VERDADES E ASSENTIMENTOS CÉTICOS EM SEXTO EMPÍRICO

  • Maurício Francisco Schiehl Universidade Federal da Fronteira Sul - Campus Chapecó
  • Flávio Zimmermann Universidade Federal da Fronteira Sul - Campus Chapecó

Abstract

1 Introdução

O grande impacto dos textos de Sexto Empírico na modernidade tornou a pesquisa destes textos essencial para o entendimento da história da filosofia moderna, assim como a epistemologia contemporânea muito recorreu a usar e responder argumentos céticos da antiguidade. Os textos de Sexto Empírico foram então revisitados por alguns dos mais competentes pesquisadores internacionais, e por alguns poucos pesquisadores nacionais. Esta tradição recente de pesquisas levou a duas correntes principais de interpretação com entendimentos divergentes sobre o ceticismo exposto nas obras de Sexto Empírico: a rústica, baseada principalmente na leitura de M. F Burnyeat, que entende que a εποχή cética atinge todas as questões de opinião, mesmo as mais básicas da vida comum, e assim o cético não poderia dar assentimento a nenhuma questão de escolha; e a urbana, baseada principalmente na leitura de Michael Frede, para qual a εποχή cética atinge apenas o άδηλων, i.e. o domínio das coisas que supõem-se exteriores ao domínio fenomênico, e assim o cético poderia assentir a qualquer coisa que não se proponha exterior ao fenômeno. Oswaldo Porchat propôs-se a estender o domínio teorético do ceticismo sextiano ao propor que se poderia, sem qualquer contradição, conceituar contemporaneamente uma definição de verdade propriamente cética.

 

2 Objetivo

A pesquisa objetiva estudar as duas tradições de interpretação a partir dos textos de Sexto Empírico com o intuito de elucidar o alcance da dúvida cética e das possibilidades pirrônico-sextianas de assentimento, e a possibilidade e o estatuto dos juízos de verdade e falsidade dentro da doutrina cética de Sexto Empírico.

 

3 Metodologia

A pesquisa orienta-se na confrontação das duas interpretações com os textos de Sexto Empírico e na discussão dos argumentos utilizados, e, principalmente, das evidências textuais utilizados por ambos os lados do debate. Há também uma atenção específica a ocorrências dos termos “verdade”, “verdadeiro”, “falso” e de possíveis juízos de verdade ou falsidade, além de formas de diversas formas de assentimento expressas nos textos. O estudo necessita de uma análise dos textos gregos com atenção e pesquisa de algumas termos gregos, para isto recorre-se a bibliografias específicas e também opta-se por consultar como dicionário a Greek Word Study Tool, disponibilizada pela Perseus Digital Library.

 

4 Resultados e Discussão

Um primeiro resultado na análise das evidências textuais apresentadas pelas duas interpretações mostra que a interpretação urbana consegue explicar a seu modo as evidências apresentadas pela interpretação rústica. Já a rústica não consegue o mesmo com as evidências textuais da interpretação urbana. Além disso, a leitura dos textos de Sexto Empírico encontrou diversas passagens que contradizem a interpretação rústica, ou com problemas a que esta interpretação não conseguiria responder. A interpretação rústica foi desconstruída nos seus principais e mais comuns argumentos, e todas as citações citadas por Burnyeat foram contextualizadas e melhor explicadas à luz da interpretação urbana, demonstrando uma grande superioridade em coerência de interpretação da interpretação urbana sobre a rústica.

A interpretação urbana conseguiu manter uma maior coerência com os textos, e foram encontradas ainda centenas de passagens não utilizadas ou discutidas pelos pesquisadores que corroboram com esta interpretação. Além disso, foram encontradas inúmeras citações à juízos de verdade e falsidade nas obras de Sexto Empírico, havendo inclusive uma explicação do próprio Sexto Empírico em um de seus textos de quando os juízos de verdade e falsidade poderiam aplicar-se sem contradição ao seu ceticismo.

 

5 Conclusão

A pesquisa conclui que céticos podem ter todo o tipo de assentimento que não se trate de άδηλων, incluindo nos juízos de verdade e falsidade. Os juízos de verdade e falsidade são sim coerentes com o ceticismo de Sexto Empírico, mas, diferentemente de Porchat (que propôs-se a criar contemporaneamente), concluímos que o próprio Sexto Empírico utiliza-se destes juízos e ele mesmo explica sua conceituação e limite dos juízos de verdade e falsidade.

 

A pesquisa revelou alguns novos aspectos da filosofia de Sexto Empírico até então pouco citados. Sabendo-se que os céticos podem opinar sobre quase todas as coisas, com a única exceção no άδηλων, é possível acrescentar um conjunto de teses e doutrinas que contemporaneamente chamaríamos de filosóficas. Sexto Empírico é, como revelam os textos, um claro defensor do convencionalismo linguístico, de uma forma bastante radical de empirismo, de um estatuto similar ao que chamaríamos de científico dado às τεχναι (artes técnicas) ao ponto de refutar as disciplinas que se propõem como τεχναι (como a gramática técnica, a retórica e a astrologia) mas que não são τεχναι dentro de suas concepções; além de proponente de variados comentários sociais, políticos e culturais de sua época. Além disso, muitos elementos de filosofias contemporâneas como o positivismo e o pragmatismo podem ser encontrados nos textos de Sexto Empírico.

 

Referências

 

BURNYEAT, M. F.. Pode o cético viver seu ceticismo? Sképsis, Guarulhos, v. 5, n. 3, p.201-239, 2010.

 

FREDE, Michael. The Skeptic's Beliefs. In: FREDE, Michael. Essays in Ancient Philosophy. Minneapolis: University Of Minnesota Press, 1987. p. 179-200.

 

PORCHAT, Oswaldo. Verdade, realismo e ceticismo. Discurso, São Paulo, v. 25, p.7-67, jun. 1995

 

_________________. A NOÇÃO DE PHAINÓMENON EM SEXTO EMPÍRICO. Analytica, Rio de Janeiro, v. 17, n. 2, p.293-323, 2013.

 

SEXTO EMPÍRICO. Complete Works of, 4 vols. Trad. R.G. Bury. In: Loeb classical Library. Harvard: Harvard University Press, 1976.

 

Palavras-chave: ceticismo; pirronismo; verdade; assentimento; Sexto Empírico.

 

Fonte de Financiamento

FAPESC - EDITAL 07/2015

References

BURNYEAT, M. F.. Pode o cético viver seu ceticismo? Sképsis, Guarulhos, v. 5, n. 3, p.201-239, 2010.

FREDE, Michael. The Skeptic's Beliefs. In: FREDE, Michael. Essays in Ancient Philosophy. Minneapolis: University Of Minnesota Press, 1987. p. 179-200.

PORCHAT, Oswaldo. Verdade, realismo e ceticismo. Discurso, São Paulo, v. 25, p.7-67, jun. 1995

_________________. A NOÇÃO DE PHAINÓMENON EM SEXTO EMPÍRICO. Analytica, Rio de Janeiro, v. 17, n. 2, p.293-323, 2013.

SEXTO EMPÍRICO. Complete Works of, 4 vols. Trad. R.G. Bury. In: Loeb classical Library. Harvard: Harvard University Press, 1976.

Published
21-09-2017