CAMINHOS À SAÚDE INTEGRAL: PEDRAS E HEGEMONIA POPULAR
Resumo
Este manuscrito analisa, na perspectiva ético-política, o modo como a transformação do real foi se impondo ao trabalho e gerando saberes e práticas populares de atenção à saúde no contexto de produtores de bens em pedra, no município de Camboriú, SC, Brasil. Para cumprimento de tal tarefa, um dos frutos de dissertação de mestrado, ergue-se uma pesquisa qualitativa, exploratória, de abordagem compreensiva, do tipo história oral-oral e análise dialética. As técnicas utilizadas para a coleta de dados foram: observação-participante e entrevistas narrativas, a partir de roteiro semiestruturado e diário de campo. O universo dos sujeitos foi construído pelo auxílio da técnica bola de neve, modalidade de história oral-oral. Os dados foram organizados, classificados e codificados com base no referencial proposto por Minayo (2010). Deste percurso, brota a categoria analítica: “Não há consultórios sem pedras, mas há pedras sem consultórios”. A análise dos achados seguiu a partitura do método “posto che”, cunhada por Antonio Gramsci e orientada pelo diálogo entre a historicidade do objeto e a indagação de suas tendências contraditórias. Tendo como hipótese do estudo a compreensão de que a transformação do real sobre o trabalho de produtores de bens em pedra se deu por meio de relações de hegemonia, a análise gramsciana da teoria da hegemonia, e alguns conceitos relacionados conduziram a discussão. Hegemonia posta que atravessa a atenção pública (e também privada) em saúde, não capaz de garantir saúde integral a esta população estudada. A própria sociedade civil chancela a organização social de produção hegemônica, resultando em inequidade entre os atores participantes quanto à capacidade de reação perante os perigos do trabalho com pedras. Diante do sofrimento evitável que não foi evitado, práticas populares de atenção à saúde irrompem dos produtores de bens em pedra diante da ausência estatal e da incapacidade financeira para comprar saúde privada, como: utilização de recursos naturais presentes no território para aliviar, cessar ou “ludibriar” a dor e tentativas de organização popular de classe. Mesmo os trabalhadores entrevistados que tiveram acesso ao serviço de saúde, este limitou-se a práticas curativas, negando o enfoque de saúde social e da determinação social no processo saúde-doença. Argumenta-se que a transformação do real, neste contexto estudado, se deu por meio de relações de hegemonia provenientes formação econômico-social sobre qual se edifica (de atual face financeira), não representando valor democrático, de saúde integral. Para que seja, dentre outras, necessita organizar uma hegemonia popular real, capaz de romper com a subalternidade imposta às classes fundamentais, garantindo liberdade e igualdade: no meio econômico-financeiro, com a posse e tomada de decisões nos espaços produtivos; no ambiente filosófico, com participação ativa na construção do conhecimento; e no campo político, a partir de democracia participativa. Imprescinde à organização popular a contribuição pela vontade coletiva de intelectuais orgânicos dispostos - com o povo - superar o momento econômico-corporativo pelo ético-político.
Publicado
03-03-2018
Seção
Saberes e Práticas de Atenção à Saúde