A LÍNGUA E OS INSTRUMENTOS LINGUÍSTICOS NA REGIÃO DAS MISSÕES DO RS

  • Bruna Luiza Mallmann Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Cerro Largo
  • Caroline Mallmann Schneiders Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Cerro Largo
Palavras-chave: Palavras-chave, Museu, Historicidade, Discurso, Arquivo.

Resumo

1 Introdução

Na presente pesquisa, refletimos sobre o Museu da Missões, um importante museu localizado no Sítio Arqueológico de São Miguel Arcanjo, em São Miguel das Missões/RS. Sua criação oficial ocorreu através do Decreto-lei nº 2.077, de 8 de março de 1940. Ao fundá-lo, Getúlio Vargas, então presidente do Brasil, declarou que o novo museu teria a função de “reunir e conservar as obras de arte ou de valor histórico relacionadas com os Sete Povos das Missões Orientais, fundados pela Companhia de Jesus naquela região do país” (BOTELHO; VIVIAN; BRUXEL, 2015, p. 50). Tem isso em vista, tomamos esse Museu como nosso objeto de estudo, a fim de lançar gestos de interpretação sobre o arquivo que ali está guardado, preservando determinada história e memória da e sobre as Missões.

2 Objetivo

Nosso objetivo é analisar os efeitos de sentido produzidos no e pelo Museu da Missões, a partir da análise das imagens que compõe o seu arquivo.

3 Metodologia

O aparato teórico-metodológico desse estudo está filiado à História das Ideias Linguísticas em articulação com a Análise de Discurso de viés pecheuxtiano. Nossa análise parte do arquivo do Museu das Missões, o qual é composto por artefatos históricos, ou seja, por representações artísticas e não por documentos escritos. Diante disso, analisamos algumas dessas esculturas, as quais são tratadas como imagens e constituem o nosso corpus de análise, uma vez que a imagem é discurso, pois produz um efeito de memória, faz ressoar determinada historicidade e produz um recorte do real que se manifesta conforme o funcionamento ideológico e político ao qual está inserida (ORLANDI, 2011).

4 Resultados e Discussão

As imagens analisadas referem-se a esculturas de santos, anjos e mártires em madeira policromada feitas pelos indígenas durante as missões jesuíticas. Essas esculturas, de estillo barroco, foram importantes instrumentos de catequisação, diga-se, de dominação, para os jesuítas, contribuindo para impor novas crenças e hábitos a populações indígenas que já possuíam cultura e língua própria. Analisar tais imagens torna-se relevante, pois a imagem é, “além de um operador de memória social no seio da nossa cultura”, um objeto linguístico e histórico, que “convida o espectador concreto a dar sentido ao que ele tem sob os olhos, criando de certa maneira uma comunidade de acordo” (DAVALLON, 2007, p. 31).

Entendemos que os sentidos (re)produzidos pelo e no museu são operadores da memória social e coletiva, uma fala cristalizada que faz parte do imaginário da população local, em que se circula um determinado significado (ORLANDI, 2014). Assim, consideramos que a memória do arquivo do museu vincula-se a uma memória oficial, a que chamamos de memória institucionalizada.

Nessa pesquisa, partimos do pressuposto de que o Museu pode ser compreendido enquanto um instrumento linguístico, um objeto linguístico histórico e ideológico, conforme estudos desenvolvidos no Brasil acerca do Museu da Língua Portuguesa. Diante disso, o que colocamos em evidência nessa pesquisa não é a memória de arquivo, aquela que é guardada pelo e no museu, destacamos os sentidos outros produzidos pelos discursos do/no Museu, ou seja, os efeitos da memória discursiva na sua relação constitutiva com a história.

Considerando os efeitos produzidos pela memória discursiva, podemos dizer, como nos ensina Orlandi (2014), que o sentido sempre pode ser outro, a memória discursiva é marcada pelo esquecimento e está sempre em articulação com o funcionamento do ideológico e do político. Dessa forma, entendemos o Museu da Missões como um lugar de memória que coloca em jogo as relações de poder existentes entre os indígenas e os jesuítas, apontando para o fato de que há efeitos de sentido silenciados que são explicitados ao refletirmos sobre as imagens que ali estão guardadas. Logo, podemos dizer que os discursos em análise ressoam uma determinada historicidade, bem como relações ideológicas e de poder da época das reduções jesuíticas.

5 Conclusão

As imagens do Museu das Missões podem ser vistas como um produto dos discursos políticos e ideológicos que vigoravam na época em que foram construídas, sendo o Museu um espaço para amparar determinados discursos, ou, no caso, representações artísticas, a fim de preservar uma determinada memória, história e sentidos. Quando as imagens foram produzidas pelos indígenas, vinculavam-se a determinado discurso ideológico, condição que fez com que os indígenas reproduzissem imagens de natureza religiosa. A questão ideológica, para nosso estudo, é relevante na medida em que podemos observar, a partir da história das reduções jesuíticas, a presença de uma ideologia dominante, que afeta a constituição das imagens guardadas no Museu das Missões. Enquanto prática significante, a ideologia se constitui na relação do sujeito com a língua e com a história para que haja sentido (ORLANDI, 2015).

Portanto, explicitamos a relação constitutiva do discurso com a história e a memória, nas relações de poder estabelecidas pela ideologia dominante da época, e compreendemos como a língua, em sua historicidade constitutiva, foi um instrumento essencial no processo de produção das imagens guardadas no Museu das Missões. Assim, refletimos como um patrimônio material produz sentidos sobre algo que está no nível do imaterial, a língua. Ou seja, ao explicitar o processo discursivo das representações artísticas e linguísticas do Museu das Missões, é possível compreender uma possibilidade outra de versão de memórias e histórias a serem contadas sobre a região das Missões.

Biografia do Autor

Bruna Luiza Mallmann, Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Cerro Largo
Bruna Luiza Mallmann, bolsista CNPq, acadêmica do curso  de Licenciatura em Letras - Português e Espanhol da Universidade Federal da Fronteira Sul, Campus Cerro Largo.

Referências

DAVALLON, J. A imagem, uma arte de memória? In: ACHARD, P. Papel da Memória. 2ª Edição, Campinas, SP: Pontes Editores, 2007. p. 23-34.

BOTELHO, A. A.; VIVIAN, D.; BRUXEL, L. Museu das Missões. Brasília, DF: Ibram, 2015. p. 80.

ORLANDI, E. P. Análise de Discurso: Princípios e Procedimentos. 12. ed. Santa Maria: Pontes, 2015. p. 98.

ORLANDI, E. P. Discursos e Museus: da memória e do esquecimento. Entremeios. Pouso Alegre/MG, p. 1-8, vol. 9, Jul., 2014.

Publicado
18-09-2017