DIAGNÓSTICO DA DIVERSIDADE E ABUNDÂNCIA DE PEIXES PRESENTES NA CALHA DO RIO PRINCIPAL

  • Marthoni Vinicius Massaro Universidade Federal da Fronteira Sul
  • David Augusto Reynalte Tataje

Resumen

Introdução/Justificativa

Entender os processos que afetam a estrutura das comunidades de peixes continua sendo um desafio importante (COSTA; FREITAS, 2015). Em grandes sistemas fluviais, a diversidade de peixes distribui-se heterogeneamente em diferentes gradientes espaço-temporais, incluindo dimensões longitudinais, laterais, altitudinais e sazonais. O principal canal de grandes rios é heterogêneo e altamente dinâmico, com variação relevante nos padrões de fluxo, profundidade, sedimento, conectividade e produção primária (MCCLUNEY et al., 2014). Esses canais funcionam como manchas de habitat para organismos reofílicos ou rotas de dispersão para peixes migratórios. No entanto, poucos ambientes aquáticos permanecem livres de distúrbios antrópicos, acarretando assim em modificações no funcionamento dos grandes rios, gerando efeitos negativos à biodiversidade aquática particularmente em espécies de peixes.

2 Objetivos

O objetivo deste estudo foi investigar a diversidade de peixes (riqueza, abundância e composição de espécies) ao longo de um extenso gradiente de rio (cerca de 450 km) no Médio rio Uruguai, a fim de subsidiar recursos que auxiliem no manejo e conservação da ictiofauna.

3 Material e Métodos/Metodologia

Um total de 22 saídas a campo em seis locais foram realizadas sazonalmente entre julho de 2018 e março de 2019 (Fig. 1). Diferentes artes de pesca foram empregadas para maximizar a captura de peixes, cobrindo habitats litorâneos, bentônicos e pelágicos (redes de emalhar,  espinhéis de fundo, rede de arrasto). Espécimes de comprovantes serão depositados na Coleção de Peixes da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Paraná, Brasil.

4 Resultados e Discussão

Um total de 2733 indivíduos foram capturados, distribuídos em 9 ordens, 25 famílias e 92 espécies. Characiformes e Siluriformes apresentaram maior número de espécies com respectivamente 40 e 34 espécies e consequentemente as famílias Characidae e Loricariidae foram as mais abundantes em número de espécies com 20 e 13 espécies. As espécies Iheringichthys labrosus (348 ind), Leporinus amae (328 ind) e Astyanax lacustris (283 ind) foram as espécies mais abundantes. Iheringichthys labrosus (90,9%), Astyanax lacustris (86,3%), Schizodon nasutus (72,7&) e Leporinus amae (72,7%) obtiveram maior frequência de ocorrencia, sendo capturadas na maioria das saídas a campo e em todos os locais. Vale destacar ainda a captura de 9 espécies migradoras, sendo duas delas espécies ameaçadas de extinção (Salminus brasiliensis e Pseudoplatystoma corruscans). Também coletamos uma espécie não nativa (Ictalurus punctatus). Os atributos de diversidade variaram ao longo dos trechos de amostragem, onde P4 apresentou maior riqueza de espécies (57) e também número de indivíduos (675). Os pontos P5 e P6 apresentaram os menores valores de dominancia (0,06). O ponto P5 e P6 também apresentaram os maiores valores de diversidade H (P5: 3,13 e P6: 3,12). O ponto P5 apresentou o maior valor de equitabilidade (0,84) (Tab. 1).

A composição da ictiofauna do médio Uruguai caracterizou-se pela predominância das ordens Characiformes e Siluriformes, o que tem sido evidenciado em outras bacias, sendo este um padrão para ambientes neotropicais de água doce. Vale ressaltar neste levantamento a captura de espécies migradoras de grande porte, estas espécies estão sofrendo forte pressão em diferentes bacias hidrográficas brasileiras, entretanto, parecem ainda encontrar no Médio Uruguai um ecossistema onde mantem seus estoques pesqueiros saudáveis apesar da pressão de pesca intensa que sofrem. A ausência de barramentos no curso desta sub-bacia pode ser o fator mais relevante para a ainda presença destas espécies, visto que atualmente estão praticamente desaparecidas de outros trechos da bacia do Prata tais como o alto rio Uruguai e o alto rio Paraná.

O estudo de grandes rios na Bacia do Prata tem se concentrado em segmentos afetados por represas, porque a maioria das bacias tem sido extensivamente perturbada pelo desenvolvimento de energia hidrelétrica. Em contraste, poucos estudos foram desenvolvidos em condições mais primitivas, uma vez que longos trechos de rios são raros ou impactados por represas localizadas nas proximidades - como a planície de inundação do Alto Rio Paraná. Nesse cenário, o médio Rio Uruguai oferece a possibilidade de entender os padrões de diversidade de peixes no principal canal de grandes rios tropicais, porque possui um longo segmento de rio (cerca de 900 km). Nosso estudo, o primeiro conduzido nesta região, cobriu um segmento de rio relevante (ca. 450 km), incluindo variação considerável em condições geomorfológicas e estrutura de paisagem, isto é, a presença de corredeiras superficiais, piscinas fundas e uma planície de inundação.

5 Conclusão

O médio Rio Uruguai é um remanescente importante do rio na Bacia do Prata, mas o desenvolvimento de energia hidrelétrica está planejado para ocorrer na região (ou seja, o complexo hidrelétrico de Garabi-Panambi). Se for bem-sucedida, predizemos mudanças significativas na diversidade de peixes, com a proliferação de espécies sedentárias, generalistas e / ou oportunistas, e o declínio de espécies migratórias. Ressaltamos que as populações de peixes migradores têm declinado consistentemente no Alto Uruguai e no Alto Rio Paraná. Essas mudanças terão implicações claras nas atividades pesqueiras. Nesse sentido, a manutenção das condições dos rios, afluentes e áreas protegidas ao longo do Médio Uruguai é uma condição primordial para preservar a diversidade de peixes na região.

Figura 1. Localização dos locais de amostragem ao longo do Médio Uruguai River, RS, Brasil. Derrubadas (S1), Esperança do Sul (S2), Alecrim (S3), Porto Vera Cruz (S4), São Nicolau (S5) e São Borja (S6).

Tabela 1. Atributos de diversidade mensurados ao longo dos seis pontos de amostragem no médio Rio Uruguai entre julho de 2018 e março de 2019.

Atributos

P1

P2

P3

P4

P5

P6

Riqueza_S

32

37

50

57

42

49

Indivíduos

419

357

428

675

356

497

Dominancia_D

0,11

0,16

0,11

0,07

0,06

0,06

Shannon_H

2,67

2,51

2,91

3,11

3,13

3,12

Equitabilidade_J

0,77

0,70

0,74

0,77

0,84

0,80

 

Referências

COSTA, I. D.; FREITAS, C. E. DE C. Factors determining the structure of fish assemblages in an Amazonian river near to oil and gas exploration areas in the Amazon basin (Brazil): establishing the baseline for environmental evaluation. Zoologia (Curitiba), v. 32, n. 5, p. 351–359, 2015.

MCCLUNEY, K. E. et al. Riverine macrosystems ecology: Sensitivity, resistance, and resilience of whole river basins with human alterations. Frontiers in Ecology and the Environment, v. 12, n. 1, p. 48–58, 2014.

Publicado
04-09-2019