DESEMPENHO PRODUTIVO E COMPOSIÇÃO CORPORAL DE JUVENIS DE TILÁPIA DO NILO ALIMENTADOS COM FEIJÃO, Phaseolus vulgaris L., EXTRUSADO E IN NATURA

  • Thais Epifanio Roza Universidade Federal Fronteira Sul
  • HARRI ERICH SANTOS SCHMIDT
  • NICOLAS ANTONIO TEIXEIRA DE PAULA
  • STEPHANIE SILVA SOUZA
  • MAUDE REGINA BORBA
Palavras-chave: Piscicultura, dieta orgânica, fonte proteica alternativa, crescimento, composição corporal.

Resumo

1 INTRODUÇÃO A aquicultura é o setor de produção de alimentos de origem animal que mais cresce mundialmente, estando diretamente relacionada com a segurança alimentar, geração de empregos e ganhos socioeconômicos (FAO, 2020). O desenvolvimento da piscicultura de base agroecológica representa alternativa econômica viável para agricultores familiares, a partir do uso sustentável dos recursos naturais. De modo geral, em piscicultura os gastos com alimentação representam a maior parte dos custos operacionais totais da atividade (RANA & HASAN, 2009) e a proteína, por sua vez, é o nutriente mais caro de dietas aquícolas (PRABU et al., 2017). Assim, se faz necessário a busca por fontes alternativas de proteína de qualidade, mais baratas e, preferencialmente, localmente abundantes (AYADI et al., 2012). Neste contexto, as leguminosas, com destaque para o feijão, são consideradas potenciais fontes vegetais para uso em dietas para aquicultura. A produção excedente de feijão nas propriedades rurais, bem como subprodutos gerados no seu processamento para consumo humano, como grãos amassados, quebrados ou fora do tamanho padrão para comercialização, que seriam descartados, podem ser utilizados como matéria-prima na formulação de dietas para peixes (COSTA et al., 2008). Para tanto, é importante a avaliação deste ingrediente na alimentação de diferentes espécies de interesse aquícola, assim como de meios para aumentar o seu aproveitamento (AZEVEDO et al., 2017). 4 Doutora em Aquicultura, docente UFFS, campus Laranjeiras do Sul, Orientador. 3 Acadêmicos do curso de Eng. de Aquicultura, Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS, campus Laranjeiras do Sul, 2 Grupo de Pesquisa: Agroecologia 1 Bolsista de iniciação científica, acadêmica do curso de Eng. de Aquicultura, Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS, campus Laranjeiras do Sul, contato: thaisroza97@gmail.com 2 OBJETIVOS Avaliar o efeito da inclusão de feijão Phaseolus vulgaris L. resíduo, in natura e extrusado, como ingrediente alternativo em dieta orgânica para juvenis de tilápia do Nilo, Oreochromis niloticus. 3 METODOLOGIA O presente estudo foi desenvolvido nas instalações dos laboratórios de Piscicultura e de Nutrição de Organismos Aquáticos da Universidade Federal da Fronteira Sul, campus Laranjeiras do Sul – PR. O experimento foi conduzido em um delineamento inteiramente ao acaso, com cinco tratamentos e três repetições. Cinco dietas orgânicas isoproteicas (36% PB) e isoenergéticas (3200 Kcal ED/kg) peletizadas, tiveram na sua composição basal farinha de peixe e farelo de soja como ingredientes proteicos, milho, trigo e óleo de soja, de procedência orgânica certificada (Gebana Brasil) como ingredientes energéticos, sal (NaCl), fosfato bicálcico e premix mineral/vitamínico. Os tratamentos avaliados foram níveis de inclusão na dieta de feijão, P. vulgaris L., extrusado e in natura: 0, 10 e 20% (controle, 10FE, 10FN, 20FE e 20FN, respectivamente) em substituição aos ingredientes proteicos da dieta basal, principalmente a farinha de peixe. Foi utilizado feijão resíduo de processamento (grãos amassados, quebrados ou fora do tamanho padrão para comercialização), obtido de planta processadora da região. Visando diminuir os fatores antinutricionais e aumentar a digestibilidade, uma parte deste ingrediente foi moído e extrusado previamente à sua utilização, enquanto a outra parte apenas foi moída e incorporada in natura. As dietas foram preparadas misturando-se inicialmente os ingredientes secos, adicionando-se em seguida o óleo e água. A massa homogênea resultante foi passada em um equipamento moedor de carne, através