Mal-estar da história no Brasil?: Friedrich Nietzsche e a renovação do regime historiográfico oitocentista na Primeira República

  • Vicente da Silveira Detoni Universidade Federal da Fronteira Sul, campus Erechim

Resumo

Este trabalho se propõe a refletir sobre as especificidades da escrita da história brasileira na Primeira República, de modo especial sobre uma suposta "crise" ou "mal-estar" por qual estaria passando a historiografia neste período. Para tanto, a pesquisa pretendeu investigar os modos de recepção, os debate e apropriações da obra de F. Nietzsche pelos intelectuais brasileiros do período que se estende do fim do século XIX à primeira metade do século XX, por entender ter este filósofo produzido reflexões sobre ou contra a escrita da história que, de algum modo, contribuiram para um certo desprestígio por que passou a escrita da história convencionalmente produzida nas universidades europeias em um período contemporâneo ao do Brasil. Através da análise de textos da imprensa brasileira, de excertos de livros e manifestos, constatou-se a presença de um F. Nietzsche subterrâneo ao pensamento social e estético brasileiro da época, sendo que esta leitura da obra do filósofo teria se dado muito mais como a apropriação de um arsenal (uma “caixa de ferramentas”) para se pensar e refletir questões da atualidade daquele momento no Brasil, do que como de um objeto de estudo da filosofia. Uma análise mais detida do texto Como se deve escrever a história do Brasil, de José Oiticica, sugere, neste sentido, um contato do autor com a teoria das forças elaborada por F. Nietzsche, operacionalizada a fim de propor uma nova forma de se interpretar o passado nacional. Deste modo, defende-se a hipótese de que F. Nietzsche foi lido pelos brasileiros do período de modo a superar dilemas e ansiedades colocadas em questão pelo próprio desenvolvimento interno da historiografia brasileira, os lugares sociais que ela (não) ocupava, as tentativas de definições mais precisas das áreas do saber. Ao invés de se utilizarem de F. Nietzsche para conterem um excesso de conhecimento histórico que estaria paralisando a vida (intelectual), o filósofo alemão teria sido lido na Primeira República no Brasil de modo a fundamentar mais e novas narrativas sobre o passado nacional, e, sobretudo, um novo regime historiográfico.
Publicado
16-10-2016