EDUCAÇÃO NO CENTRO CÍVICO CRUZ E SOUZA (LAGES-SC):
NARRATIVAS DO PROFESSOR SEBASTIÃO ATAIDE
Resumo
1 Introdução
Sebastião Ataide, homem negro, nascido em 29 de julho de 1923, às margens do rio Pelotas, na fazenda Santa Cecília município de Lages – SC. Filho de Maria dos Prazeres Moreira, batizado com sobrenome Ataíde, foi entregue para ser criado pelos proprietários da fazenda - Francisco Vicente de Athayde Júnior e Cecília Furtado de Athayde. Realizou o curso primário no Grupo escolar Vidal Ramos, o ensino fundamental e o segundo grau (equivalente ao Ensino Médio) no Instituto de Educação de Lages onde formou-se normalista, habilitando para o magistério nas séries iniciais. Foi professor no quartel militar, na escola básica Maria Quitéria e na escola Técnica do Comércio de Lages. Foi professor de Português, Desenho e Educação Artística. Com 58 anos ingressou no curso de Ciências Sociais da Uniplac (Lages) e concluiu. Sebastião publicou a obra ‘O negro no planalto lageano’ no centenário da abolição, em 13 de maio de 1988. A obra tem somente uma edição datilografada, com 168 páginas, ela possui cinco referências bibliográficas, sem citações diretas e indiretas, indicando que é uma narrativa onde suas vivências e memórias constroem a escrita - escrevivências.
O ‘O negro no planalto lageano’ está dividido em duas partes, a primeira em que Sebastião Ataíde escreve sobre a escravização e a presença e participação do negro em Lages; e a segunda sobre o pós-abolição com ênfase no Clube Negro Cruz e Souza e as ações deste clube para visibilidade das pessoas negras. Sebastião Ataide é um homem negro localizado no pós abolição, e assim, como em outros lugares do Brasil, as pessoas negras construíram espaços de sociabilidade e resistências, assim ocorreu em Lages; “Fundado em 1918, trinta anos após a abolição da escravatura, foi inaugurado em 22 de setembro, figura como a segunda sociedade em Lages e a primeira em Santa Catarina, organizada por homens de cor” (Ataíde, 1988, p.73). A partir da década de 1940 Sebastião Ataide passou a integrar o Clube negro e participou até as décadas finais do século XX. Como professor e militante atuou na comunidade lageana e nos lega uma obra ímpar para pensarmos sobre educação não formal pelo olhar deste homem negro.
A partir das informações supracitadas, tendo em vista exclusão social dos negros, principalmente em termos de classe social, neste contexto perguntamos: como a escrita de um professor negro, a partir da análise interseccional (raça, classe e gênero), com ênfase na educação não-formal realizada pelo Clube negro Cruz e Souza possibilitou a inserção social das pessoas que lá participavam? Para percorrer este caminho analisamos as narrativas de Sebastião Ataide acerca dos processos educacionais não formais realizados no Clube negro Cruz e Souza (1918-1988) em Lages – SC, descritas em sua obra ‘o Negro no planalto lageano’, situando os corpos-territórios no contexto dos clubes negros ao longo do século XX.
2 Objetivos
Geral
Cabe pensar que os clubes negros no século XX tiveram papel na inserção social de pessoas negras através de suas práticas educacionais com vistas ao fortalecimento de identidades raciais sociais e subjetivas dos/as mesmos/as. Neste sentido o objetivo central é analisar as narrativas do professor negro Sebastião Ataide acerca dos processos educacionais não formais realizados no Centro Cívico Cruz e Souza em Lages – SC, e descritas em sua obra ‘o Negro no planalto lageano’, publicado em 1988, em perspectiva interseccional - raça, classe e gênero.
Específicos
Conhecer a trajetória de Sebastião Ataide e sua inserção como homem negro e professor no Centro Cívico negro Cruz e Souza no contexto do pós-abolição;
Apropriar-se da escrita da segunda parte da obra ‘O negro no planalto lageano’ a partir de seu autor, sua escrita sobre educação não formal no Clube negro.
Identificar as ações de educação não-formal descritas por Sebastião Ataide.
Analisar a escrita do professor Sebastião Ataide sobre os seguintes temas em sua obra: o Grêmio das Margaridas, o grêmio Treze de Maio, Personalidades negras e sua relação na formação social de pessoas negras que participaram nesta associação.
