Puzzles lógicos e os limites da lógica formal

  • Tailon Lucas Testa Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Chapecó
  • Newton Peron

Resumo

1 Introdução

Uma vasta produção de puzzles lógicos pode ser encontrada nas revistas especializadas na área. Alguns deles, entretanto, não exigem um domínio técnico avançado de lógica e podem ser compreendidos até por estudantes do ensino médio. Sobre o tema, cabe aqui destacar o trabalho do lógico matemático americano Raymond Smullyan. Além de resultados extremamente técnicos em Lógica de Primeira Ordem, Smullyan produziu uma vasta bibliografia de puzzles lógicos com múltiplos intuitos: divulgar problemas lógicos complexos em uma linguagem acessível e intuitiva, produzir exercícios lógicos aplicáveis no ensino médio e mostrar os limites da formalização no tratamento do raciocínio lógico. Concernente à bibliografia de Smullyan, três livros de puzzles lógicos foram traduzidos para o português: “Alice no país dos enigmas”, “Os enigmas de Sherazade” e “A dama ou o tigre?”. Além de se basear em clássicos da literatura universal, o autor aborda nesses livros problemas lógicos e jogos com números, meta-enigmas (enigmas sobre enigmas), exercícios de verdade/mentira, charadas e paradoxos.

 

2 Objetivo

Nossa pesquisa consistiu em, primeiramente, propor uma classificação de tais puzzles, considerando seus aspectos lógicos, metalógicos e matemáticos. Em seguida, selecionamos um grupo de puzzles lógicos de Os enigmas de Sherazade que poderiam ser expressos numa mesma linguagem. Inspirados em [Kolani, 1996], propusemos um fragmento do Cálculo Quantificacional Clássico (CQC), denominado A Lógica da Mentira. Tal proposta foi realizada por meio de (i) Acréscimo de novos operadores à linguagem de primeira ordem sem quantificadores; (ii) Acréscimo de novas regras para esses operadores. Tais etapas de nosso trabalho se encontram na Seção 1 e Seção 2, respectivamente. Finalmente, na Seção 3, deduzimos do grupo selecionado de puzzles a solução formal de acordo com a versão informal apresentada em [Smullayn, 2008]. Além disso, comentamos cada puzzle em detalhe, justificando nossa formalização.

3 Metodologia

1) Resolver os puzzles dos livros “Alice no país dos enigmas”, “Os enigmas de Sherazade” e “A dama ou o tigre?” de Raymond Smullyan de maneira informal. 2) Propor uma classificação de tais puzzles, considerando seus aspectos lógicos, metalógicos e matemáticos. 3) Selecionar grupo de puzzles lógicos que poderiam ser expressos numa mesma linguagem e mostrar a impossibilidade de serem formalizados em lógica de primeira ordem ou Cálculo Quantificacional Clássico (CQC). 4) Enriquecer O Cálculo Quantificacional Clássico (CQC) por meio de acréscimo de novos operadores epistêmicos à linguagem de primeira ordem.

4 Resultados e Discussão

Na tentativa elucidar a discussão peguemos um puzzle como exemplo o puzzle de número 50: “E Sherazade começou: ‘Chegou aos meus ouvidos, Auspicioso Monarca, que um dos famosos quarenta ladrões de Ali Baba´ entrou na joalheria de Abdul e roubou-lhe alguns diamantes. Felizmente, foram todos recuperados, e então ficou claro que o ladrão tinha sido ou Sabit, ou Salim ou Samir - todos pertencentes ao temido bando de Ali Babá. No julgamento, cada um dos três acusou um dos demais, mas Samir foi o único a mentir. Ele é necessariamente culpado?’ ‘Não necessariamente’, respondeu o rei. ‘Um homem inocente sempre pode mentir para acobertar um amigo.’ Samir é necessariamente culpado?”[1], a formalização das premissas daqui retiradas encontra-se no anexo I, visto que não temos espaço para apresenta-las aqui.  A resposta para este problema é a seguinte: “O simples fato de ter mentido não prova a culpa de Samir, o fato adicional de os outros dois terem dito a verdade sim, pois já que Sabit, dizendo a verdade, acusou um dos outros dois, ele só pode ser inocente, e o mesmo terá ocorrido com Salim. Portanto, Samir é de fato o culpado. ”[2].  A formalização e a discussão dela podem ser acompanhadas também pelo anexo I.

 

5 Conclusão:

Por fim, gostaríamos de comentar sobre o denominado Paradoxo do Mentiroso. Suponhamos que Jal diga “Eu sou mentiroso” (tal sentença está formalizada no anexo II). Isso, entretanto, nos leva claramente a uma contradição, como mostra a dedução do anexo II.

Isso significa que a Lógica da Mentira não soluciona o Paradoxo do Mentiroso. Não vemos, entretanto, problemas nisso. De fato, a sentença “Jal diz: ‘eu sou mentiroso’” nos parece tão contraditória quanto “Jal ó mentiroso e é sincero”. Isso não nos impede de raciocinar sobre a mentira e a verdade. Na verdade, parece-nos que é justamente a isso que Smullyan está chamando a atenção. Evidentemente, não temos nenhuma garantia que nossas regras são de fato consistentes. Poderíamos chegar a conclusão que, mais cedo ou mais tarde, nos depararíamos numa contradição independente do nosso conjunto de premissas. Para garantirmos que isso não é o caso, deveríamos fornecer uma semântica adequada para nossa lógica, porém reservamos essa tarefa para um trabalho futuro.


[1] [Smullyan, 2008], p. 35.

[2] [Smullayn, 2008], p. 150.

Publicado
16-10-2016