PROCESSAMENTO DE SENTENÇAS RELATIVAS AMBÍGUAS NO PORTUGUÊS BRASILEIRO

  • Alice Ribeiro Dionizio Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Chapecó
  • Aline Peixoto Gravina Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Chapecó
  • Ani Carla Marchesan Universidade Federal da Fronteira Sul Campus Chapecó
Palavras-chave: Late Closure, Early Closure, Sentenças Relativas Ambíguas, Garden Path.

Resumo

1 Introdução

Os estudos acerca dos processos de desambiguação no português brasileiro (PB) são ainda muito relevantes dentro da sintaxe e da própria psicolinguística. Como ainda se perpetuam muitas lacunas a serem preenchidas acerca das tendências seguidas, ou não, pelo PB, continua-se pesquisando. Nesse sentido, nossa pesquisa justifica-se por objetivar a reflexão acerca do fenômeno da desambiguação de sentenças estruturalmente ambíguas no PB, levando em consideração aspectos e influências da semântica nesse processo. Até o momento, ainda não conseguimos vislumbrar enfoque semelhante.

Dessa forma, este trabalho busca apresentar, de maneira sistêmica, os passos e resultados do projeto de Iniciação científica intitulado “Processamento de Sentenças Relativas Ambíguas no Português Brasileiro”, financiado pelo PRO-ICT/UFFS e aprovado pelo edital 281/2015.

2 Objetivo

Tenciona-se apresentar os resultados obtidos a partir da pesquisa realizada entre agosto de 2015 e julho de 2016.

3 Metodologia

O grupo de informantes da pesquisa foi composto por 82 pessoas com idades entre 18 e 55 anos, sendo que desses, 50 possuíam ensino médio completo e outros 32, ensino superior completo, consultados no período compreendido entre 02 a 16 de dezembro de 2015. Os envolvidos foram convidados por via eletrônica para responderem a um questionário com perguntas “abertas”, escrevendo as respostas diretamente em lacunas em branco, segundo seus julgamentos. Além disso, tomou-se o cuidado de solicitar a permissão dos participantes na utilização dos dados produzidos por eles nessa a pesquisa, logo, todos os participantes consentiram   que suas respostas fossem utilizadas para fins acadêmicos. Ressaltamos que todas as informações pessoais dos informantes foram mantidas em sigilo e não foram divulgadas A realização dessa pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal da Fronteira Sul na Plataforma Brasil.

O experimento foi composto por vinte e duas sentenças, sendo que sete desse grupo eram sentenças-distratoras e quinze orações-alvo. Deste modo, buscou-se intercalar as sentenças-alvo com as distratoras como forma de dificultar a “descoberta” dos objetivos do experimento por parte dos participantes.

 

4 Resultados e Discussão

A análise dos resultados se deu a partir de dois eixos: i) traços [+/- humano], [ +/- animado] do verbo e ii) relações entre tamanho da oração relativa e questões semânticas estabelecidas entre os componentes da sentença. No entanto, no decorrer das análises, pudemos perceber que existem outros desdobramentos para posteriores estudos e aprofundamentos.

É importante ressaltar que Finger e Zimmer (2005) defendem que em sentenças relativas curtas, terminadas depois do verbo, há uma preferência no PB pelo sintagma mais encaixado, ou Late Closure (doravante LC), enquanto em orações relativas longas, com mais sintagmas depois do verbo, haveria uma preferência pelo sintagma menos encaixado, ou Early Closure (doravante EC). No entanto, alguns de nossos resultados apontaram para uma situação oposta: aspectos semânticos se sobressaíram a essas relações de LC e EC.

 

Tabela 1– Sentença [1]

[1] João viu o cachorro do menino que nadava muito bem.

Cachorro (SN1)

24/82

29.27%

Menino (SN2)

56/82

68.29%

Outros

02/82

2.44

Fonte: a autora, 2016.

 

A oração relativa encaixada “que nadava muito bem” se enquadra em uma oração relativa longa, uma vez que não termina no verbo da sentença, critério estabelecido por Finger e Zimmer (2002). Em seus estudos, essas autoras apontam para uma preferência pelo sintagma mais alto, ou menos encaixado, “cachorro”.

Entretanto, de um total de oitenta e dois participantes, cinquenta seis (representando uma porcentagem de 70%) optaram pelo sintagma mais baixo, ou seja, dizer que “o menino que nadava muito bem”. Dessa forma, nossos resultados apontam indícios para dizer que o verbo “nadar” teria o traço [+ humano] mais forte que o traço [- humano], quando apresentados em uma sentença ambígua.

 

5 Conclusão

Em suma, nosso experimento foi construído a partir da hipótese de que alguns aspectos semânticos, como os traços do verbo [+/-animado] [+/-humano], e características dos antecedentes que o acompanham, bem como extensão da sentença e sintagmas que indiquem lugar ou situações mais relacionáveis com um ou outro antecedente (“de sua gaiola” “na piscina do clube” etc) poderiam de alguma forma influenciar no processamento das sentenças relativas ambíguas no PB.

Diante dos resultados apresentados e analisados acreditamos que é possível ainda muitos desdobramentos referentes às questões de processamento e interfaces sintáticas/semânticas. Além disso, acreditamos ser interessante a realização de uma pesquisa mais aprofundada com verbos como ensinar e atender, que conotam certo fazer profissional, já que nossos resultados apresentaram para a tendência de “quebra” na interpretação padrão dos informantes, quando apresentados a determinados tipos de verbos e relacionados a determinados sintagmas. Ou seja, independentemente da posição sintática que ocupam os sintagmas, se EC ou LC, e independentemente do tamanho da sentença relativa, não haverá “Garden Path” se sintagmas com referenciais especificados e relacionados diretamente com o verbo estiverem presentes na sentença.

Finalmente, concluímos este projeto de iniciação científica pautando que as orações utilizadas em nosso experimento são, de fato, estruturalmente ambíguas. No entanto, essa ambiguidade pode não ter sido identificada no processamento das mesmas pelos informantes. Dito de outra forma, ainda que as sentenças possuam em sua estrutura uma ambiguidade visível, essa pode não ter sido identificada pelos informantes.

Referências

CUETOS, F. & MITCHELL, D.C. Cross Linguistic differences in parsing: Restrictions on the use of the Late Closure strategy in Spanish. Cognition, v.30, 1988, p.73-105.

FINGER, Ingird; ZIMMER, Márcia C. A preferência de interpretação de orações relativas curtas e longas no português brasileiro. In: MAIA, Marcus; FINGER, Ingrid. Processamento da linguagem: Série Investigações em Psicolingüística GT de Psicolingüística da ANPOLL. Pelotas: Educat, 2005. p.111-129.

RIBEIRO, Antonio João Carvalho. Late closure em parsgin no português do Brasil. In: MAIA, Marcus; FINGER, Ingrid. Processamento da linguagem: Série Investigações em Psicolingüística GT de Psicolingüística da ANPOLL. Pelotas: Educat, 2005. p. 51-69.

Publicado
19-09-2016