CARACTERIZAÇÃO DOS CASOS DE VIOLÊNCIA AUTOPROVOCADA EM MUNICÍPIOS DA 6ª COORDENADORIA REGIONAL DE SAÚDE

  • Giovana Bonessoni Felizari UFFS PF
  • Guilherme Assoni Gomes UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL
  • Luis Felipe Chaga Maronezi UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL
  • Jeanice de Freitas Fernandes
  • Ivana Loraine Lindemann
Palavras-chave: Sistema de Informação em Saúde, Doenças e Agravos de Notificação Compulsória, Violência

Resumo

 

1 Introdução

            Violência autoprovocada é entendida como ideação suicida, autoagressões, tentativas de suicídio e suicídio (WHO, 2014). É importante destacar que nem toda violência autoprovocada é caracterizada como uma tentativa de suicídio, pois podem ser uma forma de aliviar sofrimentos, sem que o objetivo seja pôr fim à vida. Todos os casos de violência autoprovocada são de notificação compulsória imediata, conforme Portaria 204/2016 do Ministério da Saúde (BRASIL, 2019). A violência autoprovocada é um fenômeno complexo e multicausal, sendo os fatores pessoais, psicológicos, biológicos, culturais, ambientais e a desigualdade social, determinantes e condicionantes dessa violência contra si (WHO, 2014).

            A ideação suicida compreende os casos em que há pensamento de cunho suicida e desejo de morte, mas não há um plano de ação e é mais prevalente que as tentativas de suicídio e que os suicídios completos. Já a autoagressão é qualquer comportamento intencional, direcionado a si mesmo, que causa destruição imediata de tecidos corporais, podendo ser manifestada numa variedade de formas. As tentativas de suicídio por sua vez, incluem um ato autoinfligido executado com a intenção de morte, no entanto, sem o desenlace fatal e, o suicídio completo é o ato deliberado de tirar a própria vida, executado pelo próprio indivíduo, usando um meio que acredita ser efetivo (BRASIL, 2019).

            Violência autoprovocada e suicídio são situações de emergência de saúde pública. A cada ano, cerca de 800 mil pessoas tiram a própria vida e um número ainda maior de indivíduos tenta suicídio. Cada suicídio é uma tragédia que afeta famílias, comunidades e países inteiros e tem efeitos duradouros sobre as pessoas deixadas para trás (WHO, 2014). O Brasil ocupa a 8ª posição em números absolutos de suicídio, registrando 11 mil mortes ao ano. Em relação à violência autoprovocada, de 2011 a 2018 foram notificados 339.730 casos no país, dos quais 45% ocorreram na faixa etária de 15 a 29 anos. No Rio Grande do Sul as taxas de violência autoprovocada por 100 mil habitantes tiveram um crescimento de 18,6 em 2011 para 81,7 em 2018. Em ambos os estudos, nacional e estadual,prevaleceram as mulheres jovens (BRASIL, 2019; SECRETARIA ESTADUAL DE SAÚDE DO RS, 2018).

            Diante desse contexto, sendo a violência autoprovocada uma emergência de saúde pública, justifica-se a necessidade de estudos que contribuirão para busca ativa, atendimento, orientação e cuidado dessa população, reformulando estratégias de saúde que visem à redução desse agravo.

2 Objetivos

          Caracterizar os casos de violência autoprovocada nos municípios de abrangência da 6ª Coordenadoria Regional de Saúde.

3 Metodologia

        Trata-se de um estudo observacional, do tipo ecológico, cuja população compreende os casos de violência autoprovocada notificados pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde – (CEVS) através dos dados registrados do Sistema de Informações sobre Agravos de Notificação (SINAN), via Ficha de Notificação de Violência Interpessoal e Autoprovocada, sendo a amostra constituída por todos os eventos registrados de 01/01/2013 a 31/12/2017 na região delimitada.

          Os dados foram solicitados ao Departamento de Gestão da Tecnologia da Informação - Núcleo de Informação em Saúde (NIS), da Secretaria Estadual de Saúde, em formato de planilha eletrônica, com supressão do nome do indivíduo, do endereço de residência e do endereço do local de ocorrência, sendo mantido apenas o município de residência. As variáveis analisadas foram: ano da notificação, idade, sexo, cor da pele, situação conjugal, escolaridade, zona de residência, ocupação, zona de ocorrência, local de ocorrência, motivo da violência e suspeita de uso de álcool, por meio de estatística descritiva.