3 Metodologia
A pesquisa teve como fonte de pesquisa principal a obra: ATAIDE, Sebastião. O Negro no Planalto Lageano. Lages, 1988, p. 73-166, em diálogo com demais literaturas acerca dos conceitos de interseccionalidade, de educação não-formal e de associativismo negro.
Exploramos os complexos marcadores sociais enquanto categorias que se entrelaçam na escrita da mesma. A interseccionalidade aqui nos orienta para que a descrição e compreensão de que nossa pesquisa não seja em categorias isoladas. Esta perspectiva – interseccionalidade - formulada pelo feminismo negro não permite escapar da articulação entre as diferentes categorias socais estabelecidas nos termos/conceitos de raça, gênero e classe (Crenshaw 1991; Collins, 2000). A trajetória do autor e a escrita produzida está marcada por indicadores sociais: “Outros valores existem em nossa sociedade. Padres, enfermeiros, professores, funcionários públicos e particulares, ainda outros que são preteridos. Infelizmente a sociedade valoriza as aparências. Muitos pretos capacitados, desempenham funções de nível popular porque são renegados dado a sua cor” (Ataide, 1988, p. 125).
Buscamos por reflexões que negam a universalidade, a neutralidade e a objetividade da ciência e que (re)produziu estereótipos, anacronismos sobre minorias. Com aporte interseccional as estratégias voltam-se para a inclusão de pessoas marginalizadas como sujeitos produtores de saberes e conhecimentos. Aqui reside a alternativa que pode representar o Clube negro para educação não-formal.
Entendemos ser está uma prática de pesquisa de escuta e diálogo com a escrita do professor e intelectual negro Sebastião Ataide, cuja gênese é analisamos as relações de poder e preconizamos por justiça social e epistêmica, evidenciando espaços de sociabilidade de pessoas negras em Lages- SC.
4 Resultados e Discussão
O principal objetivo deste trabalho foi mostrar como os Clubes Negros, em especial o Centro Cívico Cruz e Souza de Lages-SC, tiveram importância fundamental na educação não formal e de resistência para as pessoas negras, utilizando-se como base a obra de Sebastião Ataide. O autor traz em sua narrativa aspectos importantes ligados à população negra, uma visão interna do Clube, que mostra como era a vivência diante de estruturas de exclusão, invisibilidade do negro e supervalorização de pessoas brancas.
Ao trazer a obra de Sebastião Ataíde para entender os processos educacionais não formais realizados, rememoramos sua trajetória como professor, pesquisador e escritor. Atai-de traz em seu livro muitas personalidades negras que foram importantes para a cidade de Lages, homens e mulheres que conseguiram destaque de diferentes formas dentro do Clube Negro e na sociedade lageana como um todo.
Percebe-se, a partir, da escrita de Sebastião Ataide que o Clube Cruz e Souza teve pa-pel para além de representatividade enquanto associativismo negro, a função de inserir o debate educacional, quer seja, dialogar sobre a vida de pessoas negras e seu lugar na socie-dade, com destaque em agremiações femininas. Portanto, ao analisar a fonte desta pesquisa é imprescindível olhar para homens e mulheres negras de Lages pela intersecção.
Assim, foi possível compreender a relação de comunidade implementada através do Centro Cívico Cruz e Souza, um importante espaço de luta e resistência e que permanece ativo no tempo presente.
5 Conclusão
Analisamos as narrativas de Sebastião Ataide acerca dos processos educacionais não formais realizados no Centro Cívico Cruz e Souza em Lages – SC, e descritas em sua obra ‘o Negro no planalto lageano’, publicado em 1988, em perspectiva interseccional - raça, classe e gênero, através do Grêmio das Margaridas, o do Grêmio Treze de Maio.
A relevância desta pesquisa consiste em saber que são sujeitos que não andavam sozi-nhos, suas famílias, relações interpessoais, laços de solidariedade, processos educacionais foram e são lugares que positivam, dão visibilidade às suas existências.
Cabe enfatizar que ler Sebastião Ataide nos fortalecemos para eu as lutas sociais do passado não sejam esquecidas, e de que é em comunidade onde as possibilidades de pensar as vivências e os ensinamentos ocorrem.
Referências Bibliográficas
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Palavras-chave: Sebastião Ataide; Educação não formal; Clube negro; Interseccionalidade.
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