O USO DE TEXTOS DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE QUÍMICA COMO POTENCIAL PARA A FORMAÇÁO DO LEITOR

  • Joana Laura de Castro Martins Universidade Federal da Fronteira Sul - Cerro Largo
  • Judite Scherer Wenzel Universidade Federal da Fronteira Sul - Cerro Largo

Resumen

1 Introdução

O presente resumo contempla resultados de uma pesquisa de iniciação científica que apresentou como foco o acompanhamento da prática de leitura de Textos de Divulgação Científica (TDC) num grupo de estudos. O grupo foi criado com a intenção de auxiliar, de propor e de acompanhar a prática de leitura de TDCs junto a professores formadores e licenciandos de um Curso de Química Licenciatura de uma universidade pública da região Sul do país, tendo em vista a formação de leitores. O grupo iniciou as suas atividades no ano de 2016 e conta, até o momento, com 26 participantes, sendo desses 22 licenciandos e 4 professoras formadoras, 3 da área de ensino e uma da área específica da química.

Pela prática de leitura vivenciada, buscou-se ampliar e qualificar a participação dos licenciandos e, analisar o seu desenvolvimento cognitivo frente à prática da leitura. Para isso foi proposta uma estratégia de leitura pelo uso da elaboração e socialização de perguntas. Os estudos de Graesser e McMahen (1993) têm enfatizado a importância da elaboração de perguntas para o desenvolvimento do sistema cognitivo, pois auxilia na compreensão de um texto, de um material complexo, na resolução de problemas e na criatividade. Ainda, Mazzitelli, Maturano e Macías (2009) apontam que por meio da elaboração de perguntas é possível obter informações sobre qual o grau de interpretação dos leitores e, assim determinar se o nível de representação na memória é apropriado, ou seja, é possível visualizar como de fato, o leitor interagiu com o texto. Daí a justificativa de tal metodologia na condução das leituras.

2 Objetivo

Buscou-se compreender como a elaboração de perguntas auxilia no desenvolvimento cognitivo dos licenciandos e de como retrata o seu posicionamento de leitor frente a leituras de Textos de Divulgação Científica (TDCs).

3 Metodologia

               Antes do início das atividades, a pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UFFS e, em seguida os participantes do Grupo de Estudos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). De um modo geral a pesquisa se caracteriza por ser de caráter qualitativo e os resultados foram construídos mediante a análise das perguntas elaboradas pelos licenciandos em três encontros do Grupo de Estudos. Em cada um dos encontros foi realizada a leitura de um capítulo do livro Tio Tungstênio: Memórias de uma Infância Química, do autor Oliver Sacks. No primeiro encontro foi dialogado o capítulo 10 intitulado “Uma Linguagem Química”, no segundo, o capítulo 16 “O Jardim de Mendeleiev” e, no terceiro encontro o capítulo 24 “Luz Brilhante”. Todos os textos foram encaminhados aos participantes do grupo, com no mínimo duas semanas de antecedência, para que fosse realizada uma leitura e elaboradas as perguntas, que deveriam ser trazidas aos encontros para auxiliar na condução dos diálogos. O primeiro encontro teve 8 participantes e 7 perguntas encaminhadas, o segundo encontro teve 9 participantes e 5 perguntas, já o terceiro encontro teve o maior número de participantes e de perguntas elaboradas perfazendo um total de 8 perguntas para 14 participantes. Assim, os três encontros contribuíram com 20 perguntas que foram analisadas.                A análise das perguntas indiciou o grau de envolvimento dos licenciandos[1] com o texto, as suas compreensões e os seus modos de leitura, mostrando-se um importante material de pesquisa. A metodologia que norteou a análise das perguntas considerou as categorias de Mazzitelli, Maturano e Macías (2009), os quais desenvolveram um estudo exploratório sobre perguntas e respostas elaboradas pelos alunos mediante a leitura de um texto de ciências e propuseram quatro tipos de categorias (I, II, III e IV) para a classificação das perguntas: Tipo I: Perguntas textuais e respostas literais. Tipo II: Perguntas não textuais e respostas literais. Tipo III: Perguntas textuais e respostas inferenciais. Tipo IV: Perguntas não textuais e respostas inferenciais. Uma resposta literal se caracteriza por apenas buscar informações na base do texto e uma resposta inferencial requer uma busca de informação que não é explicitamente a base do texto, mas que exige: inter-relacionar a informação do texto com o próprio conhecimento do leitor.

4 Resultados e Discussão

Na construção dos resultados além de considerarmos as categorias de Mazzitelli, Maturano e Macías (2009) elencamos três subcategorias emergentes, a saber, (A) Aspectos do conteúdo químico e de definições conceituais; (B) Aspectos da evolução histórica do conhecimento e de Ciência e (C) Perspectiva da formação docente e Ensino de química. Essas subcategorias apresentaram características da estrutura de um TDC como, a laicidade com a história e a contextualização na categoria (B); a didaticidade presente na subcategoria (C), na qual os leitores indiciaram uma preocupação para com os cuidados com a linguagem e o ensinar química. E, ainda, a subcategoria (A) contemplou um olhar mais direcionado para definições conceituais, aproximando-se da característica da cientificidade também característica do TDC.

