A NÃO NEUTRALIDADE DA CIÊNCIA-TECNOLOGIA NO CONTEXTO EDUCA-CIONAL BRASILEIRO

  • Débora Larissa Brum Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Cerro Largo
  • Kátia Slodkowski Clerici
  • Rosemar Ayres Santos
Palavras-chave: Educação em Ciências, Ciência-Tecnologia-Sociedade, Currículo.

Resumo

1 Introdução

Atualmente, as transformações ocorridas devido aos avanços científico-tecnológicos adentram nosso cotidiano, refletindo em mudanças sociais, políticas e econômicas. Tais avanços configuram-se em um desafio para âmbito escolar, pois resultam em uma necessidade de mudanças no processo educacional, bem como, de configurações curriculares.

Na Educação em Ciências/Física, os estudantes possuem dificuldades de compreensão dos conceitos abordados o que, possivelmente, está relacionado, em grande parcela, aos modelos de ensino descontextualizados da realidade social na qual estes se encontram inseridos. Nesse sentido, a literatura propõe reformas curriculares na Educação em Ciências como, por exemplo, através da Abordagem Temática relacionada às articulações entre os referenciais Freire e Ciência-Tecnologia-Sociedade (CTS) (Auler, 2002).

O movimento CTS surgiu em meados do século XX, em países do hemisfério norte, reivindicando um redirecionamento científico-tecnológico, contrapondo-se a ideia de neutralidade da Ciência-Tecnologia (CT), pois se constatou que os avanços tecnológicos não estavam conduzindo linearmente e automaticamente para o bem-estar social, reivindicando-se, assim, mais participação social nos processos decisórios que envolviam CT.

Já, no campo educacional brasileiro, mais especificamente, na Educação em Ciências as discussões iniciaram em na década de 90, objetivando um ensino que contemple uma leitura crítica do mundo contemporâneo. Assim, práticas educativas de enfoque CTS priorizam o ensino dos conceitos através de temáticas sociais que pertençam ao mundo vivido pelos estudantes.

Em face do exposto, investigamos: Como a não neutralidade da Ciência-Tecnologia tem-se apresentado nas práticas educativas, que tem pautado as edições dos periódicos Investigações em Ensino de Ciências e Ciência e Educação?

 

2 Objetivo

Objetivamos: 1) analisar o direcionamento dado às práticas educativas que problematizam a não neutralidade da CT, na Educação Básica; 2) identificar e caracterizar a abordagem dada, à dimensão da não neutralidade da CT, nas configurações curriculares, nas práticas educativas em periódicos da área da Educação em Ciências, correspondentes ao contexto brasileiro.

 

3 Metodologia

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, tendo a Análise Textual Discursiva como metodologia de análise, a qual é constituída de três etapas: unitarização em que os artigos são separados em unidades de significado; categorização na qual é feita a articulação entre as unidades de significado e a comunicação onde é gerado um metatexto a partir dessas unidades (MORAES, GALIAZZI, 2007).

Já, o corpus foi constituído de artigos presentes em dois periódicos da área de Educação em Ciências: a) Ciência e Educação; b) Investigações em Ensino de Ciências. No qual foram selecionadas publicações que trataram de implementações na perspectiva CTS na Educação Básica. O critério de seleção adotado foi de conter no título, no resumo e/ou nas palavras-chave as palavras CTS e/ou CTSA.

4 Resultados e Discussão

Com a análise identificamos um conjunto propostas e metodologias de práticas educativas que objetivavam deslocar a tríade CTS de sua suposta neutralidade. Destas, identificamos duas tendências, uma vez que caracterizam as temáticas, encaminhamentos metodológicos e a estruturação da não neutralidade da CT em práticas educativas articuladas ao movimento CTS: 1) Silenciamentos sobre construções históricas. 2) Questões acerca da não neutralidade da CT.

Para a constituição da primeira tendência, compareceram 57 núcleos de sentido, tendo como característica os objetivos e os desafios da implementação de práticas educativas CTS nas escolas, tanto para os professores que, muitas vezes, não estão devidamente preparados para educar em novas bases, devido a fatores como o de que toda mudança gera insegurança, como para os estudantes que não estão habituados a refletir e manifestar-se criticamente acerca de uma problemática social, o que pode acarretar uma visão reducionista, apenas dos impactos do desenvolvimento da CT na sociedade.

Já na segunda tendência, identificamos 48 núcleos de sentido. Constatamos que uma parcela das práticas realizadas na Educação Básica aponta para a superação parcial dos mitos,  como iniciativas nas quais estudantes realizam pesquisa sobre aparelhos científico-tecnológicos na abordagem CTSA. Apesar de frágeis, às práticas efetivadas, obtiveram os resultados esperados, conseguiram trabalhar com temas que propiciaram a abordagem em CTS. Como em um núcleo de sentido identificado:

 

Dentre as atitudes e valores fomentados e construídos pelos alunos, emergiram, com maior ênfase, aqueles associados às atitudes questionadoras quanto à associação da lógica capitalista de produção de artefatos e materiais em larga escala, os desenvolvimentos tecnológicos e os seus graves impactos no meio ambiente (A9, p. 15).

5 Conclusão

Com a análise do corpus identificamos a presença de silenciamentos (ROSA, 2014) sobre os mitos relacionados à CT (AULER, 2002) na implementação/discussão das práticas educativas nessa perspectiva, contudo há, também, a presença da sinalização de superação destes, ou seja, discussões com uma visão mais ampliada sobre a não neutralidade da CT (SANTOS, 2016).

Desse modo, percebemos que intervenções curriculares baseadas na perspectiva CTS poderão trazer mudanças para o cenário do Ensino Básico atual, mais especificamente, no Ensino de Ciências. Possibilitando novas abordagens, redução das dificuldades conceituais dos estudantes, renovação da prática docente e também através de discussões e reflexões acerca do desenvolvimento científico-tecnológico, a formação de cidadãos aptos para tomar decisões e intervir nos problemas do contexto social no qual se encontram inseridos.

Referências

AULER, D. Interações entre Ciência-Tecnologia-Sociedade no Contexto da Formação de Professores de Ciências. 2002. Tese (Doutorado em Educação), Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.

MORAES, R.; GALIAZZI, M. C. Análise Textual Discursiva. Ijuí: Ed. Unijuí, 2007.

ROSA, S. E. Não neutralidade da Ciência-Tecnologia: problematizando silenciamentos em práticas educativas relacionadas a CTS. 2014. Dissertação (Mestrado em Educação), Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2014.

SANTOS, R. A. Busca de uma participação social para além da avaliação de impactos da Ciência-Tecnologia na Sociedade: Sinalizações de Práticas Educativas CTS. 2016. Tese (Doutorado em Educação), Centro de Educação, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2016.

Publicado
22-09-2016