          Após ciência e concordância da Secretaria Estadual de Saúde, o protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFFS (instituição proponente) e da Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul (instituição co-participante), atendendo à Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

 

4 Resultados e Discussão

         Na 6ª Coordenadoria Regional de Saúde, que tem como município sede Passo Fundo, de 2013 a 2017 ocorreu um total de 2.190 notificações compulsórias de violência autoprovocada conforme representado na Figura 1. Destaca-se que no período analisado houve um crescimento de cerca de 60% dos casos, possivelmente devido à capacitação da rede de serviço, o que aumenta o número de notificações. As características da amostra estão apresentadas na Tabela 1.  

ivana.png

           Observou-se predomínio do sexo feminino (69,6%), idade ≤29 anos (48%) e cor de pele branca (86%). Esses resultados são consoantes ao Boletim Epidemiológico, dos casos notificados de violência autoprovocada e de óbitos por suicídio, entre jovens de 15 a 29 anos no Brasil, de 2011 a 2018. No período foram notificados 339.730 casos de violência autoprovocada, dos quais, 154.279 (45,4%) ocorreram na faixa etária de 15 a 29 anos, sendo 103.881 (67,3%) nas mulheres e a cor predominantemente relatada também foi branca (47,5%) (BRASIL, 2019). Merece destaque a constatação de que a vulnerabilidade feminina se revela como questão chave do perfil de vítimas de lesão autoprovocada, inclusive na comparação com as de outras formas de violência. Sabe-se que as mulheres tendem mais às tentativas de suicídio, enquanto os homens têm mais êxito para acabar com a própria vida.

          A tendência de maior frequência de problemas de saúde mental entre mulheres coloca-as em posição de maior risco ao comportamento suicida (BAHIA et al., 2017). Fatores como as diferenças fisiológicas e hormonais, baixo nível de escolaridade e de renda, questões socioculturais e de maneira geral, a maior procura pelos serviços de saúde, são fatores que afetam diretamente a prevalência de transtornos psiquiátricos em mulheres (GONÇALVES et al., 2018).

            Dos casos notificados de violência autoprovocada 86,5% residiam na zona urbana e a violência ocorreu na própria residência em 91,9%, concordante com a literatura e dados encontrados no estudo realizado por Bahia et al (2017), em que tanto para homens como para mulheres, o domicílio constituiu o local de ocorrência da maior parte das lesões (86,4%) e os indivíduos residiam majoritariamente na zona urbana (96,9%).

 projeto21.jpg

5 Conclusão

            A caracterização dos casos de violência autoprovocada nos municípios de abrangência da 6ª Coordenadoria Regional de Saúde do Rio Grande do Sul contribuiu para o reconhecimento da amplitude e da complexidade do fenômeno, que não difere da realidade estadual e nacional. Foi possível apresentar um panorama acerca do perfil dessa população, fornecendo informações para o estabelecimento de estratégias de saúde e prevenção da violência na região.

Referências

BAHIA, Camila Alves et al. Lesão autoprovocada em todos os ciclos da vida: perfil das vítimas em serviços de urgência e emergência de capitais do Brasil. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 22,n. 9, p. 2841-2850, set.  2017. Acesso em 14 maio 2020. DOI: 10.1590/1413-81232017229.12242017.

BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Perfil epidemiológico dos casos notificados de violência autoprovocada e óbitos por suicídio entre jovens de 15 a 29 anos no Brasil, 2011 a 2018. Boletim Epidemiológico, Brasil, v. 50 n. 24, 2019.

GONÇALVES, Angela Maria Corrêa et al. Prevalência de depressão e fatores associados em mulheres atendidas pela Estratégia de Saúde da Família. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, Rio de Janeiro ,  v. 67, n. 2, p. 101-109,  jun. 2018.  Acesso em 15 maio 2020. DOI:  https://doi.org/10.1590/0047-2085000000192.

SECRETARIA ESTADUAL DA SAÚDE DO RS (Rio Grande do Sul). Centro Estadual de Vigilância em Saúde. Boletim de Vigilância Epidemiológica de Suicídio e Tentativa de Suicídio. Boletim de Vigilância Suicídio, RS, 2018. Disponível em: www.cevs.rs.gov.br. Acesso em 23 abr. 2020.

WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Preventing suicide: A global imperative. Luxembourg: [s. n.], 2014. 89 p. ISBN 978 92 4 156477 9. Disponível em: https://www.who.int/publications-detail/preventing-suicide-a-global-imperative. Acesso em 27 abr. 2020.

inanciamento: Edital nº 459/GR/UFFS/2019.

Publicado
08-10-2020