De um total de vinte questões, seis foram agrupadas na categoria Tipo I e evidenciou-se a subcategoria (A), sendo que a atenção foi para com a definição de conceitos científicos. Wenzel e Maldaner (2014) ressaltam a importância do uso dos termos específicos químicos no movimento da apropriação da linguagem científica e destacam que o licenciando deve “se apropriar da linguagem química e saber comunicar-se, fazendo uso de tal linguagem” (2014, p. 911). Da análise depreendeu-se que, em especial, os licenciandos que elaboraram essas questões categorizadas como tipo I, se caracterizaram como um leitor com uma ausência de posiconamento crítico frente ao texto. As perguntas textuais foram simplesmente retiradas do texto e a sua resolução implica numa simples resposta literal. Ou seja, para eles a prática de leitura consiste numa simples busca de informações.

Já quatro questões que foram agrupadas na subcategoria (B) faziam menção a aspectos históricos da ciência, com atenção para a sua importância para o ensino de química. Essa ideia vem de encontro com o pensamento de Sequeira e Leite (1988) que enfatizam a importância da história da ciência no ensino de ciências, a fim de oportunizar a compreensão de que as teorias atualmente aceitas são construções históricas, decorrentes da atividade humana, coletiva, desenvolvida num determinado contexto histórico-social-cultural.  Essas questões indiciaram avanços em relação ao posicionamento do leitor, consideradas do tipo II de Mazzitelli, Maturano e Macías (2009), na qual a pergunta não é retirada diretamente do texto, indicam elaboração própria a partir da leitura, apesar de a resposta ser facilmente encontrada no texto. Ainda, nessas quatro questões, foi possível evidenciar o tipo III, que retrata uma pergunta retirada do texto, mas que requer respostas que estabeleçam relações com a informação do texto e com o próprio conhecimento do leitor. Assim, nas duas tipologias podemos perceber um avanço no grau cognitivo de elaboração da pergunta e de interação com o texto.

E em dez questões emergiu a subcategoria (C) que indiciou uma preocupação com o ensino – aprendizagem de química por meio da contextualização e pelo uso de diferentes métodos para a significação de conceitos. Essa preocupação com a significação conceitual vem de encontro com as ideias de Maldaner (2014, p. 20) que ressalta que é necessário, no espaço escolar, aprofundar o significado das informações que chegam de maneira fácil aos estudantes, por meio dos saberes e vivências que os configuram, situando essas informações em variados contextos e relacionando as mesmas a conhecimentos que possam produzir novos sentidos, oportunizando a formação do pensamento químico sobre o mundo. Essas questões foram elencadas nos tipos III e IV, sendo que a última demonstra perguntas com um grau cognitivo superior e que retratam uma maior interação do leitor com o texto, um leitor que amplia o diálogo e traz preocupações com a sua formação e posterior prática docente.

5 Conclusão

Os resultados indicam que o grupo de estudos, os encontros de leituras e as elaborações de perguntas auxiliam na formação do leitor, pois o primeiro encontro  teve a maioria das perguntas classificadas na subcategoria A, tipo I e nos outros dois encontros ficou evidente a presença da categoria B e C, com tipos, II, III e IV, importante ressaltar que as organizadoras do grupo em cada encontro também formularam questões, e é possivel que as mesmas auxiliaram os demais leitores a se posicionarem com mais criticidade frente ao texto, pois todo o processo de ensino precisa ser apreendido.

 


[1]A análise foi realizada apenas das perguntas elaboradas pelos licenciandos, sem contar as perguntas elaboradas pelos pesquisadores (uma professora formadora e três licenciandos) e demais professoras formadoras (três) participantes do Grupo de Estudos. Ainda, no decorrer da discussão dos resultados os licenciandos independente de sexo serão assim denominados.

Citas

Referências

GRAESSER, A. C.; MCMAHEN, C. L. Anomalous Information Triggers Questions When Adults Solve Quantitative Problems and Comprehend Stories. Journal of Educational Psychology, 85, 1:136-151, 1993;

MALDANER, O. A. Formação de Professores para um Contexto de Referência Conhecido. In: NERY, B. K.; MALDANER, O. A. (Org.). Formação de Professores: Compreensões em novos programas e ações. Unijuí: Ed. Unijuí, 2014. 248 p.;

MAZZITELLI, C.; MATURANO, C.; MACÍAS, A. Análisis de las preguntas que formulan los alumnos a partir de la lectura de un texto de Ciencias. Revista Electronica de Enseñanza de las Ciencias, v. 8, n. 1, p. 45-57, 2009;

WENZEL, J. S.; MALDANER, O. A. A significação conceitual pela escrita e reescrita orientada em aulas de química. Química Nova, São Paulo, v. 37, n. 5, p. 908-914, 2014.

Publicado
21-09-2017