testada.  Foi feito um controle negativo, somente com água, também em sextuplicata. Foram testadas cinco concentrações de cipermetrina consideradas ambientalmente relevantes, encontradas em águas superficiais no Brasil, de acordo com a literatura: 1 µg/L (BELLUTA et al., 2010), 3 µg/L (BELLUTA et al., 2010), 6 µg/L (ETCHEGOYEN et al., 2017 ) e 20 µg/L (CARLOS  et al., 2010) e uma concentração intermediária entre 6 e 20 µg/L, que foi de 10 µg/L.  A cada 24 horas os indivíduos foram alimentados com ração comercial para peixes e os mortos foram computados e retirados.

               Para análise da genotoxicidade, foi realizado o teste do micronúcleo. Para isso, ao final do teste crônico, foram retiradas aleatoriamente 15 larvas de cada concentração e foi extraída uma gota de sangue de cada uma. O sangue de cada larva foi colocado em uma lâmina de microscopia esterilizada, que foram secas a temperatura ambiente e fixadas em metanol frio (4ºC) durante 2 minutos. Posterior à fixação, as lâminas secas foram lavadas com tampão fosfato (pH 7) durante 1 minuto. Na sequência, foram coradas em solução de Giemsa 10% durante 15 minutos, ao abrigo de luz. Ao final dessa etapa, as lâminas foram lavadas com água destilada para remover o excesso de corante e colocadas para secar em temperatura ambiente e ao abrigo da luz, para posterior análise da frequência de micronúcleos. A análise de micronúcleos foi realizada com o auxílio de microscópio (objetiva de 100X), sendo analisados 1000 eritrócitos de cada larva.

         Para análise estatística dos dados utilizou-se o software Statistic 8.0. As diferenças entre o controle e as outras concentrações e, a determinação da concentração de efeito não observado (CENO) e concentração de efeito observado (CEO), foram feitas através da ANOVA, seguida do teste Dunnett, com 95% de confiança. Através da média geométrica de CENO e CEO foi calculada a máxima concentração aceitável de toxicante (MCAT). A avaliação de risco ecológico foi realizada utilizando quociente de risco crônico (QRC = CAE/CENO) que consiste na divisão da concentração ambiental estimada (CAE) de cipermetrina dividida pelo CENO.  O resultado de QRC foi comparado a um valor de referência (1) estabelecido pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos. Se o resultado obtido for superior a 1 indica que a formulação comercial do agrotóxico apresenta potencial de risco crônico para a espécie estudada.

4 Resultados e Discussão

Foram analisados 90947 eritrócitos nas cinco concentrações testadas e controle. Foi constatada a presença de micronúcleo em todas as concentrações analisadas e a ocorrência foi proporcional ao aumento da concentração, com exceção da concentração de 10 mg.L-1. Houve diferença significativa na ocorrência de micronúcleos nas larvas de P. gracilis em relação ao controle (F5,84=6,55 p<0,01), sendo significativo para as concentrações de 6 e 20 mg.L-1 de cipermetrina (teste de Dunnett, p<0,05).

            Em relação a genotoxicidade, o valor de CENO para P. gracilis foi de 3 mg.L-1 de CEO  foi 6 mg.L-1. A MCAT foi de 4,24 mg.L-1 o que significa que concentrações acima de 4,24 mg.L-1 na água são genotóxicas para P. gracilis.

Na avaliação de risco ecológico foi utilizada a máxima concentração de cipermetrina na água encontrada dentro da área de ocorrência de P. gracilis, que foi de 194 mg.L-1 (MARINO; RONCO, 2005). O quociente de risco foi de 64,66, estando superior ao nível de preocupação (1), indicando risco crônico para as larvas de P. gracilis expostas a cipermetrina e possivelmente para outros anfíbios e animais aquáticos. Esses dados indicam que cipermetrina deveria ser reavaliada para organismos não-alvo.

A ocorrência de micronúcleo indica que a formulação comercial testada tem potencial de causar dano genotóxico e que as concentrações encontradas na água apresentam risco crônico para o anfíbio P. gracilis. Esse resultado é preocupante, visto que a concentração de cipermetrina permitida na água de abastecimento no estado do Rio Grande do Sul é de 300 mg.L-1, estando bem superior  as concentrações testadas que causaram efeitos genotóxicos em um vertebrado não alvo.

5 Conclusão

As concentrações testadas são ambientalmente relevantes e podem estar presentes em agroecossistemas onde esta espécie e outros organismos aquáticos habitam, tendo potencial de causar genotoxicidade. Sugere-se que sejam realizados mais estudos nessa e em outras espécies não alvo com outras formulações comerciais de cipermetrina a fim de verificar o potencial genotóxico dos piretróides.

Referências

BELLUTA, I.; ALMEIDA, A. A.; COELHO, J. C.; NASCIMENTO, A. B.; SILVA, A. M.; Avaliação temporal e espacial no córrego do Cintra (Botucatu – SP) frente aos defensivos agrícolas e parâmetros físico-químicos de qualidade da água – um estudo de caso. Revista Energia na Agricultura, v. 25, n. 2, p. 54-73, 2010.   CARLOS, E. A.; NEVES, A. A.; REIS, C.; QUEIROZ, M. E. L. R. Determinação simultânea de trialometanos e agrotóxicos em água por cromatografia gasosa. Química Nova, v. 34, n. 2, p. 272-278, 2011.

 

ETCHEGOYEN, M. A.; RONCO, A. E.; ALMADA, P.; ABELANDO, M.; MARINO, D. J. Occurrence and fate of pesticides in the Argentine stretch of the Paraguay-Paraná basin. Environmental Monitoring and Assessment, v. 189, n. 63, p. 1-12, 2017.

 

MARINO, D.; RONCO, A. Cypermethrin and chlorpyrifos concentration levels in surface water bodies of the Pampa Ondulada, Argentina. Bulletin of Environmental Contamination and Toxicology, v. 75, p. 820-826, 2005.

 

SILVA P. R. Influência do herbicida quinclorac sobre os níveis de lipoperoxidação e das defesas antioxidantes enzimáticas no tecido muscular de Lithobates catesbeianus (Anura: Ranidae). 2014. Monografia (Bacharel em Ciências Biológicas) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

Palavras-chave: micronúcleo; Physalaemus gracilis; cipermetrina.

Financiamento

PIBIC-UFFS

Publicado
17-09-2018