de uma matriz com orifício de 3mm, os filamentos produzidos levados para secagem em estufa a 55ºC e, posteriormente, armazenadas a -20ºC até sua utilização. Os juvenis de tilápia do Nilo, O. niloticus, (0,24±0,05 g) foram obtidos de piscicultura comercial. Cada dieta foi aleatoriamente distribuída a grupos de 20 peixes estocados em 15 tanques de polietileno (60 L de volume útil) conectados a um sistema de recirculação de água aquecida (26°C) e salinizada (3‰), com aeração individual. Após cinco dias de adaptação às condições experimentais, os peixes foram alimentados duas vezes ao dia (8h e 17h) até a saciedade aparente durante 30 dias. Ao final do período de alimentação foram anestesiados (1 mL de óleo de cravo/10 L de água), contados e pesados para avaliação da sobrevivência e variáveis de desempenho: - Sobrevivência (S) = [número final de peixes/número inicial de peixes] × 100; - Peso final (g); - Ganho em peso (g) — GP = [peso final – peso inicial]; - Taxa de crescimento específico — TCE (%) = 100 x [(ln peso final – ln peso inicial)/dias de experimento]; - Consumo alimentar diário (%peso corporal/dia) (CD) = [consumo matéria seca (MS)/(peso final + peso inicial/2)]/tempo em dias x 100; - Conversão alimentar — CA = consumo de ração (MS)/ganho em peso. Amostras de 20 tilápias do estoque inicial e 9 tilápias por tratamento dietético (3 peixes/tanque) foram aleatoriamente coletadas no início e final do período experimental, respectivamente, para determinação da composição corporal do peixe inteiro (AOAC, 2000). Para avaliação dos resultados obtidos, os dados foram previamente testados quanto a normalidade e homoscedasticidade, sendo então aplicada análise de variância de um fator e teste de Tukey para separação de médias (P<0,05). Os procedimentos adotados nesta pesquisa estiveram em conformidade com a Comissão de Ética no Uso de Animais da UFFS (protocolo CEUA nº 8644191220). 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO O desempenho zootécnico e a sobrevivência dos juvenis de tilápia do Nilo foram significativamente influenciados pelos tratamentos dietéticos (Tabela 1). A inclusão de feijão in natura nas dietas resultou em piora de todas as variáveis analisadas (P<0,05). Já os resultados obtidos com as dietas contendo feijão extrusado não diferiram do controle (P>0,05), indicando que o processamento de extrusão provavelmente diminuiu os fatores antinutricionais deste alimento e melhorou a sua digestibilidade pelos peixes. O feijão cru ou mal processado possui baixa digestibilidade, atribuída à atividade de inibidores de proteases, que diminuem a atividade das enzimas digestivas pela presença de substâncias tóxicas e fatores antinutricionais, como antitripsina e lectina (MESQUITA, 2007). O tratamento térmico, por sua vez, como a extrusão, é um método indicado para a redução ou inativação de substâncias indesejáveis nos alimentos, além de melhorar a digestibilidade (DREW et al., 2007 BENEVIDES et al., 2011). Tabela 1 - Desempenho zootécnico (média ± desvio padrão) de juvenis de tilápia do Nilo alimentados com dietas contendo diferentes concentrações de feijão resíduo, in natura e extrusado, por 30 dias. Dietas1 Variáveis2 Controle NAT10 NAT20 EXT10 EXT20 Valor de P Peso inicial (g) 0,24±0,01 0,23±0,01 0,24±0,00 0,24±0,01 0,23±0,01 0,5120 Peso final (g) 2,57±0,26 a 1,38±0,08 b 1,33±0,12 b 2,67±0,18 a 2,49±0,22 a < 0,0001 Ganho em peso (g/peixe) 2,33±0,26 a 1,15±0,08 b 1,09±0,12 b 2,43±0,17 a 2,26±0,22 a < 0,0001 Taxa de crescimento específico (%) 7,94±0,41 a 5,93±0,12 b 5,70±0,08 b 8,07±0,16 a 7,89±0,03 a < 0,0001 Consumo alim. diário (%peso corporal/dia) 5,82±0,40 a 9,52±2,45 b 12,03±2,24 b 6,12±0,33 a 5,90±0,46 a 0,0010 Conversão alimentar 1,05±0,06 b 2,00±0,50 a 2,60±0,40 a 1,10±0,07 b 1,07±0,10 b < 0,0001 Sobrevivência (%) 77,2±8,0 ab 52,6±18,2 b 47,4±9,1 b 85,9±6,1 a 96,5±3,0 a < 0,0001 1Controle – sem inclusão de feijão; NAT10 - 10% inclusão feijão in natura; NAT20 - 20% inclusão feijão in natura; EXT10- 10% inclusão feijão extrusado; EXT20 - 20% inclusão feijão extrusado. 2Médias com letras diferentes sobrescritas na mesma linha são significativamente diferentes pelo teste de Tukey (P<0,05). Em relação a composição corporal dos peixes, os teores de umidade e proteína bruta, assim como o índice hepatossomático, não foram influenciados pelos tratamentos dietéticos (P>0,05) (Tabela 2). Porém, os juvenis de tilápia do Nilo alimentados com as dietas contendo feijão in natura apresentaram os teores mais baixos de lipídios e mais altos de cinzas (P<0,05) em comparação aos peixes alimentados com as demais dietas, resultado este coerente com os de desempenho, tendo em vista que nos tratamentos NAT10 e NAT20 os peixes apresentaram os menores pesos ao final de 30 dias de experimento. Assim, por estarem mais magros, proporcionalmente continham em sua composição corporal menos lipídio e mais matéria mineral. Menores teores de lipídio e maiores de cinzas também foram verificados em juvenis de O. niloticus de tamanho inicial maior (1,3 g) do que no presente estudo, alimentados por 66 dias com dietas peletizadas contendo 15% de farinha de feijão resíduo (FERREIRA et al., 2020). Tabela 2 – Composição corporal do peixe inteiro (base úmida) e índice hepatossomático (média ± desvio padrão) de juvenis de tilápia do Nilo alimentados com dietas contendo diferentes concentrações de feijão resíduo, in natura e extrusado, por 30 dias. Dietas1 Variáveis2 (%) Controle NAT10 NAT20 EXT10 EXT20 Valor de P Umidade 79,17±0,27 78,11±1,19 77,96±1,38 79,04±0,73 78,30±0,41 0,402 Proteína 14,99±0,51 15,66±1,47 15,03±0,12 14,10±0,38 15,69±1,02 0,216 Lipídio 3,74±0,40a 2,71±0,41bc 2,40±0,04c 4,29±0,37a 3,44±0,45ab 0,001 Cinzas 2,98±0,27abc 3,43±0,23ab 3,47±0,09a 2,84±0,13c 2,95±0,17bc 0,005 IH3 1,55±0,57 1,46±0,40 1,55±0,42 1,41±0,32 1,30±0,34 0,941 1Controle – sem inclusão de feijão; NAT10 - 10% inclusão feijão in natura; NAT20 - 20% inclusão feijão in natura; EXT10- 10% inclusão feijão extrusado; EXT20 - 20% inclusão feijão extrusado. 2Médias com letras diferentes sobrescritas na mesma linha são significativamente diferentes pelo teste de Tukey (P<0,05). 2 Índice hepatossomático. 5 CONCLUSÃO A inclusão de 10% ou mais de farinha de feijão in natura na dieta é prejudicial para juvenis de tilápia do Nilo em fase inicial de desenvolvimento (0,24 g). Todavia, o processo de extrusão da farinha de feijão resulta em melhora no seu aproveitamento pelos peixes, possibilitando a inclusão na dieta de até 20% sem prejuízos no desempenho e sobrevivência de juvenis de O. niloticus em 30 dias. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AOAC – Association of Offcial Analytical Chemists. Official methods of analysis. 16th ed. Gaithersburg: AOAC, 2000, 1141p. AYADI, F. Y.; ROSENTRATER, K. A.; MUTHUKUMARAPPAN, K. Alternative Protein Sources for Aquaculture Feeds. J. Aquacult. Feed Sci. Nutr., 4: 1-26, 2012. AZEVEDO, K. S. P.; SANTOS, M. C.; CHUNG, S.; BICUDO, A. J. A. Farinha do subproduto de feijão Phaseolus vulgaris em dietas para juvenis de tilápia do Nilo. Bol. Ind. Anim., v.74, n.2, p.79-85, 2017. BENEVIDES, C. M. J.; SOUZA, M. V.; SOUZA, R. D. B.; LOPES, M. V. Fatores antinutricionais em alimentos: revisão. Segurança Alimentar e Nutricional, Campinas, 18(2): 67-79, 2011. COSTA, D. P.; MACHADO, L. C.; ALVARENGA, R. J. 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A short review and critic of methodology used in fish growth and nutrition studies. J. Fish Biol., v. 23, p. 685–703. MESQUITA, F. R.; ANGELITA DUARTE CORRÊA, A. D.; ABREU, C. M. P.; LIMA, R. A. Z.; ABREU, A. F. B. Linhagens de feijão (Phaseolus vulgaris L.): composição química e digestibilidade proteica. Ciênc. agrotec., vol.31, n.4, p. 1114-1121, 2007. PRABU, E.; FELIX, S.; FELIX, N.; AHILAN, B.; RUBY, P. An overview on significance of fish nutrition in aquaculture industry. International Journal of Fisheries and Aquatic Studies, 5(6), p. 349-355, 2017. RANA, K.J.; HASAN, M.R. Impact of rising feed ingredient prices on aquafeeds and aquaculture production. FAO Fisheries and Aquaculture Technical Paper. No. 541. Rome, FAO. 2009. 63p.

Publicado
12-10-2021